Montemor-o-Velho, 23 de maio de 2043
Netos queridos,
Achei esse cartaz, quando andava vasculhando o fundo do baú das velharias. Essa “Conversa” decorreu. Já tinha percorrido o país, “conversando” com educadores, que viriam a modificar o (triste) panorama educacional desse tempo. Pressentia um forte sentimento de autonomia em muitos educadores, cujos projetos de comunidade ia acompanhando. Investi na criação de uma equipe, que tomasse nas suas mãos os destinos dos muitos projetos, que foram surgindo.
A minha amiga Tina fazia parte dessa extraordinária equipe. Assim se manifestava no velho Instagram:
“Se as escolas são pessoas e o sistema educacional são pessoas, quem são os arrumadores de desculpas?
Como detectar um bom arrumador de desculpas, para manter a educação no instrucionismo?
Ele deseja fervorosamente essa transformação em si mesmo?
Ele deseja fervorosamente essa transformação para seus próprios filhos?
Ele deseja fervorosamente essa transformação para seus próprios estudantes?
O sistema educacional é viciado em arrumar excelentes desculpas para se manter agarrado ao convencional.…
“Sempre foi assim. Foi assim comigo e deu certo. A… a diretora não deixa. Sou obrigada a fazer assim. E eu fiz a minha parte. E essa criança não aprende. Eu fiz o que me orientaram…”
Esta lista pode ser infinita.
Para transitar do Paradigma da Instrução, para o Paradigma da Aprendizagem e Comunicação, e trazer o aprender para o século XXI, é preciso reconhecer que, fazer o que sempre foi feito, não alcançará resultados diferentes.
Arrumar desculpas, não vai tirar a educação da Zona de Conforto e essa mudança precisa começar por quem quer, por mim e por você, nunca pelo outro.
Sair da zona de conforto, não será um movimento aconchegante, cômodo, agradável, suave, leve. Por isso, continuo à procura de educadores com garra, e como disse Tião Rocha: persistentes, insistentes e resistentes.”
Se as palavras da minha amiga Tina, já por si, tocavam o centro de gravidade do profissional de desenvolvimento humano e poderiam ser suficientes para que os professores refletissem e decidissem resolver um problema de natureza moral, acrescentaria algo que apontasse para o domínio da ética.
Há uns quarenta anos, o amigo António Nóvoa escrevia:
“Como conseguir que a educação responda aos anseios e aos desejos de cada um sem que, ao mesmo tempo, renuncie à integração de todos numa cultura partilhada?
O regresso a dinâmicas associativas, desenvolvidas no quadro de uma narrativa pública da educação, permitirá evitar as tendências burocráticas e corporativas, sem cair numa visão fragmentada dos alunos como clientes e das escolas como serviço privado.
É urgente reforçar um espírito associativo, que entre nós foi sistematicamente asfixiado, para que uma concepção nova da educação como espaço público se concretize no quadro de práticas de autonomia das instituições escolares.
Como conseguir que as famílias e as comunidades sintam que a escola lhes pertence?”
Talvez na esteira das considerações do amigo António, nos idos de vinte e três, algo novo acontecia. Quando, pela enésima vez, percorri o meu país da Educação, no Canto dos Piscos, nas Sementes de Lys, na Manuel da Maia, na Compasso e em outros lugares onde uma nova Humanidade ganhava contornos em iniciativas de uma nova Escola sosseguei os meus voluntariosos ímpetos. Já havia diretores sensíveis e educadores decididos a fazer o que eu, em vão, tentara, ao longo de mais de meio século.
O Simão e a Flor já nasceriam no tempo da Educação. Pais e professores o tinham preparado.
Por: José Pacheco
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