Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCLII)

Guapimirim, 20 de fevereiro de 2043

No fevereiro de 23, era tão intensa a folia carnavalesca como a azáfama no nosso círculo de aprendizagem. Tivemos que enfrentar múltiplos problemas, resultantes de uma cultura feita de individualismo. 

Em situações críticas, a tendência era para praticar o “salve-se quem puder”. E a solidariedade era enfeite de um projeto apenas escrito. Seria necessária muita paciência e compaixão.

Após a análise dos PP-P, da inventariação de valores e elaboração de carta de princípios, da equipe de projeto se passava à composição do protótipo de comunidade e à elaboração de roteiros de estudo. E a análise do regimento interno conduzia à revisão do modelo de gestão da escola e a práticas democráticas decorrentes da aplicação do termo de autonomia entregue à administração. 

Paralelamente, o Mestre Pedro prosseguia na senda de uma demolidora crítica da ensinagem em sala de aula:

“Os dados são, pois, cruéis com as aulas. Sendo aula o que mais existe e mesmo define a escola, e sendo os resultados um desastre avassalador, sua inutilidade é fragrante. 

Poucas coisas são mais inúteis do que aula: roubam o tempo do estudante, desmotivam-no ostensivamente, refletem autoritarismo grotesco, deturpam o sentido da aprendizagem e do conhecimento, e representam a vanglória mais tola do professor. 

Aula é o que mantém a escola presa ao passado fordista ou similar, como consta dos “Tempos Modernos” de Chaplin, repetitiva, monótona, linear, sequencial, insuportável, desumana. Não tem como objetivo cuidar da aprendizagem do estudante, mas de transmitir conteúdo que frequentemente o estudante sequer entende, como é o caso notório de matemática. É o signo também do professor ensimesmado, que mantém o sistema de ensino centrado em si mesmo, em torno de sua aula, prova e repasse, além de praticar um cognitivismo tosco, reducionista ao extremo.

Quem, porém, toma como compromisso fundamental da escola cuidar que o estudante aprenda, de maneira integral e comunitária, jamais coloca aula no centro. Também não precisa extinguir a aula, se mantida como aporte eventual e supletivo mediador. 

Aprendizagem implica, naturalmente, uma abordagem integral do estudante, muito além do cognitivo, um “processo formativo”, com qualidade formal e política, tipicamente emancipatório. O protagonismo do estudante é referência formativa substancial, girando o sistema totalmente em torno dele, assim como a família gira em torno dos filhos. 

A escola cuida, então, da autoria do estudante, e o avalia por sua autoria, jamais por prova. Cuida do individual e do coletivo, sendo que aprendizagem coletiva é, como regra, preferencial.”

Em outros artigos, o Mestre Pedro abordava a problemática da avaliação. Também nesse domínio, as escolas instrucionistas estavam fora da lei. 

A lei estabelecia que a avaliação fosse formativa, contínua e sistemática. Prova era um instrumento de avaliação falível e excludente. A prova não era contínua era de aplicação periódica. E não era sistemática, porque incidia numa área ou disciplina. Para além de quase nada avaliar, a não ser a capacidade de reter informação na memória de curto prazo, despejá-la num papel e… esquecê-la. 

Era tempo perdido na aplicação e enganadora origem de uma avaliação sumativa condição de uma classificação que engendrava um “índice de decoreba” (IDEB), tomado como “índice de desenvolvimento”. 

Nos círculos de aprendizagem dos protótipos de comunidade se cuidava de produzir “evidências de aprendizagem”, de praticar os ensinamentos do Mestre Pedro e de cumprir a lei. 

 

Por: José Pacheco

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