Freixo do Meio, 15 de novembro de 2041
Há cerca de vinte anos, criei o hábito de enviar mensagens contendo reflexões e votos de uma semana feliz. Aqui vos deixo excertos de uma delas, enviada no novembro do já distante 21:
“Neste momento, encontro-me, numa comunidade agroecológica alentejana, que adotou um modelo de colaboração e participação coletiva estruturador do trabalho de economia social, regulador e harmonizador dos usos setoriais do Bem Comum.
Observo portugueses, espanhóis, cabo-verdianos, brasileiros e gentes de outras origens, repetindo um ritual pré-histórico: a instalação de um menir, recorrendo a tecnologias pré-históricas.
Arqueólogos e historiadores relacionam o aparecimento do menir com manifestações de culto da fecundidade, ou como marco territorial, quando o menir surge isolado. Identificam-no com sinal orientador de locais, quando colocados em linha. E, quando colocados em círculo, interpretam-nos como santuário religioso.
Foi grande o impacto, quando me vi perante a estrutura neolítica de Stonehenge.
Há mais de 4 000 anos, foram construídos dois círculos de pedras azuis e uma avenida marcada por valas paralelas alinhadas com o Sol nascente do primeiro dia do verão. O círculo externo teria 35 pedras, pesando mais de 4 toneladas cada uma, transportadas das montanhas de Gales, a cerca de 24 km ao Norte.
O que move estas pessoas? Por que decidiram erigir um menir nos cafundós do Alentejo? Algum significado deve ter… Qual será?
Nesta manhã de domingo, que marca o início de mais uma semana e que auguro jubilosa, proponho e partilho uma breve reflexão sobre os frutos do engenho e do labor humano.”
Por vezes, as cartinhas publicadas nas redes sociais obtinham resposta. A minha amiga Nilce a esta respondeu:
“Caro Pacheco,
Leio as suas “histórias” com interesse. São pérolas para quem sabe re-conhecê-las. Depois dou um tempo, “matutando” pensamentos, que a sua escrita suscitou. Então, com calma e tempo, venho revelar-lhe as minhas impressões.
Nesta “ida” ao Alentejo, descubro o significado da palavra “Além do Tejo”; que o céu alentejano foi o primeiro no mundo a ter a certificação Starlight Tourism Destination da UNESCO; que o maior lago artificial da Europa fica nessa região;
que ela conta com 5 títulos da UNESCO; e que os monumentos megalíticos datam há mais de 5 mil anos. Maravilha!
Quanto à sua instigante indagação, eu poderia arriscar uma doxa. Porém, vou preferir que o mistério prevaleça.
Grata por compartilhar saberes! Uma espetacular semana a ti, com “gosto e bem-disposto”.
No dia do ritual de implantação do menir, escutei as sábias palavras do amigo Alfredo, apelativas de um diferente modo de relacionamento com o meio e da necessidade de refletir sobre como nos relacionamos. Dizia ser indispensável entender o sistema e ter uma ética adequada a novos modos de exercício do poder.
Na tarde de um domingo extraordinário, em nome da sua comunidade, o amigo Alfredo perguntava:
“Por que vamos levantar um menir no Monte do Freixo do Meio?
Porque queremos, de novo, responsabilizarmo-nos coletivamente pela gestão dos ecossistemas de que dependemos. Queremos fazer parte de uma outra história, construída por uma atitude que não ponha em risco a nossa maior riqueza, a estabilidade climática. É isso que queremos celebrar, levantando uma pedra, como há 8000 anos. Porque a cooperação não foi só o que nos trouxe até aqui. E acreditamos que ela seja o caminho.”
Na parede da sala onde decorreu o encontro, uma frase do Mestre Agostinho sintetizava a fala do amigo Alfredo. Amanhã, dela vos falarei.
Por: José Pacheco
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