Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCLXXXVIII)

Paraíba do Sul, 10 de fevereiro de 2042

Por volta de fevereiro de vinte e dois, uma administração educacional esclarecida apoiava e avaliava iniciativas inovadoras. Mas, ainda havia quem as tentasse destruir. Rebusquei o baú digital de um velho computador e nele encontrei alguns documentos, que foram úteis nesses conturbados tempos. Nesta cartinha vos darei a conhecer um dos diálogos percursores dos estatutos e termos de autonomia.

“No caso brasileiro, a LDB prevê autonomia progressiva. Você jogou a batata quente no colo dos professores e de sua apatia. Isto é complicado, pois, ao contrário de Portugal, a legislação brasileira não prevê instrumentos de autonomia.” 

A resposta a esta questão foi dada por uma professora brasileira:

“Muito boa sua questão, pois ela nos permite pensar um pouco sobre a dimensão macro da nossa escola brasileira a partir do caso português. A lei portuguesa, mais especificamente o Decreto-Lei nº 115-A/98, de 04 de maio “Aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como dos respectivos agrupamentos.” Trata-se de uma lei ampla, que envolve muitos outros aspectos, para além da abertura para que a escola contrate e dispense os seus profissionais.

Sou professora concursada da rede estadual de ensino do Rio Grande do Norte, há 16 anos. Durante esse tempo, jamais soube de nenhum caso de o professor ter sido dispensado, porque não atende aos objetivos do projeto da escola, ou mesmo porque, ano após ano, os seus alunos seguem em frente com enormes fraturas nas aprendizagens. 

Pois bem, em Portugal o Decreto-Lei estabelece que o “projeto educativo, o regulamento interno e o plano anual de atividades constituem instrumentos do processo de autonomia das escolas”. Neste sentido, a comunidade da Escola da Ponte estruturou e defendeu os seus documentos, conforme a sua realidade, a sua práxis, os seus princípios e concepções. 

Quanto à lei brasileira, considero que há muitos clarões que ainda não soubemos aproveitar. E aí a batata está mesmo no colo dos profissionais de educação. Acredito que as mudanças realmente acontecem de baixo para cima. Tanto é que, em Portugal, por enquanto, só existe a Ponte com um contrato de autonomia assinado. E o Decreto-Lei é de 1998! 

A Ponte conseguiu, porque já era autônoma, independentemente de papel, pois se fez transgredindo, o que não é comum se fazer. Somos medrosos, às vezes nada ousados. 

Quando tudo começou, o iniciador aprendeu e ensinou que, para ser autônomo numa sociedade nada democrática, é preciso transgredir as normas estabelecidas, é preciso se expor, enfrentar, estudar, para saber explicar o porquê das coisas. Foi trabalhando aos pouquinhos, inicialmente de forma solitária, depois outros se juntaram. 

Penso que, nem nos tempos mais difíceis, o iniciador do projeto duvidou de que fosse possível. E deve ter feito da esperança o antídoto para o medo. Deu no que deu… Agora, é a nossa vez. Fico feliz, porque sei que em muitos recantos do nosso país há coisas acontecendo.” 

Efetivamente, “estava acontecendo”. Porém, nos idos de vinte, ministérios e muitas secretarias de educação eram lugares onde escasseava competência e abundava corrupção intelectual e moral. Educadores que ousavam inovar sofriam pressões, eram alvos de ameaças impunes. Alguns resistiram. Outros acataram “ordens superiores” e desistiram. 

O assédio moral sofrido pela Fabi foi a “gota de água”. Não mais poderia conter a indignação. Decidi intervir, para ajudar a abolir a impunidade.

Por: José Pacheco

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