Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCXLIX)

Porto Alegre, 17 de fevereiro de 2043

Na manhã do dia 18 de fevereiro (a de há vinte anos!) fui muito claro ao “passar trabalho para casa”. Aquilo que estava em causa não era remediar um sistema irremediável. Não seria juntar mais uns projetinhos paliativos do instrucionismo, nem medidas política educacional à moda de Sobral, em que colavam o rótulo “inovação”. 

Precisei de explicar a muitos inscritos no processo de formação que não se tratava de oferecer às escolas mais um projetinho de “sala maker”, de yoga, de horta e compostagem, ou outro qualquer adereço. Isso tínhamos feito, por mais de meio século. E, quando mudava a orientação política do município ou do país, tudo voltava ao princípio. 

Aquilo que, no ano vinte e três, fazíamos era mesmo inovação, o anúncio de uma nova construção social. Um ato de Amor a que juntávamos Coragem, tal como Freire havia definido o ato de educar.

A par com uma prática nova e refletida, demos início à desmontagem do velho sistema, ajudados pelo meu amigo Pedro, que me ofereceu um conjunto de textos, a propósito da criação de comunidades de aprendizagem. Amorosamente escrevia apoiado numa ciência prudente, criticando de modo pertinaz e fundamentado o velho modelo de escola instrucionista. 

Eu nutria profunda admiração por esse meu Mestre, que, num artigo datado de maio de 2018, esboçou um “retrato” do vosso avô. Entre nós, não havia conversa de “puxa-saco”. Ambos éramos septuagenários, que não careciam de elogio ou agradecimento. 

Hesitei em transcrever as suas amigáveis (e lisonjeiras) palavras, mas decidi fazê-lo, porque não é apenas o retrato aproximado do vosso avô, mas aquilo que qualquer educador deveria ser.

“Busco analisar algumas das ideias mais chamativas do Pacheco. Tenho tido a oportunidade de estar por perto em Brasília, onde ele mora agora e tenta montar um projeto muito abrangente de transformação escolar, em especial a Comunidade de Aprendizagem do Paranoá (CAP). 

É marcante a determinação com que enfrenta os problemas, demonstrando formação primorosa pedagógica, uma experiência inigualável de inovação escolar e uma habilidade incrível de lidar com as pessoas, mesmo sendo incisivo e direto. 

Tem grande confiança das pessoas, porque é um dos educadores inovadores mais bem comprovados, reconhecido internacionalmente. Mostra, quase sempre, impaciência com a pachorra brasileira, em especial com as autoridades educacionais que facilmente atravancam as coisas, mesmo quando juram querer facilitar. Decepciona-o também que, mudando a gestão municipal ou estadual, facilmente tudo se desfaz. 

Mas isto, ao invés de o levar ao desânimo ou ao imobilismo, turbina tanto mais sua gana de montar um projeto onde já atingiu nível considerável de mobilização. Embora sua posição seja de inovação profunda, provocativa mesmo, ou chocante até, tem o charme da ponderação equilibrada, unindo bom conhecimento dos avanços científicos no campo da aprendizagem com práticas correspondentes. 

Não aprecia nem o teoricismo, nem o pragmatismo (prática no mau sentido). Considera todos os autores aproveitáveis na escola, sem fundamentalismos, também porque estão em questão, não este ou aquele autor, ou esta ou aquela teoria, mas o direito do estudante de aprender. 

Mostra extrema coerência, reforçada por uma prática exuberante e reconhecida, com o que define como aprendizagem: significativa, autoral, participativa, motivada de dentro e comunitária. Valoriza os professores sumamente, porque são referência fundamental da aprendizagem do estudante, na posição mediadora.” 

 

Por: José Pacheco

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