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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MXCII)

Arraial do Sana, 22 de dezembro de 2042

Hoje, deu-me para tirar o pó de uma pasta com capa de cartolina (naquele tempo, ainda não havia computadores), onde guardei manuscritos e cartas escritas em máquina de escrever. Depois, abri uma pasta guardada numa velha pen drive. Comparei as mensagens, que distavam quarenta anos uma da outra. E vo-las dou a conhecer.

“Estou aqui numa angústia enorme. O ensino está todo podre. As minhas colegas de trabalho simplesmente me deixaram de falar. Sinto que, por ser diferente, diferente na forma como trato as crianças, sou posta de lado, tratam mal as crianças à minha frente e até andam nos corredores a perguntar o que eu falo com as colegas. Não sei o que fazer… Estou mesmo decidida despedir-me. Tenho pena é das crianças.

Estou a sofrer boicotes frequentes por parte da Direção. Como podem os educadores realmente comprometidos com a justiça social avançar com os seus projetos numa instituição gerida por alguém que não apoia e até inviabiliza o processo de transformação concebido, ignora os chamamentos éticos e legais dos educadores e educandos?

Professor, a escola cheira mal, está purulenta. Presenciei, por várias vezes, lutas entre meninos, de socos e pontapés. São irritadiços, ansiosos, falam muito e falam alto, gritam e empurram colegas, derrubam materiais no chão, não dominam o uso simples de uma tesoura, exageram no tubo de cola, lambuzam tudo, deixam garrafas plásticas e biscoitos no chão após o intervalo, não sabem brincar. Os garotos só sabem jogar bola. As meninas, ficam umas com as outras, carregando bonecas e usando batons e esmaltes. Além de uma inquietude corporal constante, ou corpos flácidos e muito parados. dá uma tristeza imensa e a pergunta de sempre: o que fazer?

Recebi ameaças, corro risco de processo disciplinar. Numa reunião, fui muito desrespeitado. Algumas professoras das mais antigas e a diretora estão a inventar boatos e contestar o projeto, sem fundamentação. Hoje, levei um “cartão amarelo”. Fiquei preocupado porque tenho uma filha de 6 meses e um filho de 2 anos para alimentar… Provavelmente, serei mandado pra rua no final do ano. Não sei como vai ser…

Ontem, apareceram aqui de surpresa por causa de uma denúncia. Fui pressionado para me calar e entrar no sistema. O Diretor disse que projetos como o da Escola da Ponte não valem nada. Tentamos marcar uma audiência com o Diretor Regional. Estávamos em diálogo com a secretária dele, esperando, há semanas, uma resposta. E… nada! Já não sei o que fazer, estou sem dormir, doente, passando mal com toda essa situação. Eles não têm interesse na melhoria da qualidade da educação e estão burocratizando o processo.”

“Estou sendo muito desrespeitada. Mas o importante é que já tenho planos para o próximo ano. Não vou desistir tão fácil! E, como professora, não estarei refém de nenhum diretor moralmente fraco. Tive uma conversa com ele. Foi categórico. Disse que esta escola tinha que ser como as outras, que uma escola tem que ensinar só português e matemática… e pronto! Que o que os pais querem é que os filhos sejam doutores.

Um discurso arrogante e banal. Foi em vão minha conversa! É covarde, não tem opinião, deixa-se levar pela maré.”

Queridos netos, penso que não precisais que eu faça a moral da estória. Poderá parecer-vos inconcebível que tudo isso tenha podido acontecer, há vinte ou há sessenta anos, mas aconteceu. Então, creio que compreendereis por que decidimos arriscar sofrer represálias, defrontar lideranças tóxicas, corruptas. Vivíamos uma conjuntura educacional insustentável. Proibimo-nos de não agir.

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MXCI)

Tanguá, 21 de dezembro de 2042

Dizem as enciclopédias que um solstício é um evento astronômico em que um dos polos da Terra se encontra no seu ponto máximo de inclinação em direção ao Sol. Se o Polo Sul estivesse mais voltado para o Sol, acontecia o solstício de verão no Hemisfério Sul.

Enquanto o Brasil recebia os raios solares com máxima intensidade, Portugal tremia de frio, no início do solstício de Inverno. Eu saboreava o calorzinho tropical, esperando o equinócio seguinte, para visitar amigos e parentes no norte primaveril.

Mais ou menos há uns vinte anos, numa das minhas idas a Portugal, duas situações me mostraram como a vida é breve.

Foi no tempo da Covid. Após catorze dias de reclusão (a que chamavam “quarentena”) saí de casa decidido a caminhar quilómetros. Ao ímpeto inicial as pernas responderam com vontade de pausar.

Sentei-me num banco de jardim, arfando. Subitamente, me apercebi de que a última vez que me sentara naquele mesmo banco fora há… cinquenta anos. A Alice, para quem o avô escrevera outras cartinhas, nascera em 2001, ano do início da minha segunda vida (a brasileira) e já estava fazendo mestrado de Psicologia.

Já aqui vos falei da tese da Cláudia, que assim descrevia as suas primeiras impressões na chegada à Ponte:

“Muitas coisas chamam a nossa atenção ao chegarmos na Ponte. Para mim, o primeiro impacto foi o “portão da rua”. Cheguei na escola no horário de aula, e o portão de acesso à escola estava completamente aberto. Achei que alguém tinha esquecido de fechar ou até mesmo de trancar.

Lembrei das escolas que trabalhei e convivi no Brasil, o portão sempre estava trancado, de preferência com cadeado, deixá-lo aberto era uma falta grave.”

A Cláudia surpreendeu-se com a atitude de “abertura” da escola, simbolizada num portão aberto. Porém, a interface escola-meio social nem existia nessa autônoma construção social de aprendizagem, porque essa escola era um nodo de uma comunidade.

Na mesma viagem ao Norte, visitei uma Escola da Ponte degredada, no outro lado do rio, para onde o autoritarismo de um ministério (e a deslealdade de alguns professores) a tinham atirado. À entrada, uma desagradável surpresa: o funcionário da portaria – a Ponte voltara a ter “porteiro”! – colocou a sua mão no meu peito e mandou-me parar. Perguntou-me ao que eu ia e quem eu era.

Embora pacifista nato, a minha vontade foi dar-lhe um murro, mas o “porteiro” não era responsável pela minha súbita e justificada irritação. Amavelmente, retirei a sua mão do meu peito e disse-lhe que iria visitar a escola.

O “porteiro” terá percebido que eu não iria pedir-lhe permissão para entrar e apenas perguntou quem eu era.

Já entrando “sem autorização”, disse-lhe o meu nome. Vi que o “porteiro” pegou no telefone, para avisar da chegada do intruso.

Adentrei uma porta (fechada) e logo uma criança dos seus três ou quatro anitos se me dirigiu nestes termos:

“O senhor quer ver a nossa escola, quer? Eu posso mostrar.”

Felizmente, ainda se mantinham rituais, hábitos, rotinas criadas há meio século. Como o de dizer “nossa”, no lugar de “minha”, e de serem as crianças a mostrar a sua escola.

Quando lhe dava um beijo e lhe dizia já conhecer a escola, eis que surge a “Dona Helena”, exclamando:

“O Professor Zé por aqui? Fico tão feliz por vê-lo!” – e, dirigindo-se à criança, perguntou:

“Não sabes que é este senhor? É o Professor Zé.”

“Ah!” – respondeu o pequeno – “Já sei! Foi o professor do meu avô.”

Como diria o poeta, “a vida é sonho tão leve…”

A Dona Helena tinha muitas estórias para contar. Publicou-as num belo livro, que eu li, no abril de há vinte anos, quando voltei à Ponte.

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MXC)

Bosque de Itapeba, 20 de dezembro de 2042

Netos queridos, ficastes surpreendidos por eu ter mencionado a palavra xenofobia na cartinha ontem enviada. Compreendo a vossa reação. Viveis num tempo em que é impensável regressar a práticas sociais de outros tempos, quando o racismo era uma praga estrutural.

A Europa continuava racista e xenofóbica. E, no Sul, mentiras e meias verdades estabeleciam os contornos de um diáfano manto de fantasia, que não conseguia ocultar uma dura realidade: eram privados os vícios e públicas as virtudes.

Quando me perguntavam por que optara por viver no Brasil, eu respondia que a vida é serviço e que o que eu pretendia era apenas ser útil. Se me perguntavam por que insistia em melhorar a Educação, eu respondia que seria pela Educação que a Vida poderia ser melhorada, e que havia situações a precisar de regeneração.

Pediam-me para dar exemplos de necessidade dessa regeneração. E eu lhes dizia que não gostava de quebra-molas na estrada e que o voto obrigatório não do meu agrado, porque o voto era um direito e o quebra-molas punha em causa o meu exercício de cidadania.

Europeu que, cultural e civicamente, ainda eu era, sempre exercera o meu direito de voto sem ser coagido. E, enquanto cidadão e motorista, sempre cumprira a lei, o código da estrada. Incomodava-me haver instrumentos de limitação de velocidade e de punição de infrações. Necessária seria uma educação cidadã.

Me inquietava a desvalorização da vida e da obra de insignes educadores brasileiros. Se os seus compatriotas as conhecessem, talvez tivéssemos um país melhor. Mas nem os professores conheciam. Era raro encontrar nas instituições de formação de professores as obras de Lauro e Nilde.

A lista dos ostracizados era extensa. Cito apenas Lauro Lima e Maria Nilde, cujo sonho foi o de desenvolver a humanidade nas pessoas. Pagaram caro esse intento, perseguidos e humilhados durante a ditadura.

A educação familiar e social reproduzia um modelo social iníquo. E como custava ver como uma Escola alienada, colonizada, reproduzindo um modelo educacional causa de desigualdade e exclusão! Causava desgosto assistir a situações de casa grande e senzala, em novas versões. Entristecia ver um povo privado do mais elementar senso crítico, cativo de crendices e fundamentalismos.

Muito mais me indignava assistir ao elogio da mediocridade, à manutenção da obsolescência e ao degradante espetáculo da depreciação do trabalho daqueles que tentavam recuperar a memória de Lauro, Nilde e de outros mestres.

Havia quem os celebrasse. Eram poucos, mas os havia. E assim respondiam aos seus detratores:

“Escrevo isso porque, sendo um pedagogo “panfletário” (como diz Meirieu), confesso que me senti desconfortável, quase vesti a carapuça e me senti acusado de “ayatolaismo”. Mas, não acredito que essa visão ajude a analisar ou a lidar positivamente com a imensa mediocridade, o fracasso retumbante de nossas redes de escolas, onde pessoas que têm a vocação de estar todo dia com crianças e jovens no nosso lindo “chão de fábrica” abrem livros didáticos, nos quais se gastam bilhões, e dão aulas.

É surreal que essa forma tão caricatural de colocar as coisas ainda seja válida. O meu orientador de mestrado me disse que “não se lançam foguetes ao espaço com interações sociais”. Eu diria que nem combatendo moinhos de vento ou inimigos imaginários, mas começando por reconhecer a grande complexidade das coisas e o nosso fracasso, enquanto sociedade. E de nos dotarmos de redes de educação capazes de formar pessoas que pensam de forma autônoma e são competentes para colaborar.”

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXXIX)

Bananal, 19 de dezembro de 2042

Há vinte anos, no antigo e rudimentar youtube, onde podíamos escutá-la, uma bela melodia completava cem anos de existência. No fundo do baú das velharias, encontrei um velho computador. Ainda funciona e, quando nele introduzi uma também velha pen drive, vi e escutei a Ceumar cantando o “Luar do Sertão” do imortal Gonzaga: “Não há, ó gente, ó não / Luar como esse do sertão”.

Confesso que sempre desconfiei dos backups digitais e que escrevia endereços em papel O youtube se foi, há alguns anos, mas ainda guardo nuns papeis de fundo de baú um endereço:

https://www.youtube.com/watch?v=uOO0c8A_ZYk.

Talvez tivesse sido remasterizado, como fizeram com o vinil e o cd, e vós possais escutar essa velha canção, como, hoje, tive oportunidade de escutar.

Também foi há cem anos que o Brasil do futebol, mais uma vez, se frustrou e a Argentina exultou. A América do Sul conquistava mais uma Copa. E Mbappé saía calado do estádio da final, ironizado pelo que havia dito numa entrevista, minimizando a importância do futebol sul-americano.

A final da Copa foi atravessada por múltiplas metáforas.

A equipe derrotada, a da França, era quase toda constituída por negros colonizados. A África, onde os europeus desembarcaram, no século XVI, desembarcava na Europa.

O futebol dos descendentes de escravos europeizados sucumbia face a uma equipe de brancos emigrados no sul. Os colonos do sul voltavam vitoriosos à Europa do futebol.

Enquanto isso acontecia, germinava no hemisfério sul uma educação que, em breve, iria substituir a velha e obsoleta educação nortista. Contudo, muitos obstáculos ela ainda iria enfrentar. O mundo da educação tinha perdido a oportunidade de se renovar, que a a pandemia propiciou. O velho e obsoleto modelo instrucionista reagia à crise instalada, produzindo um “novo normal” em tudo idêntico ao velho. A indústria farmacêutica aumentava a produção de Ritalina e de ansiolíticos, para ajudar à “recuperação das aprendizagens” (grotesca expressão!) dos alunos e obstar ao crescente bournout dos professores.

 

A pandemia tinha demonstrado que escolas não eram prédios. Mas, voltava-se a encafuar a infância e a juventude em celas de aula. E, entre a profusão de cursos vendidos a granel e de planejamentos pré-fabricados, do gabinete do gestor ao crescimento exponencial do” Negócio da China” dos “sistemas de ensino” e congressos, a educação resvalava, de novo, para o pântano da corrupção moral e intelectual, de onde jamais saíra.

Os passeios a Sobral e as romagens à Ponte continuavam lesando a bolsa dos professores romeiros. Os passeios turísticos (ditos “de estudo”) à Catalunha e à Finlândia continuavam lesando o erário público. E o que resultava desses passeios? Algo de útil?

Apenas a importação de mais paliativos instrucionistas. E uma crónica contradição. A Finlândia acabara quase por completo com provas e exames, e conferira às escolas o direito a autonomia; ministros e ex-ministros excursionistas propunham a introdução de mais provas e exames no “sistema”.

Abútricas empresas rejubilavam e nada de bom se augurava, em anúncios deste tipo:

“O ano de 2023 será um ano de transformação na escola e nas políticas públicas para a educação. Este evento apresentará as grandes mudanças, que se acenam para a educação nacional para os próximos anos.”

Embusteiros e falastrões enchiam os bolsos à custa da ingenuidade pedagógica e preocupações dos professores. E eu não conseguia entender por que razão companheiros das ciências da educação aceitavam “palestrar” nessas farsas mercantis. Por que seria?

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXXVIII)

Bom Jardim, 18 de dezembro de 2042

Muito tempo, demasiado tempo durou uma querela teoricista, inútil disputa pelo controle do que chamavam “ensino-aprendizagem”. De um lado, escolanovistas adeptos de um “dolce far niente educacional”. Do outro, instrucionistas radicais.

Pelo meio – um lugar onde nem sempre está a virtude – uma mistura de teoricistas casados com burocratas, pelo que, duzentos anos após a eclosão da praga instrucionista, a sala de aula (já digitalizada) prevalecia. Malgrado boas intenções e falsas teorizações de teorias em torno de um escolanovismo mal digerido, certo é que da centração no professor as práticas nunca saíram.

Sempre que alguém me dizia haver escolas em que o aluno era o centro, eu pedia que me dessem, pelo menos, o endereço de uma delas. Ninguém dava. Era mentira. Quanto muito, havia no fundo de uma gaveta da Direção da escola um projeto escrito, que falava de protagonismo juvenil, de autonomia do aluno, mas que a prática desmentia – o aluno continuava sendo adestrado, numa sala de aula, em que o centro era o professor.

Nos idos de vinte, a sala de aula estava travestida de “ensino híbrido” e de outros sucedâneos e paliativos do instrucionismo (palavra que não constava dos dicionários). E o amigo Pedro, talvez o maior dos teóricos de então, pregava no deserto:

“Poucas coisas são mais inúteis do que aula: roubam o tempo do estudante, desmotivam-no ostensivamente, refletem autoritarismo grotesco, deturpam o sentido da aprendizagem e do conhecimento, e representam a vanglória mais tola do professor.

Aula é o que mantém a escola presa ao passado fordista, como consta dos “Tempos Modernos” de Chaplin, repetitiva, monótona, linear, sequencial, insuportável, desumana. Não tem como objetivo cuidar da aprendizagem do estudante, mas de transmitir conteúdo, que frequentemente o estudante sequer entende.

Esta mania vem da faculdade, onde foi, estritamente, “vítima de aula”, e, logo, chegando à escola, reproduz o que recebeu por reprodução.

Urge achar soluções adequadas, para não invalidarmos, tão abusivamente, o futuro dos estudantes. Quem toma como compromisso fundamental da escola cuidar que o estudante aprenda, de maneira integral e comunitária, jamais coloca aula no centro.”

Por seu turno, o Mestre Milton criticava a reprodução escolar, fator de reprodução e exclusão social, o modelo cívico, cultural e político, causa da maior parte dos males do brasil dos anos vinte, que fora herdado de séculos da prática da escravidão. Esse Mestre descendente de escravos assim descrevia o drama: “A escravidão marcou o território, marcou os espíritos. Um modelo cívico subordinado à economia, uma das desgraças deste país.”

Devido a essa geopolítica, o centro do mundo não era o homem, mas o dinheiro: “Isso abriu espaço para qualquer forma de barbárie, pela qual a gente deixa morrer crianças, velhos e adultos, tranquilamente.”

E até o Papa Francisco asseverava ser necessária uma educação que respeitasse a diversidade e a inclusão:

“É necessário acelerar esse movimento inclusivo da educação, para combater a cultura do descarte, criada pela rejeição da fraternidade como elemento constitutivo da humanidade.

O movimento educativo construtor de paz é uma força que deve ser alimentada contra a “egolatria” que cria a falta de paz, fraturas entre as gerações, povos, culturas, populações ricas e pobres, homens e mulheres, economia e ética, humanidade e ambiente.”

No dezembro de há vinte anos, junto ao Bosque de Itapeba, reuni educadores construtores de paz. A Idade da Educação ali iria começar.

 

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXXVII)

Águas Claras, 17 de dezembro de 2042

Mais uma cartinha “azeda” (como vós lhes chamais) vos envio. Quisera fosse diferente, mas uma estranha melancolia me assaltou, coisa de velho que me impeliu para contar tristes episódios ocorridos há vinte anos.

No mesmo dia da visita do ex-ministro português (o da cartinha de ontem), era anunciado um Camilo à frente dos destinos da educação brasileira. Sobre o que esse Camilo fez e sobre o que não fez prometo falar-vos, em breve. Agora, completarei a descrição do episódio ontem iniciada, citando (ipsis verbis) o ex-ministro de má memória.

Ele começou a sua palestra depreciando a obra de Piaget, difamando o escolanovismo, demonizando Vigotsky e tudo aquilo que não fosse instrucionismo.

“Hoje, sabe-se muito mais do que no tempo do Piaget e do Vigotsky, que viveu há cem anos.”

Olha a novidade! Era certo o atraso. Mas, o “mas” a que ele se referia qual seria? Se ele defendia práticas instrucionistas, estaria muito mais “atrasado” do que o Vigotsky. Não cem, mas mais de duzentos anos! Mais adiante:

“A educação não vai bem. Nenhum dos países ultrapassou os 500 pontos.”

Etnocêntrico e arrogante, o palestrante enaltecia o PISA de Singapura, enquanto humilhava o Sul dos últimos lugares do ranking. O Sul que, lamentavelmente, o tinha convidado.

“Há uma revolução científica na educação.” – afirmou. Só não disse de que revolução se tratava e optou por enveredar por uma verborreia feita de “modismos pedagógicos”, como os “métodos contrafactuais” ou a “economia da educação”, misturados com a psicologia cognitiva e as neurociências, tudo bem arrumadinho em power point.

Disse não dar importância às “competências”, mas ao “conhecimento”, sem que aprofundasse tais conceitos e nos deixasse sem perceber a que se referia. Saberia o que era uma “competência”? Duvido. Talvez a criatura não fizesse a mínima ideia do que isso fosse, mas, sentia-se seguro por não dar hipótese de alguém o questionar.

“A Finlândia subiu até 2015. Depois, deixou o “ensino direto” e desceu.” – e foi mostrando gráficos de subir e descer, ILSA, TIMSS, PISA, PIRLS, manipulando percentagens, no blá-blá- blá costumeiro de quem diagnosticava crises sem saber como as debelar. Concluindo que as responsáveis pela crise eram as “novas pedagogias”, algo que apenas existia na sua imaginação.

Criticou aquilo que chamou de “sistema laxista centrado no aluno”, mas não disse onde tinha visto tal coisa. Também disse que o “ensino direto era melhor do que o ensino baseado na descoberta”. E atribuía à “aprendizagem pela descoberta” os maus resultados revelados pelo PISA.

Onde teria ele visto a aplicação do que chamava de “ensino baseado na descoberta”, se em 99 % das escolas avaliadas pelo PISA as práticas eram instrucionistas, ainda que, teoricamente, as apelidassem de “metodologias ativas”? Os péssimos índices revelados pelo PISA ficavam a dever-se a hegemônicas práticas instrucionistas.

Afirmou conhecer soluções, como deveria ser a “escola do futuro”, repetindo frases feitas, propondo paliativos instrucionistas, manipulando dados estatísticos. Para ele, como para os “estatísticos” por ele citados, as ciências da educação eram ciências ocultas. Ainda que fossem “doutorados em Educação”, eram ignorantes da Educação necessária. E, como vimos, alguns até chegavam a ser ministros.

Essas arrogantes criaturas infestavam os gabinetes de direção e administração educacional, impedindo que o direito à educação se cumprisse. Mas, o que impediria que os cientistas da educação quebrassem o seu proverbial e obsceno silêncio?

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXXVI)

Capão Seco, 16 de dezembro de 2042

Vai para uns cinquenta anos, o vosso avô foi convidado para uma entrevista na televisão portuguesa. Eram frequentes as reportagens sobre a nossa escola, por ser “novidade”, objeto de curiosidade.

Aquele era um programa de grande audiência, idêntico a tantos outros em que havia participado, por décadas. Mas, durante essa entrevista, precisei de explicar, tim tim por tim tim, o porquê do projeto. Pela milésima vez, me fizeram dar respostas a perguntas iguais a tantas outras.

“Então, na Escola da Ponte, as crianças fazem o que querem?”

“Não fazem o que querem. Querem fazer aquilo que fazem.”

“Mas, se eles não fazem prova, vão passar no exame para entrar na universidade?”

“Uma prova quase nada prova. E todos os nossos alunos, que fizeram esse exame foram aprovados.”

“Por que é que a Escola da Ponte não tem sala de aula? Todas as escolas têm.”

“Se todas as escolas têm, deveriam não ter, pois quase nada se aprende em sala de aula.”

E aí vinham as perguntas-perplexidades. E lá vinha o “acho que”… E eu rematava com a notícia de que a Ponte havia sido distinguida com o Primeiro Prémio no concurso de projetos inovadores organizado pelo Ministério da Educação.” Surpresa!

“Então, o ministério aceita o vosso método?”

“Não se trata de um método.” – como explicar para uma plateia ululante a componente técnica, a base científica? – “O ministério não só aceita, como tenta destruir.”

“A vossa escola está dentro da lei?”

“Sim, está. Porque a todos garante o direito à educação, a uma boa educação.”

“Então, isso quer dizer que as outras escolas…”

“Sim, estão fora da lei” – resolvi a hesitação do entrevistador – “e com o beneplácito ministerial.”

“E se você fosse ministro da educação?”

“Só se não tivesse juízo” – respondi. E ele insistiu.

“Mas, não há ministros bons? O que é um bom ministro?”

“Bom ministro será aquele que nada fizer, porque não fará besteiras (asneiras).”

“Mas, se fosse ministro, o que faria?”

“Tomaria um só medida. Publicaria um decreto com um único artigo: “Extinga-se o Ministério da Educação.”

Por que vos conto tudo isso? Porque, no Brasil de há vinte anos, tive o desprazer de reencontrar. um ministro de má memória, que muito mal causou à Ponte e ao sistema educacional português.

Gente brasileira desavisada convidou-o para um evento em que o vosso avô, também, participou. E ei-lo que atravessa o oceano, para comentar absurdos rankings e palrar sobre o que chamou de “ensino exigente”.

Comecei a minha “palestra” como sempre fizera, perguntando:

“O que quereis saber?”

Também como sempre sucedia, ninguém disse o que queria saber. E eu testei o “facilitista”, invocando a Ponte. Reagiu como o diabo diante da cruz. Saltou da cadeira e se foi – coragem e capacidade de diálogo não faziam parte do seu caráter. Só voltou à sala, quando o anunciaram como palestrante.

O seu discurso demonizava a mudança e a inovação. Mas, não abandonei o auditório. Heroicamente, aguentei o suplício. Respeitosamente, esperei pelo fim da palestra, para o interpelar. Deveria haver o habitual “tempo para perguntas e respostas”. Mas, o palestrante furtou-se às perguntas, mostrou um último slide com a palavra “Obrigado” e saiu do palco.

Era Inacreditável que aqueles que aplaudiam a criatura fossem os mesmos que me tinham aplaudido. Tal como eu, uma pequena parte da plateia não aplaudiu a miserável palestra. À saída, falaram comigo. Outros enviaram-me mensagens lamentando a ocorrência. E perguntavam: “Ele foi ministro? Não acredito!”

Amanhã, se vós quiserdes, vos falarei dos disparates que dele escutei. Não cabem nesta cartinha.

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXXV)

Samambaia, 25 de dezembro de 2042

Embora talvez vos custe acreditar, existe um bichinho que nasce, vive e morre dentro de uma bromélia. A bromélia é o seu berço e o seu túmulo.

A semelhança com a platônica caverna não é mera coincidência. Nos idos de vinte, havia gente “encaixotada”, que se dizia “fora da caixa”. Não ousavam seguir o rasto de luz que, de fora da caixa, lhes chegava. Padeciam de uma cegueira moral, de que Bauman nos falara, uma cegueira ética, a cegueira daqueles que podendo ver, optam por recusar ver. A cegueira social, com que Saramago apelava ao dever moral daqueles que enxergavam.

Tal como o bichinho da bromélia, havia educadores que não se interrogavam. Muto menos interrogavam o mundo. e mal não viria ao mundo, se esse viver “dentro da caixa” não aportasse prejuízo.

Mas, essa cegueira crônica foi funesta. Ao longo de dois séculos, os voluntários e inconscientes cegos impediram que uma nova construção social surgisse, que a Escola se redimisse de velhos pecados e que o direito à Educação a todos fosse assegurado.

Apesar do meu estrabismo, ou talvez por via dele, dado ver o mundo “fora da caixa”, sempre acreditei na possibilidade de fazer chegar alguma luz ao fundo da caverna. Para lá lançava perturbadoras perguntas, pois uma pergunta contém muito mais do que uma interrogação, porque comunicar é produzir e partilhar conhecimento. Desde muito cedo, havia descoberto que os professores tinham mais certezas do que interrogações e, mesmo nonagenário, ainda pergunto:

Por que se aprende?

O que se deve aprender?

Quem aprende?

Quem ajuda a aprender?

Quando se aprende?

Com quem se aprende?

Do que se precisa para aprender?

Onde se aprende?

O que é preciso aprender?

Como se aprende?

Como saber que se aprende?

Na minha vida de professor, nunca me cansei de perguntar. Por exemplo:

Por que existe segmentação em série, ano, ciclo?

Por que se divide o ano letivo em bimestre, trimestre, semestre?

O que é um ano letivo? Por que há “ano letivo”?

Por que são precisas classes de recuperação, aceleração, a EJA?

Se foram criadas classes de recuperação para aqueles que “não acompanham o ritmo da aula”, não haverá necessidade de criar classes de freiação para frear aqueles que são mais letos a aprender?

Por que há sala de aula?

Por que é que uma aula dura 50 minutos?

Cinquenta minutos para qual aluno?

Por que há turmas e subdivisão por escalões etários?

Alguém saberá dizer-me por que há banheiro de professor separado de banheiro de aluno?

Ninguém dava resposta a estas e outras perguntas.

“Está na lei.” – diziam alguns.

Por que está na lei?

O silêncio era a resposta. Ninguém sabia fundamentar “porque estava na lei”. Muito menos se sabia fundamentar cientificamente outros absurdos. Da ausência do sentido da visão, de que padeciam voluntários cegos, resultava uma Escola sem sentido.

Quando o vosso avô andava pelas escolas, incentivando nos professores o hábito de questionar e a prática de uma comunicação dialógica, começava por perguntar aos seus alunos:

“O que queres saber?”

E me desgostava ouvi-los responder com outra pergunta:

“Eu posso dizer o quero saber?”

Eram crianças de tenra idade, mas já padecendo de não perguntar. Anos a fio, em sala de aula, tinham escutado respostas a perguntas que jamais fizeram, tinham desaprendido de ser, por serem proibidos de se perguntar.

Desde há mais de meio século, apenas uma resposta escutei:

“Está quase a chegar uma “Educação do Futuro”.

Nos idos de vinte, essa mítica “Educação do Futuro” teimava em “não chegar”. E eu lançava mais uma pergunta.

Por que não fazer essa “Escola do Futuro”, no presente?

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXXIV)

São Pedro da Aldeia, 14 de dezembro de 2042

Em 1917, um tal Professor Serrano escrevera;

A pedagogia scientífica condemna por inefficaz e nociva à formação intellectual do alumno a velha idéa de que aprender é, quasi exclusivamente, decorar. Sobrecarregar de nomes e datas a memoria da creança, mesmo sem que ella compreenda as mais das vezes absolutamente nada: tal a preoccupação dominante de muitos que se julgam aptos para a diffícil missão de ensinar (…).
Quantas escolas, hoje ainda, não lembram ao transeunte aquellas da antiga Roma, em que os alumnos repetiam em côro a lição de arithmetica: “Um e um, dois; dois e dois, quatro”. – Horrível estribilho, diz Santo Agostinho, que guardava de seus primeiros estudos desagradável impressão (sic).”

Tal e qual! Há mais de cem anos, esta foi uma das primeiras denúncias escolanovistas de práticas instrucionistas.

Nos idos de vinte, do básico ao “superior”, o instrucionismo imperava. Rareava a inovação, abundava a obsolescência. Aquilo que denominavam de “inovador” no sistema educativo remontava a modelos criados há mais de cem anos.

Sem ponta de pudor, revistas “especializadas” publicavam “relatos de educadores sobre como estavam inovando no dia a dia escolar”. Aqui vos deixo alguns despropósitos colhidos ao acaso:

“Com o retorno presencial após dois anos de distanciamento…” – com esta conversa para boi dormir, invocando a pandemia como “bode expiatório” eram introduzidas pseudo-inovações:

“Estudantes aprendem física enquanto tomam açaí em praça de Aracruz” – na mesma Aracruz onde, dias antes, um jovem tinha matado professores.

“Memes no ensino de história mobilizam criatividade de estudantes do fundamental.”

“Danças do TikTok podem ensinar pensamento computacional.”

“Professor cria canal digital de combate ao bullying e apoia estudantes a denunciar casos de bullying, anonimamente.”

Por que se falava da utilização de memes, Tik Toc e games como se tratassem de inovação? Por que eram vendidos “inovadores cursos de metodologias ativas em sala de aula”, se sabíamos ser impossível inovar em sala de aula? E o que dizer de “denúncias anônimas”? Cadê a “Escola Pùblica”? Que São Paulo (Freire) nos valesse!

Ainda passeando pelo tempo da pré-história da Educação… Em Portugal, um decreto de 1967 autorizava a realização de experiências pedagógicas em estabelecimentos de ensino, que poderiam consistir, inclusivamente, no funcionamento experimental de novos tipos de estabelecimentos (escolas-piloto). No artigo terceiro, estava inscrito que o ministro poderia mandar colaborar nas experiências agentes ou auxiliares de ensino de outros estabelecimentos dependentes do ministério, fosse qual fosse a modalidade do seu provimento, dispensando-os total ou parcialmente das funções próprias.

Entre a denúncia do escolanovista Serrano e a publicação do decreto distavam cinquenta anos. Entre o final da década de sessenta e os idos de vinte, outro meio século decorrera. E, quer no ensino “superior”, quer no “inferior”, vigorava “a velha ideia de que aprender era, quase exclusivamente, decorar”.

Nas secretarias de educação, como nos ministérios dos idos de vinte, se mantinha inalterado o velho modelo hierárquico e autoritário parido na Prússia Militar do século XVIII, nas casernas e “celas” de aula dos conventos franceses do século XIX, na Inglaterra da primeira Revolução Industrial.

Parada no tempo, a Escola dos idos de vinte reproduzia um modelo educacional de há dois séculos.

Cadê a inovação?

Cadê os “inovadores” autores de teses sobre inovação?

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MLXXXIII)

Cabo Frio, 13 de dezembro de 2042

Por meados do mês de dezembro, o dia amanheceu com arruaças na capital. E amigos meus, insignes universitários, surpreendiam-se com “atos de terrorismo” praticados em pleno século XXI. 

Quem educara esses “terroristas”? 

A responsabilidade poderia ser atribuída à educação recebida no seio de famílias inseridas num sistema social doente, desumanizador do ato de educar. E a uma Universidade que dissertava sobre Teoria Social Crítica, enquanto se mantinha ancorada em práticas prussianas. 

Às escolas se poderia, também, imputar responsabilidade, pois reproduziam tais práticas – como sabemos, num sistema hierárquico e autoritário, o exemplo vem de cima. A Escola Pública, berço da Democracia, ainda estava por fundar. A Escola que Anísio sonhara, nos idos de cinquenta, estava longe de formar cidadãos e produzia bonsais humanos. 

Mas, como a culpa sempre morreu solteira, parecia que ninguém assumia responsabilidade por coisa alguma. Exceções, como a do meu amigo Leo, eram raras: 

“Zé, nascemos num mundo e em lugares deste vasto planeta em que a promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos já era uma realidade. Pena que as escolas continuem organizadas a partir dos processos de disputa e classificação, mantendo, portanto, vivas as características básicas dos processos prussianos de formação. Os mesmos processos que construíram as civilizações das Grandes Guerras do século XX. 

Estou lendo Bauman e vejo nele a crítica ao cientificismo moderno, que, com seus rituais, separa o mundo entre pensadores e práticos Parece que o mundo não consegue desapegar-se dessa ideia de que o fazer-pensar-fazer são faces da mesma moeda.”

O Leo era um dos escassos professores universitários conscientes da necessidade de refundar a Escola (torná-la, efetivamente, Pública) e conceber a Universidade à medida do sonho de Darcy.

Compreendo, queridos netos, por que, construtivamente, criticastes a cartinha de ontem. Dissestes ser ela “dura”, “negativa”. Talvez. Admito que voltei a sentir sensações de antanho, do tempo em que uma crise ética se instalara. Era duro assistir à mercantilização da escola. Como aquele “Curso on-line – A EDUCAÇÃO HÍBRIDA E A PEDAGOGIA DE PROJETOS: PROTAGONISMO”.

Na prática, um logro! O que seria a famigerada “Pedagogia de Projetos”? Quem seria “protagonista”? O aprendiz não seria, certamente. Talvez o “palestrante”, pois o “valor com certificado de participação” custava ao formando 98 reais. E com “certificado acadêmico” subia para 118.

Enganações como essa eram abundantes, acompanhadas do adjetivo “inovador”. É curta a memória doa homens. Por isso me atrevo a voltar à “dureza” de uma crítica, que considero legítima. Admito que, também, possais chamar de “amarga” esta cartinha. Mas, crede que, vinte anos passados, quase apaguei da memória essa e outras tristes recordações. 

Nesse agitado dezembro, deambulei por escolas e casas de amigos. Na Região dos Lagos, a Bianca e o José me acolheram e me levaram a conhecer jovens casais em busca da educação de que os seus filhos eram merecedores, num tempo em que a educação das crianças e dos jovens ainda era muito maltratada.

Como poderíamos humanizar a educação, sob o esmagador peso de uma tradição de séculos? Evidentemente, imitando o beija-flor da estória, fazendo “a nossa parte”. 

Apesar de saber que aprendemos a partir do perguntar, hoje, nada perguntarei. Proponho que sejais vós a fazê-lo. De vós espero as perguntas, nestas cartinhas, ou por outra via. Precisamos de novas respostas, para velhas práticas.

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