Trancoso, 16 de outubro de 2043
No Ano da Graça de 2023, no dia de aniversário da Vovó Ludi, fomos até à periferia da cidade grande, conhecer as “Formiguinhas”. Voltaríamos no ano seguinte, para colher ensinamento junto de crianças com brilho nos olhos e educadores com ternura a rodos.
Al, como em outros lugares onde se semeia Paz, as “formiguinhas” Ana, Bete, Fabi, Juju, Caina e um punhado de dedicadas voluntárias vão fazendo possíveis e impossíveis, para mitigar o sofrimento dessa gente brasileira, como nós, que nos faziam lembrar aquela música do Chico:
“Tem certos dias em que eu penso em minha gente / E sinto assim todo o meu peito se apertar / E aí me dá uma tristeza no meu peito / Feito um despeito de eu não ter como lutar / E eu que não creio, peço a Deus por minha gente / É gente humilde, que vontade de chorar.”
No outubro de dois mil e vinte e três, a guerra na Ucrânia continuava, mas saíra de cena. A televisão e a Internet transmitiam imagens do bombardeamento de um hospital. Centenas de seres humanos pereceram nessa tragédia. Consumava-se a montessoriana profecia: a educação que estimula uma competitividade é origem de todos os conflitos, dos familiares aos sociais, de todas as guerras.
Só nos primeiros dias de conflito entre israelitas e palestinianos, mais de mil crianças pereceram vítimas de bombardeamentos, inclusive, de um hospital. A insanidade crescia. De ambos os lados, surgiam ameaças de maior destruição. A escalada de violência era alimentada por superpotências bélicas, principais produtoras de instrumentos de morte. O presidente russo ameaçava com mísseis hipersônicos, se porta-aviões fossem enviados pelos Estados Unidos a Israel.
Nesse dramático vinte e três, assistimos à gênese de uma educação geradora de Paz.
Se eu sentia a preocupação da Vovó Ludi e a sua preocupação com o mundo que seria o da Analu, também pressentia que, entre a Ucrânia e a Palestina, entre Trancoso e São Luiz, se construía e reconstruia Paz, ao jeito do Mito de Sísifo.
Anónimos construtores da Paz (vulgarmente conhecidos por “educadores”) faziam “trabalho de formiguinha”. Alguns ficariam para sempre anônimos, não fora o reconhecimento prestado pelos seus discípulos. Como a homenagem feita pelo amigo Antônio à sua professora:
“Sabe aquele professor(a) inesquecível e que marcou a sua vida? Eu tive a sorte dessa pessoa tão especial ter sido a minha primeira professora, a Cleusa Paiva.
Na primeira vez que fui à escola, na Fazenda São José, no Mato Dentro, em São Luiz, há mais de 53 anos, fui com meu pai, na garupa do cavalo. Menino tímido da roça, acostumado a falar com borboletas e pássaros, eu estava muito envergonhado e tenso no primeiro dia de aula.
Quando cheguei na escola eu fui acolhido com um especial sorriso pela inesquecível professora Cleusa, sempre calma, delicada, acolhedora, de coração generoso.
A partir dali, mesmo com timidez e insegurança, eu me sentia apoiado por ela. Sempre que ficava tenso, eu sentia a sua mão imponderável passando em minha cabeça. Com aquele afago protetor, parecido com o da minha mãe, eu relaxava e me sentia acolhido, como se estivesse em casa.
Até hoje a professora Cleusa ainda me inspira e me influencia. Ela fez, faz e fará parte toda a minha história de vida. Por isso lembro da significativa frase de Henry Adams: “O professor se liga à eternidade. Ele nunca sabe quando cessa a sua influência”.
Um professor inspirador nos ajuda a alçar voos e a conquistar caminhos que jamais imaginamos. Ele nos influencia, nós influenciamos os outros e transformamos o mundo.”
Bem hajam os educadores construtores da PAZ!
Por: José Pacheco
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