Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCXCIII)

Dornelas do Zêzere, 28 de outubro de 2041

O décimo ENARC, de que vos falei na cartinha anterior, dava a conhecer a vitalidade de práticas de efetiva aprendizagem, da recriação do espaço e do tempo de aprender, fazendo uso de novas tecnologias ao serviço da humanização da escola, promovendo a partilha de conhecimento e a inclusão social.

Entretanto, com mágoa, dávamo-nos conta da indigência pedagógica em que muitas escolas continuavam atoladas. Indiferentes a meritórias tentativas de inovação, sistemas de ensino conduziam professores à aplicação de “simulados” na sala de aula e online. Uma execrável proposta de base curricular gerava processos assimilados por sistemas autoinstrutivos, comandados por computadores. A inteligência artificial monitorava a ensinagem com recurso a materiais instrucionistas e “tecnologias interativas, com que o aluno corrigia a sua dificuldade de desempenho” (sic). 

Nesse dantesco cenário, os professores fariam significativo dispêndio de tempo, validando a profecia de Orwell. Os donos de tais “sistemas” poderiam transformar as escolas em “mercadoria”, vendida através de “franquias”, como quaisquer Mcdonalds da instrução.

Durante o ano de 2022, um projeto de formação acompanhou transformações várias… a partir dessas transformações. Nos encontros semanais, a Edilene e outros educadores pioneiros “explicavam” como tinham “resolvido” problemas, nos primórdios do projeto. Refletia-se sobre novas dificuldades, encontradas nos protótipos. Em equipe, encontrávamos soluções, novas práxis surgiam.

Perguntas de quem estava começando a mudar, a inovar, eram respondidas por quem já passara por mudanças e inovações, e descrevia práticas, efetivamente, exitosas. Eram narrados modos de resolução de conflitos, descritos acordos de convivência, efeitos de muitas rodas de conversa. 

Porém, a regulamentação da lei condicionava e até mesmo impedia a mudança necessária e, já então, possível, como atestavam os românticos conspiradores. E, por falar em leis, permiti que delas vos fale.

Nos idos de quinze, quando secretário de educação do Distrito Federal, o Rafael – um amigo, que se tornaria eminente político – fizera publicar uma portaria pioneira. Pela primeira vez, foram criadas condições de revisão do quadro normativo. 

No mês de novembro de vinte e um, o seu exemplo foi imitado. A secretaria de Mogi publicava idêntica portaria, inaugurando um novo tempo. E o que dizia esse normativo?

Começava por instituir um Grupo de Trabalho para a proposição de diretrizes de política pública, para a implantação de uma rede de protótipos de comunidades de aprendizagem. Competia a esse GT desenvolver análise técnica, acompanhar experiências e cuidar de fundamentação científica, para a reconfiguração da prática educativa. Pretendia-se com isso adequar velhos normativos a novas realidades, bem como validar indicadores de transformação e de melhoria da qualidade da educação.

O GT viria a acompanhar a implantação dos protótipos desenvolvidos nas chamadas “escolas de referência”. Em colaboração com áreas técnicas, contribuía para a sustentabilidade da proposta, propondo a adoção de dispositivos legais e científicos coerentes. Entre eles, se contavam parâmetros de arquitetura e a definição de estratégias orçamentárias e financeiras, que eram elaborados em articulação com setores dos ministérios e das secretarias de educação.

Paralelamente a esse movimento, pesquisas de mestrado e de doutoramento consolidavam processos. A universidade subia ao chão da escola.

 

Por: José Pacheco

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