Patos de Minas, 14 de agosto de 2040
Nos idos de vinte, para muitos dos improvisados candidatos à docência, o objetivo era apenas o de conseguir um diploma. Promovidos a “dadores de aulas”, reproduziam o modelo da ensinagem experienciado enquanto alunos, no tempo das aulas de blá, blá, blá e power point.
Um auleiro queixou-se do seu magro salário e pediu-me que lhe “ensinasse o método da Escola da Ponte” (sic). Expliquei-lhe que não se tratava de um método, gastei muitas horas a descrever o modo como trabalhávamos e facultei-lhe dispositivos e documentos por nós utilizados.
Anos depois, encontrei-o num congresso, na qualidade de palestrante. Havia descoberto que a cientificidade poderia ser substituída pela “citabilidade”. Fez doutorado… e já era consultor. Longe ia o tempo do magro salário de professor de escola pública.
No tempo da pandemia, voltei a encontrar consultores educacionais, que industriavam os gestores no “regresso às aulas”. Esses “especialistas” disfarçavam a sua ignorância sofisticando o discurso. Enfeitavam-se de citações e frases de belo efeito. Estavam na moda expressões como “inovação em sala de aula” e “metodologias ativas em sala de aula” – como se fosse possível desenvolver tais metodologias ou inovar em sala de aula!
Os “consultores educacionais eram contratados por escolas privadas, para recuperação de crédito, para saber como lidar com boleto vencido e sair da situação de inadimplência. Havia-os também nas secretarias de educação, na qualidade de assessores, ensinando a gravar videoaulas, a validar aulas remotas, a fazer avaliação à distância – como se aulas remotas servissem para alguma coisa e uma prova virtual fosse avaliação! Enfim!
Legitimadas pelo discurso dos “consultores” as escolas particulares viviam na ilusão de serem “boas escolas”. E as secretarias esbanjavam recursos, pagando “projetos” tão velhos e tão inúteis como aqueles que outros “consultores especialistas” tinham vendido à gestão anterior.
A maioria dos consultores era formada em pedagogia e marketing, pelo que me assaltava uma dúvida: esses “especialistas” agiriam por ignorância, ou intencionalmente? Com mágoa e preocupação, concluí que usavam a ignorância alheia para enriquecer. E, como o assunto não merece mais arengar, vos deixo com uma anedota, que caracteriza esse tipo de “consultor”.
Estava o pastor apascentando o seu rebanho, num verde pasto dos cafundós das Gerais e eis que um carro para na estrada. Dele sai um jovem bem parecido, paletó de executivo, pasta de computador na mão, e dele se aproxima.
Bom dia, doutor! – saudou o pastor – Uai! O que cê faz nesta biboca de Deus? Aqui só passa cata-jeca.
Venho fazer-lhe uma proposta – respondeu o jovem.
Bão, mar bão mermo!
Se eu adivinhar quantos animais você tem no seu rebanho, você me dá uma ovelha?
Combinado. Mas olhe que é difisdemais…
O jovem ligou o computador e instalou uma antena parabólica.
Uai! Cê besta, trem?
É um computador. Tecnologia!
Feitos os cálculos, o jovem disse que o rebanho tinha duzentos e trinta animais.
Certo! – confirmou o pastor – Cê pode pegar uma ovelha.
O jovem assim fez. E, quando se preparava para partir, o pastor assim falou:
Eu sei o que cê mexe com que.
Você disse que sabe qual é o meu trabalho? Foi isso? – replicou o jovem.
Sim. E, se eu acertar na sua profissão, cê devolve-me o animal?
Claro! Mas não vai conseguir. É uma profissão muito nova!
Eu acho que cê é consultor.
Certo. Mas, como soube que eu sou consultor?
Porque cê chegou e eu não o tinha chamado. Disse-me aquilo que eu já sabia. E, entre tantos animais, levou-me… o cachorro.
Por: José Pacheco
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