Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCV)

Mogi das Cruzes, 29 de julho de 2041

Neste mesmo dia, mas há vinte anos, nevava em terras gaúchas (desse fenômeno junto a esta cartinha uma fotografia, que guardei no baú das velharias). A onda de frio intenso derrubava a temperatura até cerca dos dez graus negativos, algo nunca antes visto nas terras tropicais do sul

Por essa altura, o vosso avô ajudava o amigo André, no seu projeto de fazer uma educação do século XXI no município de Mogi das Cruzes. Essa cidade e outras capitais do Sudeste preparavam-se para auxiliar pessoas em situação de rua, pois havia indícios de que a onda de frio se intensificasse.

O mundo passava por profundas mudanças climáticas. Na Brasília dos idos de vinte, atenta e esse e a outros perigos, a Cláudia agia, no Centro de Práticas Sustentáveis. Do seu projeto vos falarei em outra missiva. Hoje, falar-vos-ei de um tempo em que ainda não tínhamos publicado o livrinho sobre novas construções sociais de educação, quando me perguntavam o que era o “currículo da consciência planetária”. 

Essa dimensão curricular contemplava necessidades universais, as chamadas “aprendizagens essenciais”. Dava resposta a problemas que afetavam o Brasil, como afetavam a China, ou a África do Sul, tal como a Covid-19. O currículo monolítico e pronto-a-vestir, como o da base curricular brasileira, continha conteúdos relacionados com a pandemia, mas a escola instrucionista nem sequer ensinara a lavar as mãos. Como vedes, muitas vidas teriam sido poupadas, se fosse outra a escola dos idos de vinte.

Quando o livrinho foi escrito a muitas mãos, uma delas digitou a estória que conto em seguida.

Uma jovem manifestou preocupação relativamente ao fato de a espécie humana estar em risco de extinção, dada a crise ambiental (o buraco na camada de ozono, o efeito de estufa, a poluição, a escassez da água potável, a acelerada degradação do planeta). 

Com os seus tutores, elaborou um projeto, realizou pesquisa e foi para Washington, apresentar um projeto por ela concebido, que, experimentalmente, a NASA enviou para o espaço: uma ampola de um composto feito de cimento e pó de plástico verde. Acaso esse composto resistisse de maneira satisfatória à microgravidade, ele poderia ser uma alternativa para a construção de colônias humanas fora da Terra. 

Tudo começou, quando a jovem aluna manifestou preocupação com a vizinhança, com o mundo, com o futuro da humanidade, numa das escolas brasileiras, onde, no início deste século, já se esboçavam novas construções sociais de educação. 

Nessa escola – refiro-me à Escola do Projeto Âncora – o processo de autoconhecimento harmonizava-se com necessidades e problemas da sociedade contemporânea e do planeta. Tendo em consideração os dezessete objetivos de desenvolvimento sustentável e as quatro dimensões da sustentabilidade, eram desenvolvidas habilidades socioemocionais, assegurando, através do desenvolvimento de competências transversais, o pleno desenvolvimento pessoal e social do ser humano.

A Escola do projeto Âncora representava a possibilidade de o Brasil sair do caos educacional em que estava atolado. Talvez por isso tivesse sucumbido face à corrupção intelectual e moral, que minava a nação. Também porque, no regime de medo dos idos de vinte, as testemunhas do descalabro se negassem a denunciar ilegalidades, com receio de perder a vida. 

Naquele tempo, o fundamentalismo pedagógico vigiava e punia aqueles que ousavam refletir e mudar. É preciso reavivar a memória desse tenebroso tempo, de que, felizmente, já não restam indícios, nesta nossa pacífica década de quarenta. 

 

Por: José Pacheco

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