Campo de Ourique 11 de maio de 2043
No discurso sobre educação, a palavra utopia é, geralmente, sinônima de impossibilidade. Porém, utópico será algo que indica uma direção, que requer intencionalidade e ação. Como diria Quintana, “se as coisas são inatingíveis… ora! / Não é motivo para não querê-las”.
Concretizar utopias – recriar vínculos, rever e re-olhar, reelaborar as práticas – reconfigura a metáfora do Mito de Sísifo, o “inédito viável” freiriano. A nova educação, que emergia do sonho de todos nós, deveria formar o cidadão democrático e participativo, sensível e solidário, fraterno e amoroso, o ser humano dotado de educação integral.
Nos idos de vinte, todas as teorias estavam escritas. Todas as experimentações, reformas e modas tinham sido ensaiadas. Importava renovar a denúncia da guetização da juventude, a par com o anúncio da possibilidade de uma aprendizagem participativa e transformadora.
Não seria demasiado insistir na possibilidade de uma escola na qual os aprendizes aprendessem a lidar com um conhecimento mutante, na busca da integração das diversas dimensões do humano “para garantir condições de se atribuir novos sentidos à existência e atender a necessidade do engajamento do sujeito na construção do futuro”.
O que se aprendia dentro de um edifício escolar, que não pudesse ser aprendido fora dos seus muros?
O espaço de aprender era todo o espaço, tanto o universo físico como o virtual, era a vizinhança fraterna, caraterística das comunidades, que começavam a ganahar espaço na produção teórica, escasseando a prática. Dispúnhamos de protótipos de comunidades de aprendizagem, práticas de eco-sustentabilidade, de estímulo ao espírito inventivo. Adotávamos soluções novas, baseadas no princípio ético que nos diz que tudo o que for inovado o deva ser para benefício coletivo.
O modelo escolar não era o único modelo de educação. A educação deveria do ser pensada mais a partir de uma rede de comunidades, de pessoas, do que a partir de instituições, de modo a que os processos de aprendizagem tivessem um papel social transformador.
A escola era o equipamento social mais abundante. Feito um mapeamento do lugar, numa área de escassos quilômetros quadrados, encontrávamos meia dúzia de escolas. Mas as comunidades de aprendizagem não careciam da existência de um prédio escolar (a “pedagogia predial”, como o Lauro ironizava) e sim da utilização de prédios e espaços da comunidade, nos quais, os estudantes pudessem aprender e exercer cidadania, desfrutando dos seus direitos ou realizando seus deveres, para o bem de todos.
Urgia que a escola não fosse uma interface com a realidade social, mas espaço onde ocorressem atos contributivos do desfazer do abismo entre a realidade escolar e outras realidades. Tampouco a aprendizagem dependeria apenas do professor, pois era necessária “uma tribo inteira para educar uma criança”.
Urgia rever os conceitos de espaço e tempo de aprendizagem, para que os “paidagogos” não mais conduzissem crianças da comunidade para a escola, mas as libertassem da reclusão num gueto escolar e as devolvessemm à comunidade, na qual a escola se constituiria num nodo de uma rede de aprendizagem colaborativa.
As escolas poderiam constituir-se em espaços de cultura, lugares onde os saberes eruditos se casariam com saberes populares e tecnologias sociais dolugar, onde a transformação aconteceria na partilha de conhecimento produzido. Os prédios das escolas, seriam utilizados sem necessidade de entrada no horário-padrão de aula, ou de “ter falta”… por chegar atrasado.
Por: José Pacheco
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