Tabira, 18 de janeiro de 2041
A “Declaração Universal para a Responsabilidade Humana” diz-nos que a Humanidade, em toda sua diversidade, pertence ao mundo vivo e participa de sua evolução, que os seus destinos são inseparáveis. Propõe princípios gerais, que podem servir de base para um novo pacto social. Eis um exemplo:
“O exercício do poder só é legítimo quando serve o bem comum e quando é controlado por aqueles sobre os quais esse poder é exercido; a busca da prosperidade não pode ser desvinculada de uma partilha justa das riquezas; os saberes e as práticas só adquirem todo seu sentido quando são compartilhados e usados em prol da solidariedade, da justiça e da cultura da paz”.
Isso mesmo: é impossível ser feliz sozinho”. Se um ser humano podia reivindicar seus direitos, deveria, igualmente, manifestar consciência de que as suas responsabilidades eram proporcionais aos direitos reivindicados. Mas, como diria Kazu, “éramos todos humanos, até que a raça nos desligou, a religião nos separou, a política nos dividiu e o dinheiro nos classificou”. E, em 2021, caminhávamos rumo ao nada, estávamos longe de concretizar os princípios dessa “Declaração”.
Já aqui vos falei do projeto das redes de comunidades de aprendizagem. Permiti que volte ao assunto, pois convirá fazer a memória desse movimento, que tantas e tão profundas mudanças operou. E, também, porque partiu da assunção de um compromisso ético, para concretizar os princípios expressos na “Declaração Universal para a Responsabilidade Humana”.
A criação de um núcleo de projeto marcava o início da reconfiguração das práticas. Quando os educadores que o constituíam, procediam à identificação de valores comuns, erguiam comunidades.
Os seres humanos são, implícita ou explicitamente, conduzidos por valores, que o conjunto de comportamentos reflete. Um valor é um fundamento ético, que norteia o comportamento humano e que é traduzido por uma única palavra.
Cada educador elaborava uma lista de valores, que considerava serem fundamentais na sua vida. Depois, verificar-se-ia a existência de valores comuns às várias listas. Esta tarefa poderia ser realizada com recurso a uma dinâmica chamada “árvore dos valores”. Identificados os valores comuns, definida uma matriz axiológica, tomava forma a equipe que asseguraria a concretização do projeto.
A partir do inventário de valores, era elaborada uma carta de princípios e estabelecidos acordos de convivência. Em seguida, procedia-se à análise de documentos. Seria preciso verificar se existia coerência entre a LDB e o projeto da instituição, bem como se a regulamentação era coerente com o teor do projeto. A carta de princípios definia um perfil de sujeito de aprendizagem e de tutor.
O levantamento de valores predominantes na comunidade e um inventário de necessidades e potencialidades da população completava o ciclo de instalação das turmas-piloto. Sobre elas vos falarei em outra cartinha.
Nos encontros realizados na ágora escolar, era partilhada a leitura crítica de documentos como a “Carta da Terra” e os “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”. O quarto ODS era analisado criticamente, porque entre as intenções da “Agenda 2030” não constava o questionamento de um modelo educacional hegemônico.
Ao cabo dessas tarefas, era redigida com a comunidade uma minuta de “Termo de Autonomia”. Através da negociação e aprovação desse documento, se assegurava a estabilidade da equipe e a sustentabilidade do projeto. Finalmente, havia educadores que assumiam a dignidade de um exercício autônomo da sua profissão.
Por: José Pacheco
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