Itapiranga, 10 de dezembro de 2040
Em 2015, o MEC lançou uma chamada pública, para identificar iniciativas com potencial inovador. Foram identificadas 178 iniciativas. O ministério enviou certificações às escolas consideradas inovadoras, comprometendo-se a acompanhá-las. Mudaram-se os tempos, mudaram-se as vontades. E o MEC não cumpriu o compromisso assumido. Muitos projetos foram extintos por intervenção de um poder público ignorante, corrupto e autoritário.
No Brasil, presenciei o desaparecimento de muitos projetos. Em Portugal, praticando uma gramática da resiliência, a Ponte conseguiu resistir. Alcançou os primeiros lugares em concursos de projetos inovadores, teve as mais altas classificações nos processos de avaliação externa e até foi homenageada pela Presidência da República. Isso lhe permitiu granjear prestígio e… muitos inimigos.
O manifesto, que vos dei a conhecer em cartinha anterior, constituiu-se em solidária reação às ministeriais perfídias. Espero não vos maçar com a transcrição de excertos. É um documento longo, mas o “enxugarei”:
“Os professores, os pais e a direção da escola vêm solicitando ao Ministério que cumpra os compromissos assumidos e assegure as condições mínimas para viabilizar a continuidade deste projeto. As suas exigências traduzem-se em solicitar ao Ministério: que celebre com a escola um contrato de autonomia que viabilize o seu projeto; a constituição de uma equipa de acompanhamento e avaliação; a disponibilização de instalações adequadas; a adequada estabilização do corpo docente. O Ministério da Educação faz o contrário do que diz A retórica política tem enfatizado, como orientação central, o prémio ao mérito. A Escola da Ponte tem-se notabilizado pelos resultados obtidos pelos seus alunos nas provas de aferição à escala nacional. Neste caso, o mérito, em vez de premiado, é penalizado.
O Ministério tem afirmado pretender favorecer o protagonismo das famílias, mas, neste caso, procede contra a sua vontade expressa. O Ministério afirma pretender a responsabilização das escolas através dos seus resultados, mas ignora-os e mostra-se incapaz de materializar um contrato de autonomia, previsto na lei. O Ministério apregoa o rigor na avaliação, mas ignora as conclusões e recomendações da comissão de avaliação externa, por si designada. O Ministério pretende negar a esta escola o cumprimento de competências que lhe são inerentes (promover uma escolaridade de nove anos) quando, paralelamente, impõe a constituição à força de agrupamentos verticais.
Os professores da Ponte têm razão! Não aceitam a perversão do seu projeto e, por isso, recusam dar-lhe continuidade, nos termos que o Ministério pretende impor. Achamos que os professores têm razão e, como eles, perguntamos se «é este o prémio que o Ministério da Educação reserva para as escolas de qualidade».
Como professores e educadores, estamos preocupados com o futuro do projeto. Mas estamos, sobretudo, solidários com a comunidade educativa da escola e, em particular, com o grupo de professores que teimam em ser autónomos, criativos e donos da sua profissão, sem para isso pedirem prévia autorização.
Fazendo nossas as palavras da Associação de Pais da Escola da Ponte, consideramos que «seria um absurdo que, por um capricho de governantes, sempre transitórios, este projeto se extinguisse, ao fim de 27 anos». É algo que não podemos aceitar e a todos envergonharia.”
O ministério não conseguiu extinguir o projeto. E, em 2040, a Ponte celebrou o seu sexagésimo quarto aniversário.
Por: José Pacheco
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