Sobral de Baixo, 5 de março de 2042
No mês de março de há vinte anos, li numa revista um textinho, que me fez voltar sessenta anos atrás, recordar a leitura de um livro com o título “A hecatombe Escolar”. Esse textinho retomava o assunto e era assinado por um tal José Maria:
“O fracasso escolar não pode continuar a ser desastre “naturalizado”, não é um desastre natural, nem um acidente de previsão impossível, nem mesmo uma regularidade social inevitável. O fracasso é um fenômeno produzido pela ação dos seres humanos.
No entanto, é um produto humano que ninguém deseja e que ninguém diz produzir. É por isso que dá a sensação de que ninguém o produz e que é um fato espontâneo e natural. Apesar de tal ilusão, podemos afirmar que o fracasso é um resultado, talvez desejado, da ação humana. Mas o indesejado não retira responsabilidade a todos que nos encontramos envolvidos de uma forma ou de outra no mundo da educação.
Mas o fracasso não é apenas um fenómeno humano indesejado, mas, em muitos casos, obedece a certas lógicas de exclusão, que prejudicam camadas sociais e beneficiam outros grupos, mesmo nos casos em que ninguém parece ser o responsável.
Estamos, pois, a afirmar que, quando ocorre fracasso escolar, alguma política educativa ou alguma prática escolar não funcionam como deveria; que, portanto, devem ser reparadas; que as lógicas perversas que o geram devem ser estudadas e denunciadas, e que devemos comprometer a sua transformação”.
Sábias palavras que a administração educacional parecia ignorar. No mesmo mês do distante 2022, era dada a conhecer mais uma pesquisa denunciadora da “hecatombe escolar”. Mais uma vez, parecia não haver responsáveis. Mas, nesse ano, foi inventado um bode expiatório da “hecatombe”: a Covid-19. A pandemia “tinha as “costas largas”.
Nesse longínquo 2022, a média de proficiência em matemática entre os alunos do terceiro ano do ensino médio foi a pior da série histórica. Uma “especialista em educação” parecia não entender que as aulas presenciais ou à distância valiam o mesmo, isto é, nada. E assim comentava o descalabro:
“São Paulo foi um dos estados que mais rapidamente começaram a oferta de atividade remota e foi um dos primeiros a retornar com as aulas presenciais, mas, ainda assim, podemos ver grandes perdas em todas as etapas”.
A pesquisa concluía que os alunos do ensino médio de São Paulo saíam da escola com defasagem de quase seis anos em matemática. Em língua portuguesa, saíam da escola pública com um desempenho adequado para adolescentes que estavam no 8º ano do ensino fundamental.
Resignado e atirando a culpa para as costas da pandemia, o secretário da educação dizia que esses resultados já eram esperados. E lá voltava à velha fórmula no “cruzamento dos dados”:
“Queremos cruzar dados para entender, por exemplo: Quem teve melhor desempenho assistiu mais aula? Entregou mais atividades?”
Eu queria acreditar que o secretário usava de “nonsense”, para disfarçar a perturbação face à “hecatombe”. Seria uma fuga para a frente o falar sem sentido, transformando a afirmação em absurdo, numa piada sem graça. Através do humor com base em coisas absurdas, que aconteciam em cenários fictícios, era possível pensar de forma diferente do que estava definido como aceitável e lógico. Mas, não foi isso o que sucedeu.
Dizia a voz do povo que o pior cego era aquele que não queria ver. Era evidente o desvario dos administradores do “sistema”. Insistiam na encomenda de dispendiosas pesquisas e inúteis estudos, idênticos a pesquisas e estudos anteriormente encomendados, que jaziam no arquivo morto do “sistema”.
Por: José Pacheco
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