Novas Histórias do Tempo da Velha Escola MCDLXXIV

Batalha, 9 de janeiro de 2044

Conta-se que um filósofo conversava com o diabo, quando passou um sábio com um saco cheio de verdades, do qual uma caiu. Alguém a apanhou e saiu correndo, gritando:

Encontrei a verdade!”

Perante esse quadro, o filósofo disse para o diabo:

Aquele homem encontrou  a verdade e, agora, todos vão saber que você é uma ilusão da mente.”

Mas o diabo respondeu:

Está enganado. Ele encontrou um pedaço da verdade. Com ela, vai fundar mais uma religião. E eu vou ficar mais forte!”

Quem sofrer de alguma forma de angústia existencial encontrará respostas em Kalil Gibran, ou em Saint Exupéry. Aqueles que estiverem em situação de dúvida religiosa poderão recorrer à Bíblia, ao Corão, ou a outro qualquer livro sagrado. Essa experiência pode constituir-se numa bela harmonia. Certamente, haverá muitas verdades para a verdade em que acreditamos.

Se eu vejo de um modo e o outro vê de outro modo, que tentemos ver os dois modos, ver juntos, como Gandhi fazia:

A minha preocupação não está em ser coerente com as minhas afirmações anteriores sobre determinado problema, mas em ser coerente com a verdade.” Não esqueçamos que foi a imposição de uma “verdade” única que levou Espinosa ao exílio e Galileu à retratação.

O José Prat ironizava:

Sempre que alguém afirma que dois e dois são quatro e um ignorante lhe responde que dois e dois são seis, surge um terceiro que, em prol da moderação e do diálogo, acaba por concluir que dois e dois são cinco.”

Apesar das distorções da informação cometidas pela mídia, a verdade continua sendo verdade. Quando a mentira, tal como a Medusa, contempla o escudo de Teseu, sossobra, porque reconhece a sua verdadeira face.

Acredito que todo o ser humano é uma dúvida, uma metamorfose ambulante. A dúvida e a humildade são companheiras diletas da verdade, uma mistura sublime. Aceitemos, serenamente, os mistérios por desvendar, sem necessidade de explicações para o inexplicável.

Venho repetindo que o princípio da veracidade deverá nortear todos os projetos educativos. Mas, na boca das crianças, a verdade chega a ser crueldade…

A tia desculpe! – disse a aluna.

Porquê, minha filha? – quis saber a professora.

É que chamei a senhora de idiota – esclareceu a criança.

Eu não escutei nada – disse a professora, sorrindo.

Foi só em pensamento… – esclareceu a criança.

Ainda que sem que disso tome consciência, a criança age filosoficamnete, buscando verdades, como que reconstitui a história da filosofia dos adultos: Thales afirmava ser a água o elemento fundamental da matéria. Anaxímenes acreditou que fosse o ar. Para Xenófanes o elemento fundamental era a terra. Heráclito afirmou que era o fogo. E chegou Empédocles, para explicar que o mundo é combinação da água, ar, terra e fogo. As crianças e os loucos falam verdades que a sua época permite vislumbrar. Talvez por isso, os loucos sejam internados em hospícios e as crianças em escolas. Permiti, pois, que vos narre mais um episódio, confirmação da infantil prática da verdade.

Uma professora tentava convencer os alunos a comprar uma  cópia da foto do grupo:

Imaginai que bonito será, quando vocês forem  grandes e todos digam «ali está a Catarina, é advogada, este é  o Miguel e, agora, é médico».

Uma vozinha, vinda do fundo da  sala, fez-se ouvir: E ali está a professora… Que já  morreu.

Num e-mail recebido de uma professora estava escrito:

Eu estava numa palestra sua e lhe fiz uma pergunta. Me apresentei como pedagoga e disse que tinha duas dúvidas. O senhor me respondeu algo assim: Como pode ser pedagoga e ter apenas duas dúvidas?”

Sim. Como poderá ter apenas duas dúvidas?

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