Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MXXXVIII)

Jacaroá, 28 de outubro de 2042

Vai para aí uns sessenta anos, os jornais do Rio foram animados por uma breve polémica, protagonizada por dois dos mais eminentes educadores da época. Apesar de reconhecer a genialidade do projeto arquitetônico concebido por  Niemeyer, o mestre Lauro aconselhava que o CIEP não fosse exercício de “pedagogia predial”.

Com os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) Darcy visava oferecer ensino público de qualidade em período integral. Considerava-os “uma revolução na educação pública do País“.  No segundo governo de Brizola, alguns CIEPs até foram equipados com piscinas, e forneciam refeições completas, além de atendimento médico e odontológico. Visava-se tirar crianças carentes das ruas, oferecendo-lhes “pais sociais”.

Mas, para Lauro, educação integral não correspondia ao aumento do tempo de permanência dentro de um prédio chamado “escola”. Integral seria a educação que cumprisse a função social de “garantir educação pública de qualidade para todos os cidadãos”: Considerava o prédio da escola como um nodo de comunidade:

A expressão escola de comunidade procura significar o desenquistamento isolacionista da escola tradicional. Escola, no futuro, será um centro comunitário. Não se reduzirá a um lugar fixo murado”.

Lauro e Darcy comungavam dos mesmos princípios. Porém, divergiam no entendimento do que seria, na sua época, uma escola. Ambos apontavam para a necessidade de ela se converter numa comunidade, mas se perdiam em irónicas dissidências. E isso os distraiu…

O desgoverno, que se lhes seguiu, desvirtuou o projeto. Os CIEPs viraram escolas comuns, com o ensino em turnos e contra-turnos. Alguns, parcialmente concluídos, foram abandonados.

No tempo do desperdício, ministérios e secretarias de educação mandavam edificar “elefantes brancos”, a que chamavam “escolas”, “centros (des) educativos” “campus universitários” de concentração e armazenamento de alunos. Até que chegou o tempo, não de demolir ou implodir guetos e bunkers, mas de iniciar a requalificação de espaços de aprendizagem.

Em muitos lugres do Brasil, encontrei CIEPs adaptados a novos tempos. E, na Brasília de final de século, uma inovação arquitetónica do arquiteto João Lima – para Darcy, o Lelé –, que dava pelo nome de Beijódromo, já fora prenúncio do que aconteceria nos anos vinte e trinta do nosso século.

As antigas escolas do Plano dos Centenários já tinham sido transformadas em centros de dia para idosos, em sedes de associações recreativas e até em habitações. Então, por que não transformar os “campus” universitários em lugares de utilidade social? Havia tantas famílias sem teto! Por que não viravam os “complexos escolares” importados da Finlândia em abrigos para moradores de rua. Eles eram tantos e tão necessitados!

Foi dado melhor destino a esses lugares de solidão. Transformados, requalificados, deram lugar a aldeias, “ilhas” e provisórios condomínios.

A importação de modismos prediais se prolongaria até aos idos de vinte. Foram muitos e inúteis os passeios ao norte europeu, na busca de uma *nova arquitetura”. Os modismos importados eram velhos e suscitavam ridículas situações. Na década de setenta, o ministério pediu explicação a países nórdicos, que haviam patrocinado a edificação de uma escola:

“Para que servem as “estantes com furinhos”, instaladas na entrada da escola?”

A ditas “estantes” destinavam-se à colocação dos bastões de esquis, que as crianças escandinavas usavam para deslizar na neve, a caminho da escola.

Imaginais alunos de Lisboa deslizando na neve?

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