Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DXXXVI)

Sintra, 20 de maio de 2041

Nos idos de vinte, sempre que alguém me perguntava se “estava tudo bem”, respondia:

“Não está bem, mas há-de ficar”.

A minha amiga Tina, que publicava crônicas breves e plenas de oportunidade, respondia ainda mais radicalmente. Numa das suas crônicas, reagiu a uma pergunta: 

“Há professores que não querem mudar, que acreditam na velha educação tradicional e está tudo bem, não está?” 

Não! Não está tudo bem!” – contestou a Tina – “Esses professores morreram e não perceberam. Agora, são máquinas de gerar tristeza, frustração e insegurança nas crianças e jovens. Não dá para forçar que um professor desumano se torne humano, mas falar que está tudo bem, também não dá. O autoritarismo tirano e a coerção entraram para a normalidade dessa forma de pensar educação”.

Escutemos o Mestre Agostinho, que a Tina tão bem conhecia: 

O que importa não é educar, mas evitar que os seres humanos se deseduquem. Cada pessoa que nasce deve ser orientada para não desanimar com o mundo que encontra à volta. Porque cada um de nós é um ente extraordinário, com lugar no céu das ideias. Seremos capazes de nos desenvolver, de reencontrar o que em nós é extraordinário e transformaremos o mundo”.  

Quando, no início da década de sessenta, ajudava a colocar os primeiros pilares no que viria a ser a Universidade de Brasília, Agostinho vaticinava “uma nova educação”, que chegaria com o novo século. Porém, na Brasília dos idos de vinte, o poder público tudo fazia para manter a “velha educação”. 

Entre 2015 e 2019, o Júlio e o Rafael tudo fizeram para cumprir o preceituado no documento orientador da política educacional do Distrito Federal: o “Currículo em Movimento”. 

Em 2021, funcionários intelectual e moralmente corruptos abusavam do poder, para contrariar a nobre intenção de dois excelentes secretários de educação. Serventuários do regime de medo aceitavam fazer trabalho sujo, semear burocráticas “pedras” nos descaminhos da inovação. Dois anos antes, esses funcionários tinham estabelecido uma linha de base da péssima qualidade da educação que, então, se fazia no DF. E diziam querer criar condições de mudança. Em 2021, talvez com medo de perder o emprego, servilmente obedeciam às ordens de novos e retrógados senhores, recorrendo à mentira, renegando valores e princípios.

Em próximas cartas, vos darei a conhecer alguns lamentáveis episódios. Mas, também vos falarei da coragem, persistência e ousadia de maravilhosos educadores, que perfilhavam uma confuciana sentença:

“Transportai um pedaço de terra todos os dias e fareis uma montanha”.

Milénios depois de Confúcio, no ocidente lusitano, o Pessoa diria algo semelhante à epígrafe do oriental mestre, afirmando poder construir um castelo com as pedras que lhe barravam o caminho.

Paralelamente a esses desatinos, a Rede de Comunidades de Aprendizagem tomava forma. A informação estatística disponível, novos dados de natureza quantitativa e qualitativa permitiram atualizar a “linha de base” de 2019, e elencar indicadores de boa qualidade educacional. Concluído um primeiro inventário de necessidades, desejos e problemas, foram introduzidas práticas de economia solidária, de sociocracia, de permacultura, de não-violência, no contexto de uma nova construção social de aprendizagem. 

Educadores éticos reafirmavam o que neles era amor e coragem. Com as simbólicas pedras, que lhes barravam o caminho, sepultaram o lamaçal negacionista, mudaram o cenário da educação brasiliense. 

Por rotas arduamente abertas, se reedificava a escola pública. Anísio voltava à sua Brasília.

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