Torre da Gadanha, 29 de junho de 2043
Precisamente, há vinte anos, se fechou um ciclo de vida caraterizado pela adesão a múltiplas tentativas de reforma, desde finais da década de sessenta. Abortada a do ministro Veiga Simão, com a abertura democrática e animado pelo “espírito de abril”, em 75, fui coordenador de uma equipe de “animação pedagógica”.
No ano seguinte (se não me falha a memória) ajudei a compor o “Programa de Capa Laranja”, o primeiro dos currículos, pós-revolução. E aceitei participar como formador na chamada “Coordenação Pedagógica. Sempre com o mesmo espírito de serviço, fiz parte da equipe que concebeu o “Programa de Capa Verde”.
Em 1977, formador para os “Novos Programas”, ajudei escolas a elaborar os seus “projetos pedagógicos”. Constatei que os currículos eram conhecidos apenas pela cor das capas. Os professores não os tinham lido e copiavam “projetos” de outras escolas, para os apresentar aos inspetores como se fossem seus.
Nesse faz-de-conta, como em muitos outros simulacros de reforma, se hipotecou a dignificação do profissional desenvolvimento humano, se perdeu mais uma oportunidade de elevar o estatuto social da profissão de professor.
Em 1978, era publicado o primeiro número do “Projeto”, boletim do recém-criado Centro de Documentação Pedagógica. Eram muitas as notas de leitura e os boletins seguintes davam notícia de encontros de tertúlias literárias. Apoiamos centenas de outros projetos e concebemos a “Associação PROF”, que, em 1992, criaria o primeiro centro de formação contínua.
Em 1987, foi eleito coordenador concelhio do Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Educativo (PIPSE), que visava reforçar a ação e os meios educativos em zonas prioritárias de intervenção caracterizadas por índices muito elevados de insucesso.
As ações prioritárias incidiram sobre: o reforço dos cuidados de alimentação, a prestação dos cuidados de saúde, prevenção e diagnóstico, o alargamento da cobertura em educação pré-escolar, o fortalecimento da educação especial, o apoio a famílias carenciadas, o apoio pedagógico, a Iniciação profissional, entre outras.
Em 1991, o programa foi extinto. E, em 2020, um edital do Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar (PNPSE) repetia intenções plasmadas no PIPSE de 1987, num sofisticado discurso, que não disfarçava a pobreza da prática. Trinta anos depois do PIPSE, o ministério da educação apenas mudara uma letra: o I era substituído por um N.
Sem abandonar a equipe da Ponte, jamais saindo do chão da escola, participei em todos os projetos reformadores, voluntária, gratuita e… entusiasticamente.
Em mais de três décadas, muitas réplicas de antigos programas e projetos tinham sido lançadas, todas com efeito nulo. Por exemplo, na década de noventa, o projeto de “Gestão Flexível do Currículo”. Acompanhei todo o processo e li o relatório que, com esmero, o Vítor fez. O relatório de avaliação apontava para a necessidade de rever o modelo de ensinagem.
Nessa altura, eu era membro do Conselho Nacional de Educação. E fui autor de um Parecer sobre uma proposta de lei de “Reorganização Curricular”. Nele evidenciei a necessidade de rever o “modelo de ensinagem”. Já então, era urgente conceber um modelo alternativo ao que herdáramos da Prússia Militar.
Vinte anos depois, o ministério lançou o projeto “Autonomia e Flexibilização Curricular”. O relatório de avaliação desse projeto era semelhante a uma réplica do relatório dos anos noventa. Apenas acrescentava um absurdo a que chamaram “inovação”: passar de trimestre para semestre.
Por: José Pacheco
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