Lordelo, 13 de abril de 2042
O amigo Miguel nos fazia recordar o que já se sabia, mas pouso se praticava. Que a avaliação não fosse confundida com a classificação.
“A avaliação revela, expõe sobre o tapete todas as concepções, atitudes e princípios do avaliador. Então você poderia dizer o seguinte: Diga-me como avalia e eu direi que tipo de profissional você é.
É importante que a avaliação não seja confundida com a classificação. As tarefas mais ricas têm de ser reforçadas porque uma avaliação de natureza pobre favorece um processo de ensino e aprendizagem pobre.
É necessário utilizar instrumentos variados, sensíveis para captar a complexidade e adaptados aos contextos e às pessoas. A avaliação contínua deve ser reforçada e não feita no final da aprendizagem. É muito importante que a avaliação sirva para motivar, aprender, melhorar, diálogo e animar. E não tanto para controlar, comparar e torturar.
Os alunos devem participar na avaliação e se autoavaliar. Não se pode esquecer as dimensões éticas da avaliação”.
Há uns vinte anos, a boa vontade do amigo Domingos e uns dinheiros amealhados pelo ministério foram investidos em mais uma formação destinada a mudar e melhorar a avaliação que nas escolas se fazia. Muitos anos antes, o Domingos me ensinara a fazer portfólios. Com ele mais o Vítor, a Anabela e outros especialistas, aprendi a fazer avaliação.
Visitei escolas, quando esse projeto terminou. Constatei que a boa vontade e, sobretudo, a sabedoria do Domingos nada fizeram mudar. E que, mais uma vez, o ministério desperdiçara recursos.
“Como esse povo fala e não faz!” – exclamou a Célia, numa amena conversa.
Se fosse feita uma avaliação da avaliação, se reconheceria que o teste padronizado continuava sendo o instrumento mais utilizado pelos formandos.
Avisado, o amigo Sérgio, discretamente, como era seu modo de comunicar, enviava aos formadores do projeto da avaliação esta mensagem:
“O eco de muitos professores com quem eu trabalho não corresponde à visão que nos deu aqui sobre o Projeto. Li alguns textos dos autores do projeto, que se prestam a equívocos. Há um desfasamento entre o que os autores dos textos dizem e o que está a acontecer nas escolas.
Porque quem decide se o Projeto se vai realizar nas escolas, quem decide é o diretor. E, depois, tenta reunir os seus colaboradores na liderança dos agrupamentos de escolas, para convencerem os professores a aderirem à ideia do Projeto.
Como isso é o que, normalmente, acontece, provavelmente, quando chega aos professores, a intenção alterou-se. Não é? Entre os produtores do projeto e aquilo que vai acontecer nas escolas, para um projeto que se tornou obrigatório. Que se tornou uma política de educação, num sistema que é hiper burocratizado. Onde as pessoas não falam umas com as outras”.
Isso mesmo! As decisões dos diretores (não todos) contribuíam para a manutenção de uma avaliação que nada avaliava. Desde há meio século, o Rui denunciava a “escola caricatural”, dizia ser necessária “uma escola que se baseie num outro paradigma educativo, ser preciso romper com a organização do tempo, com a organização do espaço”. Que “a escola dos ouvintes e dos repetidores de informação” estava obsoleta.
Enquanto o amigo Rui contestava a escola causadora de abandono intelectual, disfarçado sob o manto diáfano de uma falsa avaliação, o amigo Domingos continuava, como Santo António, a “pregar aos peixes”.
Mostrou-se certa a sentença do Nunziatti de que a escola mudaria através da avaliação, ou jamais mudaria. E assim se manteve o “sistema”, até à chegada de um novo e “diferente” ministro.
Por: José Pacheco
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