São Bartolomeu de Galegos, 4 de outubro de 2041
No início da década de vinte, uma nova geração de educadores – alguns filhos de educadores aposentados, meus companheiros de caminhada – me pediam ajuda. Uma geração inteira se perdera, mas o sonho sobrevivera:
“Sou uma jovem de 20 anos apaixonada por educação e inconformada com nosso sistema, assim como você. Não sei se você se recorda, mas nos conhecemos no ano passado na Conferência de Protagonismo Juvenil; eu estava como mediadora da mesa educação 4.0.
Bem, eu guardei seu contato desde então, queria muito escrever, mas me deu uma insegurança pela tamanha admiração que tenho pelo seu trabalho. Há 5 anos, quando estava no 2º ano do ensino médio, fiz um trabalho de escola sobre educação e tive a alegria enorme de conhecer a Escola da Ponte. Eu fiquei muito maravilhada, porque vi que tudo aquilo que eu acreditava para a educação na verdade existia. E passei a acreditar que era possível.
Persisti nesse sonho. E, há um ano, comecei com um movimento, com o objetivo de reimaginar a educação. Nosso sonho futuro é criar uma rede de escolas e transformar a educação!
Bem, eu tomei coragem pra te escrever agora porque fizemos uma publicação em nosso Instagram, propondo uma crítica ao sistema educacional através do humor. Teve muita repercussão e com isso vieram muitas críticas, em sua maioria de professores. Fiquei triste com isso, porque minha intenção não era plantar discórdia e sim propor reflexão. Mas, eles pareceram se sentir muito ofendidos.
Eu quero continuar expondo nossa visão sobre educação, mas fico na dúvida. Por isso, eu queria te perguntar: Você acha que é necessário criticarmos o sistema educacional atual, para transformá-lo? E como você lidou com as críticas que surgiram e surgem sobre seu trabalho? Tem algum conselho para mim sobre isso?
Nessas horas de incerteza, quis recorrer a quem me inspirou desde o início.”
Esta jovem entristecera com as reações dos professores e pedia-me conselho.
Disse-lhe que, mais do que criticar, fundamentando a crítica, fraternalmente, necessário seria agir, ser coerente. E convidava todos os jovens e menos jovens educadores para participar dos encontros das quartas-feiras. Eram gratuitos e dialogados. Nesses encontros, eu agia como “casamenteiro”, promovia o diálogo intergeracional. E quase como o “grilo do Pinóquio”. Explico…
Sem enjeitar o senso crítico, juntava pessoas. Para que a “tradição” se transmitisse, buscava juntar o disperso. Contrariava a solidão do professor, ajudando a criar equipes. Disponibilizava saberes, para propiciar oportunidades de reelaboração profissional. Dessa reelaboração dependeria a mudança necessária.
Eu observava os visitantes da Ponte e me apercebia de que a aprendizagem era antropofágica. O aluno não aprendia o que outro dizia; o aluno aprendia o outro. Se um professor se queixava de certas atitudes doa alunos, era porque não percebia que os alunos eram espelhos dos professores. Neles se refletiam valores, visões de mundo, crenças. convicções.
Um programa de larga audiência – O “Fantástico” – levou à Ponte alguns professores brasileiros. Numa noite de domingo, vi-os, num dos espaços de aprendizagem da escola, observando o trabalho de professores e alunos.
A certa altura, uma professora da Ponte ergueu um braço. De imediato, as crianças pararam o que estavam a fazer. A professora falou e os jovens voltaram às suas tarefas.
Com ar de surpresa, um dos visitantes perguntou:
“Aqui os professores pedem a palavra? Pedem para falar?”
“Sim! – respondeu a professora – Tal como fazem os alunos.”
Por: José Pacheco
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