Planalto Central, 18 de junho de 2040
Um Tiê brasiliense perguntou: Papai, por que é que o céu é azul?
Se o seu pai se chamasse Lúcio, responderia: “Porque o céu é o mar de Brasília, meu filho”.
A Física explica o fenômeno. Trata-se do chamado “espalhamento de Rayleigh”. A radiação solar é uma luz brilhosa e branca, composta por várias outras tonalidades de cor. Cada cor tem um comprimento de onda específico. Quando a luz penetra na atmosfera, atinge átomos de nitrogênio e oxigênio, e partículas, que a compõem, dando origem ao fenômeno do espalhamento. Quando surge com toda a faixa de frequência, a luz do Sol, entra na atmosfera e muda o seu índice de refração, se expande em uma cor apenas: o azul.
Niemeyer e Lucio Costa reconheceram a paisagem brasiliense como incomum, peculiar e rara. O clima seco, a altitude e o relevo também influenciavam a formação das cores, que o céu ia assumindo ao longo do dia. Mas, eu preferia a versão poética, aquela que levou um servidor público a pedir ao Iphan que o céu de Brasília fosse tombado como patrimônio imaterial. E, mais uma vez, escutava a Mãe Carolina:
Como psicóloga, aprendi a não responder diretamente a uma pergunta, aprendi a refazer a pergunta e facilitar o processo de busca por respostas. Alguns educadores falam que as crianças não perguntam, que têm dificuldade em elaborar um roteiro de estudos. Aqui em casa, passo o dia ouvindo perguntas. Tiê é um questionador! Ele acorda fazendo perguntas e vai dormir perguntando.
Ontem, resolvi escrever as perguntas, ampliar a minha compreensão, frente a janelas de aprendizagem, que ele está abrindo. Anotei dez perguntas. Claro que essas perguntas aumentaram quando as refiz. Compartilho o roteiro de um dia do nosso passarinho Tiê:
Mamãe, chocolates são feitos de fruta. Por que não posso comer chocolate no café da manhã? De que é feito o metal? Os bebês vivem nas estrelas, antes de virem para a barriga das mães? De que os carros são feitos? Mãe, para que servem os seres humanos? Por que os elfos e as fadas se escondem das pessoas? Mamãe, o que é “automático”? De que esse desenho é feito? Mamãe, caranguejo sabe escalar? O que é cooperar?
Tiê é um nome de origem tupi, representa um passarinho colorido. Conta a lenda que, se for preso, perde as cores. Para ser feliz e colorido, o Tiê precisa ser livre, para voar. O nosso menino-passarinho voa nas ideias, nas perguntas de fazer voar:
Mamãe, por que é que o céu é azul?
A mãe Carolina respondeu: “Por que será?” – E partiram, mãe e filho, para uma viagem imaginária, esvoaçando num céu baiano pintado de azul-anil.
Quando, no chão da escola, eu perguntava a uma criança “O que queres saber?”, a “resposta” surgia, quase sempre, sob a forma de pergunta: “Tio, eu posso dizer o que eu quero saber?”
Perante a perda do dom da curiosidade, a minha tristeza era mais triste do que uma tristeza comum. Porque, apesar de distante do meu tempo de infância, eu permanecia na idade dos porquês.
Uma metáfora de Saramago diz-nos que o grande crime é não cegar quando todos já são cegos. Do “Ensaio sobre a Cegueira” ao “Ensaio sobre a Lucidez”, Saramago não faz outra coisa que não seja lembrar-nos a tragédia edipiana, que nos fala daqueles que, tendo olhos não vêem, e de cegos que conseguem ver. Num belo filme, que dá pelo nome de “Vermelho como o céu”, um menino cego, para quem o céu é vermelho, guia uma menina por corredores escuros. Somente quando alcançam a saída da platónica caverna, a menina reassume a missão de conduzir…
Hoje, sou um idoso de 90 anos e o Tiê é um jovem de 25. Continuamos a brincar de perguntar…
Por: José Pacheco
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