Ouro Preto, 20 de outubro de 2043
Mais uma vez por terras de Minas, ao encontro de educadores com quem vale a pena dialogar. Naquele outubro, conheceria uma secretária de educação que se preocupava, não só com o que os seus professores detinham como conhecimento técnico, mas, sobretudo, com a pessoa do professor.
Naquele tempo, o modismo era a formação dos professores no âmbito sócio emocional. Parecia haver grande preocupação com o sócio emocional dos alunos. Mas, quem se preocupava com o sócio emocional dos professores?
“Ele entrou e logo começou a atirar. Era um menino que tinha sofrido bullying (a gente corria pelo corredor e atá pisava uma menina que já estava morta…” – neste dia de há vinte anos, num áudio recebido pelo WhatsApp , numa voz trémula, chorando, uma professora descrevia o modo como se salvara. Já se tornara rotina a dramática situação por que passara.
A Jaqueline partilhou uma frase do amigo Ailton. E o Valentim comentou:
“Cada vez mais, o espaço da Educação nos processos educativos é restringido de “experiências mágicas de Existir”, que são ações humanas, relações humanas, afetivas e amorosas. Cada vez mais, os conteúdos curriculares não param de chegar nas universidades. Cada vez de forma mais intensa chega um conteúdo “novo” batendo a porta das universidades e todos esses “novos” conteúdos são títulos de Doutores, que carregam na moldura uma identidade de um Sapiens domesticado.
Precisamos dar um basta nos conteúdos, precisamos urgentemente compreender que educar é um ato humanizador. Conteúdos essenciais são aqueles que nos auxiliam a desfrutar dessa incrível e única experiência chamada vida.”
Quando, nos idos de vinte e três, eu dizia estar cansado e pretender descansar de tantas lutas travadas, apenas havia desistido de tentar melhorar um sistema que não tinha remédio. Permaneci na faina de cuidar do ser humano professor, para que ele, devidamente, cuidasse dos seus alunos. Pretendia contribuir (em equipe), para a humanização de seres humanos.
Já entre o final do século XIX e o início do século XX, houve quem quisesse fazer da Pedagogia, para além de Arte, uma ciência. Mas, tentativas de humanização se saldaram por “adaptações” mais ou menos conformistas aos ditames do “sistema”.
Os montessorianos permaneceram cativos da sala de aula, juntando aos materiais concebidos pela Maria, o seu agudo olhar: “segue a criança”. Mais de cem anos após se terem instalado numa fábrica de tabaco, os steinerianos tentavam a seu modo, humanizar o ato de educar. Freinetianos organizaram-se e criaram o “Movimento da Escola Moderna”. Porém, as promessas de uma “Escola Nova” definhavam.
No dealbar do século XXI, embora a Imprensa Freinet, os Materiais Montessori e a Euritmia de Steiner tivessem operado transformações, os seguidores de Steiner, Montessori e Freinet permaneciam solitários em salas de aulas. E, à semelhança daqueles que nem sequer haviam adotado preceitos escolanovistas, a maioria dos professores continuava dando aula, inconscientemente (quero crer!), desumanizando.
Já vos confessei a minha angústia de dador de aula. Quando eu as dava, não era eu quem ali estava. Era um clown, que cumpria um guião (o chamado “planejamento”), que eu havia escrito no dia anterior. Não me sentia autêntico, mas um ator. Não estava presente, eu atuava perante um frontal anônimo separado por um vazio constitutivo. Tentava transmitir informação do melhor modo que o sabia fazer, tal como qualquer dador de aula. Mas, não havia comunicação. Não chegava a cada um dos seres humanos a quem me dirigia. Não comunicava.
Por: José Pacheco
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