Congonhas, 10 de novembro de 2042
Dissestes que talvez eu não fosse isento no historiar a Ponte, por ser o meu olhar um olhar por dentro. Então, ao invés de o fazer, abrirei a escola aos olhares de quem a conheceu por fora. Não sem antes reproduzir o conteúdo de uma reportagem de televisão transmitida no dia dez de novembro (de há vinte anos).
Era mais uma reportagem entre muitas, que davam conta de iniciativas consideradas “inovadoras”, mas que não passavam de paliativos dos males do “sistema”.
Dessa vez, tratava-se da divulgação do “Projeto Escola vai ao Bairro”, um projeto “para adultos que abandonaram a escola” (sic).
Consistia em “levar os professores para fora da escola, para os bairros sociais”. E uma “finalista” do curso elogiava-o porque, antes, o seu horário de trabalho não lhe dava oportunidade de fazer estudos, de ir à escola… ou de “ficar no bairro”.
Nas escolas de sala de aula, não se cuidava de saber por que razão aqueles jovens tinham abandonado a escola. Seria porque o horário não “dava oportunidade”?
Para colmatar os graves efeitos do instrucionismo, não se alterava o modo de gerir o tempo, inventava-se “aulas de reforço”, aulas de “recuperação de aprendizagens”, aulas com pacotes “sócio emocionais”, de meditação e quejandos. Os “centros de explicações” floresciam. As escolas de “segunda oportunidade” tentavam minorar estragos. A “Escola Pública” era uma miragem.
A dita reportagem terminava com a notícia da “bênção das capas dos finalistas do secundário, celebrada com missa jantar a e festa, com fato e capa”.
“Alguns finalistas não têm possibilidade de as comprar” – comentava a repórter – “Mas a loja solidária da câmara encontrou a solução. Os fatos são emprestados. O importante é ir, até mesmo quando não parece verdade” (sic).
Sem comentários! Passo a palavra ao Rui e à Ariana que, no início deste século isto escreveram:
“Não se poderia prestar pior serviço à Escola da Ponte do que entendê-la como o arquétipo em função do qual se deveria definir o modelo de escola pública e democrática. O que não significa que não entendamos a Escola da Ponte como um contexto escolar que nos permite compreender o que pode ser uma escola pública e democrática e que não possamos discutir a configuração desta escola a partir do projeto “Fazer a Ponte”.
Recusar a existência da fôrma que a Ponte poderia constituir não significa, no entanto, que não se aceite discutir um modelo conceptual que permita configurar uma escola pública e democrática, a partir da definição de um conjunto de variáveis e mesmo de propriedades invariantes que, quer do ponto de vista administrativo, quer do ponto de vista organizacional, quer do ponto de vista pedagógico, possibilitem aceder a esse modelo.
Em todas estas vertentes, reconhecemos que a Escola da Ponte pode contribuir, de forma iniludível, para que essa reflexão aconteça, mas é sobre a dimensão pedagógica do projecto “Fazer a Ponte” que nos iremos debruçar, a partir da interpelação do património e da experiência que os professores daquela escola de Vila das Aves foram construindo e desenvolvendo ao longo dos últimos 25 anos.
É esse património e essa experiência que poderão constituir um referente para refletirmos e discutirmos sobre as escolas como organizações que prestam um serviço público no âmbito de uma sociedade que se pauta por valores que a identificam com uma democracia. Do ponto de vista pedagógico, quais são as implicações de uma tal opção?”
Quais seriam? Provada que foi a excelente qualidade da “Escola Pública da Ponte”, por que não se cuidou de melhorar a dita “Escola Pública”?
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