Vassouras, 26 de outubro de 2043
E foi chegando o tempo de reunir, para preparar mais um Plano Nacional de Educação. Do fundo do baú da velharias resgatei uns amarlecidos papeís, mas ainda legíveis. Entre eles, uma “notícia da edição impressa” datada de 25 de julho de 2014. A parangona não deixava dúvidas: “Pacheco vê boas intenções, mas critica PNE”:
“Uma educação do século XXI. É isso o que prega o professor e mestre português José Pacheco, que esteve nesta quinta-feira em Porto Alegre, para ministrar a palestra “A educação integral e seus desafios” (…) Em entrevista ao Jornal do Comércio, falou sobre o Plano Nacional de Educação, sancionado no dia 26 de junho pela presidente Dilma Rousseff.
Pacheco vê o documento, que estabelece que até 2024 metade das escolas públicas do País terão turno integral, como um passo importante, mas que não contribuirá para uma verdadeira mudança da educação brasileira. A escola de tempo integral pode ser um degrau para chegar ao que eu chamo de educação integral, algo além do tempo integral, contemplando a multidimensionalidade humana. Não gostaria que nessas escolas, pela manhã, se ensinasse Português e Matemática e, à tarde, contra-turno feito de capoeira, artes, tarefa de casa, ou aula de reforço. Estou falando de uma nova construção social (…).”
Havia passado uma semana sobre o falecimento do meu amigo Rubem. No terceiro sábado de julho de 2014, os jornais noticiavam: “O escritor e educador Rubem Alves morreu aos 80 anos”.
Me recordo de ténues referências ao documento, num congresso em que participei, lado a lado com o Rubem e o Cristovam. Mas, em 2001, raríssimos eram os encontros de reflexão e raras as vozes se pronunciando sobre o significado de um primeiro PNE.
Nesse mesmo ano, discretamente, fui colhendo informação sobre o PNE 2001/2010. Em 2023, participei ativamente nos encontros preparatórios de um PNE, que vigoraria até 2024. Apresentei propostas, pedi prudência e coerência, durante o desenvolvimento desse plano, alertei para riscos de se repetir o desastroso desempenho do PNE anterior.
Quatro anos decorridos, nenhuma das metas do PNE possuía dispositivos com ritmo de avanço suficiente para ser plenamente cumprida até 2024. Apenas entraves, medidas avulsas, propostas avançando em ritmo lento. Havia quem atribuísse a baixa execução das metas aos cortes orçamentários sofridos no triênio 2019-2021. Mas… “o buraco era mais em baixo”.
Nas próximas cartinhas, reservarei algumas linhas para convosco conversar sobre os PNE. Os estudos realizados sobre os PNE de 2001 e de 2014 observavam “um descompasso entre metas previstas e metas alcançadas” (os académicos adoravam eufemismos). Outros autores, como Dias Sobrinho, freireanamente denunciavam causas do “descompasso”:
“Uma sociedade que não consegue, ou não quer, estender os benefícios da escolarização de boa qualidade para todos, além de estar condenada ao empobrecimento crescente no sistema mundial de alta competitividade, é também uma sociedade perversa”.
Ou Carlos Abicalil que, na sua dissertação de Mestrado, questionava:
“Plano Nacional de Educação na República Federativa do Brasil: instrumento de retórica ou política pública para a realização do direito à Educação Básica?”
Em 2018, se dizia que o PNE era “onde o Brasil avançava e tropeçava na Educação”. E, em 2023, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação fazia um balanço do Plano:
“Às vésperas do final da vigência do Plano, o cenário permanece de abandono. Baixa taxa de avanço em praticamente todas as metas. E um total de 13 metas estão em retrocesso.”
Por: José Pacheco
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