Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCLXVII)

Maricá, 7 de março de 2043

Estávamos em 2023. Rumo a Brasília, para participar na CONANE, ultimei uma “lista de verificação” daquilo que de “alternativo” havia sido feito em dez anos. 

Na primeira das conferências, elaborara uma proposta de critérios de avaliação de supostas “inovações”. E, na posição de observador atento, iria aferi-la, tendo por referência um artigo do Mestre Pedro. Não irei transcrevê-lo integralmente, apenas usarei alguns excertos. 

“Abordo a proposta do processo formativo sem cronometragens artificiais em anos, séries, ciclos. A mania de cronometrar processos não físicos, como aprendizagem, é resquício positivista instrucionista, que recua à gestão “científica” de Taylor, quando cronometrou, tintim por tintim, processos produtivos e modos de os agilizar.

Os nomes variaram historicamente muito. Houve a época da escola que fazia alfabetização, e depois um “ginásio”. Este virou depois “ensino médio”, precedido de um ensino fundamental. Com a LDB, temos outras etapas cronometradas, começando por “educação infantil” (enquanto o fundamental e o médio são “ensino”, a infantil é “educação”!) 

A cronometragem aparece em tudo, ademais. O ano tem dois semestres. O ensino fundamental passou de oito para nove anos, um gesto de total irresponsabilidade, já que só piorou os anos finais, ficando por isso mesmo. 

A alfabetização demora 3 anos (dos seis aos oito anos) – o Governo tentou reduzir para 2, mas as prefeituras não aceitaram. Chamou-se a isto de “idade certa” para alfabetizar, à revelia dos alfabetizadores mais lúcidos, como Magda Soares, que consideram alfabetização um processo vital interminável. 

Segundo a ANA (Avaliação Nacional da Alfabetização), os resultados deste tipo de política educacional (Pacto pela Alfabetização na Idade Certa) são absolutamente pífios: na média, metade se alfabetiza em três anos; muitos estados ainda devem mais de 80%. 

Os dados indicam uma escola “analfabeta”, inepta como alfabetizadora e que, neste imbróglio inacreditável, deturpou a expressão da LDB da “progressão continuada” (direito de avançar na escola, aprendendo) para “progressão automática”, fenômeno estapafúrdio do estudante que vai “caindo para cima”, sem aprender. 

“Anos de estudo” perderam totalmente o sentido, porque é uma cronometragem fraudulenta: chega-se ao fim do ensino médio analfabeto em matemática. Amém. 

Houve época em que “ciclos” pareciam a salvação da lavoura, ao invés de anos sequenciais, apenas para encobrir a mesma fraude do descuido com a aprendizagem. 

Uma das noções mais tolas é postular que alfabetização se complete aos oito anos. Gostamos de encenações formalistas e burocráticas, apenas para encobrir nossa inapetência escandalosa em termos de cuidar da aprendizagem dos estudantes. 

Uma das cronometragens mais fraudulentas é a aula de 50 minutos, um padrão nacional dogmático, fundamentalista, intocável. Não faz nenhum sentido, nem mesmo se fosse para só transmitir conteúdo. 

Sendo aprendizagem fenômeno aberto e complexo, 50 minutos não é referência para nada, representando apenas uma visão tacanha de escola/fábrica que monta peças cronometradas. Não existem aprendizagem de 50 minutos, nem leitura, nem produção de conhecimento, nem autoria. Mas a escola é tudo e só isso!”

Juntei este naco de prosa a outras contribuições, para a elaboração de um critério: qualquer projeto que mantivesse intacta a segmentação cartesiana e a tradicional padronização do tempo não poderia ser considerado “alternativa”, nem contribuiria para uma “nova educação”.

 

Por: José Pacheco

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