Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCLXXXII)

Penacova, 17 de outubro de 2041

Completemos a resposta começada na cartinha, que, ontem, vos enviei:

“Se na Assembleia forem discutidos assuntos que lhes digam muito, o comportamento será adequado e apropriado. Daí, a importância de serem os alunos a fazer a convocatória, ou seja, de serem eles a pedir os assuntos pelos espaços de aprendizagem, para que os alunos possam dar o seu contributo para o debate da assembleia seguinte. 

Outro aspecto muito importante a ter em conta diz respeito ao fato de este espaço ser visto pelos alunos como uma oportunidade fantástica de expressar a sua opinião, que, efetivamente, é tida como importante e respeitada pelos outros.

A Assembleia funciona pelos dois sentidos que falaste: deliberativo e executivo. São os alunos que fazem as propostas a serem votadas e são os mesmos que as colocam em prática, de uma forma organizada e planificada. É evidente que, por vezes, somos colocados perante situações difíceis. Nem sempre os alunos agem com bom senso. É aqui que entra o professor, agindo como “entidade reguladora”. 

Muitos problemas de indisciplina estão relacionados com uma relação muito distante, fria entre aluno e professor. Se existir uma relação de respeito, o aluno percebe que existem barreiras que não pode ultrapassar. Ele percebe isto sem que o professor o diga. Somente é preciso que o sinta. Quando falamos em relação próxima, não nos referimos “aos beijinhos e abraços”, entre professor e aluno (também pode acontecer…), referimo-nos a uma relação construída em alicerces de respeito e admiração não forçada, que se vai ganhando com o decorrer do tempo. 

Não entendemos que um aluno seja disciplinado, quando está domesticado. A domesticação passa pela imposição de algo, disciplina está relacionada com o crescimento pessoal do indivíduo.” 

Fecho esta cartinha com mais um dos muitos diálogos em torno de uma educação na cidadania.

“Sonho que, um dia, eu também possa presenciar cenas de convivência e respeito mútuo entre alunos e professores. Sinto-me frustrada, quando não consigo ajudar um aluno considerado indisciplinado pelos professores. 

Reconheço que a questão da indisciplina, no Brasil, é muito complexa. Em uma das palestras do Professor Pacheco, aqui, no Brasil, ele disse que não se forma para a cidadania, mas que nos educamos no exercício da cidadania. A minha pergunta é como é possível iniciamos um trabalho que contribua para formação deste ambiente de cidadania e convivência democrática? 

Eis a resposta dada por um professor da Ponte:

Em minha opinião, é necessário que os alunos “vivam” e “construam” a sua própria cidadania, no exercício da cidadania. Muito do trabalho que é desenvolvido por estes “cidadãos de palmo e meio”, nasce de um forte contexto de aprendizagem, numa base de tentativa e erro. Pela experiência que possuo (que também não é muita…), verifico que, no início, é muito difícil para os alunos essa vivência. É necessária muita compreensão por parte de todos, para que os meninos se preparem de forma consistente e adequada para o exercício efetivo de cidadania. 

Houve um tempo em que o ministério incorporou no texto da lei alguns dispositivos, que a Ponte criara, ou recriara. Entre eles, a tutoria e a assembleia, merecedores de referência em decreto. De pronto, o regulamentador transformou dois dispositivos essenciais de relação em pedagógicas caricaturas. A tutoria foi transformada em mais um meio de controle. O exercício de cidadania plena da Assembleia foi “domesticado”. Esse dispositivo perdeu o sentido, quando foi adaptado a… “assembleia de turma”. 

 

Por: José Pacheco

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