Benedita, 18 de abril de 2042
Pois é… moléstias de idoso requeriam cuidados médicos. E, na “boleia” da Mariana, lá fui eu até à Benedita. Estávamos no abril de há vinte anos. E, como é bom de ver, conversa puxa conversa e a Ponte veio à baila.
Já no dia anterior estivera com pais, que buscavam a educação de que os seus filhos eram merecedores. Com eles conversei sobre a história da Ponte e lhes contei algumas estórias. Agora, permiti que a Ponte fale pela voz de quem a visitou, conheceu e estudou.
Começarei pelo Nóvoa e por um artigo, que ele publicou em 2003. Dava pelo título “A educação cívica de António Sérgio vista a partir da Escola da Ponte (ou vice-versa)” e começava com uma dedicatória:
“Para todos os que têm feito e continuarão a fazer a Escola da Ponte”.
Dele extraio alguns excertos.
“Não encontraremos, na Educação Cívica de António Sérgio, respostas para os problemas de hoje, pois os tempos mudam estruturas, e recolocam as questões em contextos diferentes. Mas não conseguiremos ir longe na nossa interrogação se insistirmos em seguir pelo caminho da amnésia, se abdicarmos de ir construindo um conhecimento feito da experiência e da reflexão sobre a experiência, se continuarmos a preferir o facilitismo de uma ignorância quase sempre arrogante.
Quem repete frases feitas e tem soluções para tudo é porque não conhece nada. Com Sérgio aprendemos, pelo menos, que é grande a nossa tendência para «adormecer a própria mente com noções vagas, sentimentais e fumarentas», procurando resolver «tudo por uma inane ideia geral que tão mais facilmente se aplica a tudo quanto a coisa nenhuma».
Tem sido esta uma das pechas do debate sobre a educação: a frase feita, o gesto fácil, a solução pronta-a-servir, a banalidade transformada em eloquência em vez do estudo aturado, da reflexão sobre as experiências concretas, da análise sistemática e informada”.
António Nóvoa elaborou um resumo dos cinco os capítulos da “Educação Cívica”, começando pelo “Self-government.
“António Sérgio vê na Inglaterra um país modelo, explicando que o seu motor é a educação. A razão do seu progresso reside numa escola que promove o desenvolvimento da iniciativa, da vontade criadora, da responsabilidade, do autodomínio, numa palavra do self-government.
Critica o modo como pela educação burocratesca nos tornámos pedintes do Estado, e lhe damos a força com que nos mata. E deixa bem-marcada a sua defesa de um sistema monitorial, no qual cada criança vai assumindo uma responsabilidade especial no quadro de processos de cooperação entre todos. Considera que as crianças devem ser chamadas a participar na direção da vida escolar: à medida que o estudante avança nas classes, o governo da escola deve entrar cada vez mais em suas próprias mãos.”
Na década de noventa, o Presidente da República o tinha dito, numa reunião da Assembleia da Escola. E Nóvoa conclui o seu artigo com estas palavras:
“Reparo, agora, que não falei da Escola da Ponte, ainda que, na verdade, não tenha falado de outra coisa. É uma escola extraordinária, justamente por não ter nada de extraordinário: é uma escola pública como as outras, num lugar como tantos outros, com alunos e professores iguais a muitos outros. E com esta matéria-prima se tem vindo a fazer, graças a um trabalho metódico, persistente e coletivo, uma escola notável.
Júlio Cortázar escreve que uma ponte só é verdadeiramente uma ponte quando alguém a atravessa. Em 27 anos, os colegas da Escola da Ponte já fizeram muitas travessias. Pelo deserto ou pela floresta, eles sabem que não estão sozinhos nas travessias que têm pela frente.”
Por: José Pacheco
355total visits,2visits today