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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCLV)

Almada, 20 de setembro de 2041

Queridos netos,

Em setembro, se celebra o nascimento de dois amigos das crianças: Paulo Freire e Rubem Alves.

No mês de abril do ano 2000, o Rubem nos visitou. No ano seguinte, o seu nome foi dado a um dos espaços de aprendizagem da Ponte. Não só o nome, pois, nesse e em todos os espaços da escola se passou a sentir a sua perene presença.

Esse meu extremoso amigo partilhava os mesmos princípios e a mesma prática do Mestre Freire. E, quando lhe foi solicitada a redação de um “Parecer” sobre a reintegração de Paulo Feire na Universidade, o Rubem escreveu um “não-parecer”. Eis aquilo que o Rubem achou por bem escrever:

INTERESSADO: PAULO RÉGLUS NEVES FREIRE

P A R E C E R

O objetivo de um parecer, como a própria palavra o sugere, é dizer a alguém que supostamente nada viu e que, por isto mesmo, nada sabe, aquilo que parece ser, aos olhos do que fala ou escreve. Quem dá um parecer empresta os seus olhos, o seu discernimento a um outro que não viu e nem pôde meditar sobre a questão em pauta. Isto é necessário porque os problemas são muitos e os nossos olhos são apenas dois.

Há, entretanto, certas questões sobre as quais emitir um parecer é quase uma ofensa. Emitir um parecer sobre Nietzsche, ou sobre Beethoven, ou sobre Cecília Meireles? Para isto seria necessário que o signatário do documento fosse maior que eles, e o seu nome mais conhecido e mais digno de confiança que aqueles sobre quem escreve.

Um parecer sobre Paulo Réglus Neves Freire? O seu nome é conhecido em universidades através do mundo todo. Não o será aqui, na UNICAMP? E será por isto que deverei acrescentar a minha assinatura (nome conhecido, doméstico), como avalista?

Seus livros, não sei em quantas línguas estarão publicados. Imagino (e bem pode ser que eu esteja errado) que nenhum outro dos nossos docentes terá publicado tanto, em tantas línguas. As teses que já se escreveram sobre o seu pensamento formam bibliografias de muitas páginas. E os artigos escritos sobre o seu pensamento e a sua prática educativa, se publicados, seriam livros.

O seu nome, por si só, sem pareceres domésticos que o avalizem, transita pelas universidades da América do Norte e da Europa. E quem quer que quisesse acrescentar a este nome a sua própria “carta de apresentação” só faria papel ridículo.

Não. Não posso pressupor que este nome não seja conhecido na UNICAMP. Isto seria ofender aqueles que compõem seus órgãos decisórios.

Por isto o meu parecer é uma recusa em dar um parecer.

E nesta recusa vai, de forma implícita e explícita, o espanto de que eu devesse acrescentar o meu nome ao do Paulo Freire. Como se, sem o meu, ele não se sustentasse.

Mas ele se sustenta sozinho. Paulo Freire atingiu o ponto máximo que um educador pode atingir.

A questão não é se desejamos tê-lo conosco. A questão é se ele deseja trabalhar ao nosso lado.

É bom dizer aos amigos:

“Paulo Freire é meu colega. Temos salas no mesmo corredor da Faculdade de Educação da UNICAMP.”

Era o que me cumpria dizer.

Campinas, 25 de maio de 1985.

Rubem Azevedo Alves, Professor Titular.

Reintegrado, Freire foi professor de “Educação e Movimentos Sociais”, na UNICAMP, durante 10 anos. Em 2019, no prédio principal da Faculdade de Educação, uma placa foi descerrada com o seu nome, por iniciativa de estudantes envolvidos em círculos de cultura. Uma ex-aluna de Freire assim se manifestou:

“Este prédio foi inaugurado sem nome. E a reivindicação dos alunos se justifica por ser o lugar onde o professor Paulo Freire circulou e que ainda guarda a energia dele.”

O espírito do mestre habitava a Universidade. Mas ainda não morava no chão da escola pública.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCLIV)

Angicos, 19 de setembro de 2041

Querido amigo e mestre,

Faz hoje, exatamente, vinte anos, participei num evento comemorativo do teu centésimo aniversário. Pediram-me que sobre ti falasse. Mas, o que poderia eu dizer de ti, se de ti já tudo fora dito?

No segundo dia de um mês de maio, nos deixaste órfãos de presença e permaneceste exilado. O regresso do exílio, a que a estupidez humana te condenara, aconteceria já na década de vinte, quando amorosos e corajosos educadores te praticaram.

Li o “não-parecer”, que o Rubem redigiu, quando lhe pediram a redação de um “parecer” sobre a tua reintegração na universidade. O Rubem pugnava pela realização dos teus sonhos. E me deu a conhecer uma carta, que fazia jus ao teu “tu já lê”. Começava assim:

“Sei que esta carta enfrenta uma dificuldade de base, para chegar aos seus destinatários – é que muitos deles não sabem ler. O grande entrave para a melhoria da qualidade educacional brasileira é o fato de que a nossa população está satisfeita com a escola que temos.” 

Hoje, habitas o chão de escolas onde uma educação emancipatória acontece. Mas, nos tempos sombrios dos idos de vinte, havia quem te intitulasse “patrono da educação”, enquanto uma récua política e burocrática execrava a tua memória. Apelava-se ao “regresso às aulas”, ao retorno ao passado, a um velho “novo normal” de onde a educação brasileira nunca havia saído. Lideranças tóxicas, uma administração autoritária e ridículos tiranos não te perdoaram teres evidenciado a natureza política (e amorosa) do ato de educar. A ignorância prosperava e muitos te detestavam, porque denunciavas a exclusão, a reprodução de uma educação “bancária”.

Nesses tempos sombrios, havia quem pugnasse por “tirar Paulo Freire das escolas”. Mas, como seria possível tirar-te de escolas, se nelas tu ainda não tinhas entrado? O amigo Eustáquio até afirmava que nunca foras aplicado na educação brasileira. E que, nas universidades, tu eras apenas título de biblioteca, ou nome de salão.

Nos idos de sessenta, após quarenta horas de estudo, na lista de trezentas e oitenta palavras decodificadas pela primeira turma pelos moradores surgiam termos como: “Deus, promessa, esmola, chuva, preto, triste, medo, coragem… esperança”. Decorrido meio século, eram as mesmas as palavras comuns do léxico quotidiano social, cultural e religioso de Angicos.

Mas, nos idos de vinte, já havia educadores conscientes de que o ato de educar era ato coragem política e… de amor. Havia professores que se apercebiam da sua incompletude e sabiam que o ser humano estava em permanente estado de projeto.

Marginais ao instrucionismo vigente, com amor e coragem, esses educadores alimentavam projetos em ti inspirados. Autonomamente, se faziam anunciar. E denunciavam uma política negacionista, que conspirava contra a mudança e a inovação. Invocavam-te naquilo que tinham lido no livro “Pedagogia da Autonomia” e no saboroso “Professora sim, tia não”:

“Como esperar que uma administração de manifesta opção autoritária considere a participação real dos e das que fazem a escola, na medida em que esta se vá tornando uma casa da comunidade?”

Sempre que alguém me pedia ajuda, eu recomendava que se procurasse nas escolas professores que ainda não tivessem morrido. Ainda havia professores que se consideravam completos e não aceitavam a solidariedade dos pares. Estavam mortos, prontos para baixar o corpo à terra e elevar a alma ao lugar etéreo onde te encontras. Eram causa da tua segunda morte – a da memória. Porque um professor não morre, quando o coração para, mas quando deixa de amar.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCLIII)

Vale da Amoreira, 18 de setembro de 2041

Talvez não por acaso, reparei que os pacotinhos de açúcar de uma confeitaria continham curiosas inscrições:

“01:25 – Hora dos Artistas; 06:44 – Hora dos Vencedores; 22:10 – Hora de descontrair; 05:13 – Hora dos sem horas; 14;28 – Hora dos Apaixonados; 21:24 – Hora de contar uma história; 19:16 – Hora de ajudar nos TPC…”

Lestes bem. Havia hora para tudo, para se apaixonar, para ajudar a fazer os trabalhos de casa e até para vencer. Só não encontrei um pacotinho indicando a “hora de perder”.

Nos idos de vinte, o tempo estava cativo de regulamentos. As escolas abriam e fechavam à mesma hora. As aulas tinham a mesma duração, independentemente do ritmo de cada qual. Os intervalos aconteciam no mesmo horário e até o fazer xixi era cronometrado. A padronização horária estabelecida no século XIX perdurava.

Fora estabelecido que um ano seria o intervalo de tempo correspondente a uma revolução da Terra em torno do Sol, o que equivalia a 365 dias, 6 horas, 13 minutos e 53 segundos. Depois, fora inventado o ano bissexto, para corrigir excessos. E o ano letivo fora criado não se sabe bem porquê, nem para quê.

No comentário a uma das minhas crónicas, alguém escreveu (sem poupar na pontuação):

“Sem horários?!…” 

E questionou:

“Quem der mais horas à escola com prejuízo da família é que é bom professor?” Eu havia escrito que os padrões horários eram dispensáveis nas escolas. Mas, para sossego dos críticos, acrescentei que os professores da Ponte “não davam mais horas à escola”, muito menos “em prejuízo da família”. Horários de padrão único eram aberrações. Muitos anos antes, escrevera:

“Não gosto de professores missionários, mas também não gosto dos demissionários”. 

O uso desse trocadilho resultara do cansaço que eu sentira no tempo em que a Ponte não podia escolher os seus professores. Quando os “concursados” chegavam, a sua primeira pergunta era, invariavelmente esta:

“Quais são os meus dias livres?”

Nas escolas por onde tinham peregrinado, fora atribuído a esses professores um horário. Nesse horário, havia manhãs, tardes, dias livres de atividade docente. Na Ponte, nada disso havia. Os dias eram todos “livres”.

Onde houvesse horário-tipo e livro de ponto não haveria professores autónomos. A autonomia de uma escola era incompatível com mecanismos de poder vertical e de controlo uniforme do tempo.

Acaso quisesse recorrer à teoria, poderia evocar a cronobiologia. Se quisesse apelar para o exercício do bom senso, reafirmaria a evidência de cada ser humano ser único e irrepetível, dotado de um ritmo específico de aprendizagem.

Mas, apenas afirmei não existir um só modo de fazer escola. E que os horários de padrão único apenas poderiam ser legitimados por uma cultura autoritária e demissionária, que empestava muitas escolas.

Por que um tempo de cinquenta minutos para estudar matemática e outro tempo de cinquenta minutos para estudar ciências? Cinquenta, sessenta, noventa minutos, para qual aluno?

Quando um aluno da Ponte me perguntou por que razão as aulas em outras escolas duravam cinquenta minutos, eu respondi que não havia razão alguma, que eu havia feito essa pergunta a muitos professores que davam aulas de cinquenta minutos e que eles não souberam responder.

Na educação bancária, que, nos idos de vinte, ainda existia, era assim porque era assim e… pronto!

Antigamente, a contestação dos demissionários surgia num registo mais pueril. Dizia-me uma professora:

“Isso de não haver horários aonde nos levaria, colega?” 

Antigamente, havia gente que, por mais que se explicasse, não entenderia.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCLII)

Cruz de Pau, 17 de setembro de 2041

Recordo-me de uma das primeiras “palestras” brasileiras. Decorria o mês de setembro de há quarenta anos.

Como sempre, comecei por perguntar:

“O que quereis saber?”

A primeira das perguntas demorava sempre a sair, pelo que recorri a uma singela blague:

“Vamos lá! A primeira pergunta é sempre a mais difícil. Passemos à segunda”

O público sorriu. Mas, nada disse.

Aqueles companheiros de profissão tinham passado dezesseis anos a ouvir respostas a perguntas que jamais fizeram. Depois, passaram a dar respostas a perguntas que os seus alunos não faziam. Talvez ainda restasse alguma curiosidade perante os fenómenos do mundo, mas tinham deixado de perguntar.

Decidi dar algumas “respostas”, para enganar o incómodo silêncio. Falei dos putos da Ponte, de como esses putos aprendiam, como os putos brincavam. E até declamei o início de um poema:

“São como bandos de pardais à solta os putos.”

Na primeira fila, as freirinhas – a palestra decorria numa escola confessional – manifestavam incómodo. Por que seria?

“Puto” é a palavra portuguesa equivalente ao “guri” gaúcho. Português recente no sul, falando corrido, cortando as últimas sílabas, pronunciando palavras de dúbio significado, ou consideradas vitupérios, cria fazer-me entender. Quando me despedi, dizendo “espero que vades daqui…”, uma amiga me segredou que eu proferira ofensas e que nada entendera do restante.

Não precisei de ir ao Brasil, para me aperceber de que poderemos estar culturalmente desenraizados. Nos idos de setenta, rumei aos cafundós do meu país e por lá me embrenhei em novos glossários. Quem me guiou pelos caminhos da decifração de novos códigos foi a Guidinha. Dessa maravilhosa criatura vos falarei em outra cartinha. Por agora, me quedo na escrita da primeira enigmática frase, que lhe escutei:

“E adei botou o pesigo no quedute!”

Decifrei essa e outras proposições com recurso a um elucidário, do qual constavam termos como os falados e pensados pela Guidinha:

“Presigo” significa “almoço”; “almeiro” é o mesmo que marmita”; “e adei” quer dizer “e então”; um “rebo” é o mesmo que uma “pedra”; “bem cá toma” é uma expressão de vasto espectro semântico que, neste contexto quer dizer, mais ou menos, “Pudera”; “caleiras” é o regionalismo equivalente às nossas bem conhecidas “escadas”; “poleia” significa “tareia”; “mirava” é a forma verbal equivalente a “acertava”; “alagar” é o mesmo que “estragar”; “enfusa” é equivalente a “caneca”; “mocho” é o mesmo que “banco”; “botelha” vê-se logo que é uma “garrafa”; fácil é de ver que uma “toca” é um “buraco”.

No tempo da “tia tapa o pote”, algumas mestras se equivocavam, embora se aprimorassem na invectiva:

“Ó minha parva, senta-te! Já me deste cabo do plano e já nem te estou a ver bem!”

A “parva” sentava-se, encolhida, confusa, mas aliviada.

“Já vi que daí não há-de sair nada. Diz lá tu, ó Toninho! O que é que está aqui escrito?” 

O Toninho era o “inteligente” da turma. Era uma criança grave e delicada. O ternurento diminutivo usado pela professora ficava-lhe a matar. Também lhe assentava como uma luva o cognome de “Mete Nojo”, que o Nelo das Fajãs havia inventado e que a turma, unanimemente, adoptou. Filho do senhor engenheiro agrónomo, seria evidente para a mestra que o Toninho reconhecesse o tubérculo e soletrasse a preceito “ba…ta…ta”.

“Diz lá, Toninho, o que aqui está escrito.” 

“Semelha, senhora professora”, disse o Toninho.

Sói então a professora nada e criada no Portugal Continental se apercebeu de que, na véspera, havia almoçado semelhas com bacalhau, pensando ter comido batatas.

 

Por:José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCLI)

Santa Marta do Pinhal, 16 de setembro de 2041

O Mestre Agostinho dizia que poeta era aquele que criava na vida alguma coisa que na vida não existia. No Brasil, que amou e celebrou, ajudou a criar universidades, tertúlias, institutos. Viveu como um franciscano, porque sabia que nascemos para criar e que a vida deve ser gratuita.

Consta que, em Itatiaia, reuniu gente naquilo que, hoje, poderíamos designar por comunidade de aprendizagem. Sabia que o desenvolvimento dessas comunidades dependia da diversidade de experiências das pessoas que as integravam, bem como requeria que todos os membros que a constituíssem se envolvessem num esforço de participação, de produção conjunta de conhecimento, vizinho a vizinho, numa fraternidade aprendente.

Ontem, celebrei o aniversário do nascimento do seu contemporâneo Rubem Alves. Esse meu extremoso amigo partilhava os mesmos princípios e a mesma prática do Mestre Agostinho. Propunha que a educação fosse romântica. E eu propus que fosse, também… conspiradora. Assim, nasceram, no distante ano de 2004, os “Românticos Conspiradores”. Em 2013, os RC publicaram o “Terceiro Manifesto da Educação”. E deram origem à CONANE – Conferência Nacional de Alternativas para uma Nova Educação.

É bom lembrar esses prógonos RC. Como vos disse, na cartinha de ontem, quem os procurasse na Internet, raramente os encontrava. O seu labor era discreto, “trabalho de formiguinha”. Os RC faziam a sua parte. Eram poucos, mas eram o que de melhor a escola pública dispunha.

As escolas ditas “públicas” permaneciam ilhadas, alheias às comunidades, enquanto a sociedade civil tentava remediar efeitos perversos do instrucionismo. O IDEB, os índices de proficiência, os de abandono, os do analfabetismo, nos mostravam que a escola dita “pública” não era pública.

Nos bastidores do drama educacional, os RC tudo faziam para concretizar a utopia da “escola pública”. Musil dissera ser a utopia “uma possibilidade, que pode efetivar-se no momento em que forem removidas as circunstâncias provisórias, que obstam à sua realização”. E ia além, quando adotava o princípio de Adolfo Lima de que uma mudança radical talvez fosse impossível, mas que uma mudança não radical seria sempre inútil.

No idos de vinte, assistíamos a mudanças não radicais, inúteis. A inovação era cerceada por um discurso oficial, que Norman Mailer assim definiu:

“Diz apenas uma coisa muitas vezes. Aquela gente é como pedras e surda. Não te preocupes se eles ouvem.” .

Entre as vozes que rompiam silêncios cúmplices, se contava a da minha amiga Tina. Perante o descuido (prefiro usar o eufemismo) da administração educacional, que propagandeava um “novo normal”, metaforicamente, a Tina nela zurzia:

“Você contrataria uma empresa de logística que, a cada 100 entregas, extravia 91 pacotes? Você manteria na sua equipe um funcionário que, a cada 100 tarefas, só conclui 9? Você viajaria em uma companhia aérea que, a cada 100 voos, 91 não chegam ao destino? Você compraria um carro de uma loja que, a cada 100 vendas, dá calote em 91 clientes? Você colocaria o seu filho em uma escola que, a cada 100 alunos que concluem o Ensino Médio, somente 9 apresentam níveis satisfatórios em matemática?”

Os dados estatísticos não mentiam. Por exemplo: menos de 10% dos alunos de escolas públicas e privadas, que haviam concluído o Ensino Médio, apresentavam um conhecimento adequado em matemática. E, bem ao seu jeito, a minha amiga Tina assim concluía a oportuna crítica:

“Eu, realmente, espero que este velho “novo normal” das escolas nunca mais volte.”

Infelizmente, voltou.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCL)

Palhais, 15 de setembro de 2041

Agostinho acreditava sermos capazes de reencontrar o que em nós é extraordinário, para transformar o mundo. E agiu em coerência com as suas convicções. Traduziu para a língua brasileira a obra dos escolanovistas e ousou a ruptura com o instrucionismo, gesto poético de quem aprendeu a arte de colocar o sonho em ato.

Debaixo de uma mangueira próxima da faculdade de Pedagogia da Universidade de Brasília, ele escrevia poemas, que distribuía por alunos, professores e candangos. E, quando propôs que se trocasse o lema “ordem e progresso” por “liberdade e desenvolvimento”, sofreu as consequências da sua civil desobediência e da coerência com o seu credo:

“A vida certa do mundo inteiro seria que cada um pudesse viver a sua vida e cada um dos outros pudesse ter esse espetáculo extraordinário de ver pessoas diferentes à sua volta e não, como tantas vezes acontece, sobretudo em pessoas que gostam de mandar nos países, achar que deve ser tudo igual, e quando aparece alguém diferente se ofendem, acham que está fugindo das regras, saindo da vida que deve ter”.

Agostinho era um viabilizador de utopias, Era um “romântico conspirador”. Tal como o Mauro e a Valéria.

No setembro de 2021, com outros RC, esse maravilhoso casal preparava mais um ENARC (Encontro Naciobal de Românticos Conspiradores).

Com a Janaína, a Fabi e o “Coletivo ENARC” que, desde 2004, havia reunido extraordinários educadores, organizavam novo encontro. A pandemia impunha o recurso ao virtual. Mas, sem prescindir do uso da máscara e de outros cuidados, o abraço fraterno seria dado presencialmente, na Tijuca, no Rio de Janeiro.

O lugar de encontro – a Escola Oga Mitá – era exemplo de escola pública de iniciativa particular, era uma prática comunitária. E tudo era realizado na base do voluntariado. Quando sugeri a um potencial apoiador que se inteirasse do evento, essa pessoa me disse ter procurado na Internet e encontrado um “ENARC” financiado por universidades e benfeitores: o “ENARC 2021: Encontro Nacional de Aproveitamento de Resíduos na Construção”.

O movimento “LIXO ZERO” estimulava cidades a ter um maior aproveitamento e uma melhor destinação dos resíduos sólidos, bem como, a reduzir o descarte destes materiais em aterros sanitários e lixões. Era uma meta ética e econômica, que orientava pessoas a mudar seus modos de vida e práticas, de forma a incentivar os ciclos naturais sustentáveis.

Entre palestras, painéis e workshops, aconteceria a Semana Lixo Zero, em Porto Alegre. A meritória iniciativa do sul contaria com técnicos de reconhecida competência, que buscavam soluções a jusante do sistema educacional. No chão da escola, aconteceria o ENARC do Rio. Contaria com os testemunhos de educadores, cujas ações desenvolvias a montante dispensariam iniciativas como a do Lixo Zero.

A escola instrucionista, que nem sequer ensinara a lavar as mãos, permanecia alheia à crise de degradação ambiental. Sobrevivia de paliativos, mais ou menos, pedagógicos. E justificava a criação de institutos, a publicação de estudos, a elaboração de teses. As escolas dos Românticos Conspiradores não eram convidadas para eventos remediativos. Discretamente, faziam a “sua parte”. À margem da comunicação social, no chão de novas construções sociais de aprendizagem e de educação educadores éticos praticavam educação ambiental preventiva.

Acrescente-se que a inscrição na sétima edição do ENARC do Lixo Zero (apoiada e financiada) custava 240 reais. A participação no ENARC das escolas (sem beneficiar de apoios, ou financiamento) era gratuita.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCXLIX)

Queimadas, 14 de setembro de 2041

Há, mais ou menos, sessenta anos, escrevi um textinho, que era mais uma overdose de citações. Inconscientemente, ia “parasitando” leituras e me dei conta de que, nesse tempo de teorizações de teorias, o escriba era um replicador. Quem poderia reclamar-se original? Até que, numa “palestra” alguém assim falou:

“Isso é tudo muito bonito, mas é na teoria!”

Expliquei ao meu interlocutor que eu estava a descrever situações da prática, da minha prática. De nada valeu. Apenas nos tornamos incómodos (digo “nós”, porque eu falava por um “coletivo”), porque praticávamos teoria, testando-a.

Acolhi a lição. E, a partir daí, quase deixei de publicar textos com citações, jargão “científico” e notas de pé de página. O primeiro livrinho da nova prática escrita dava pelo nome de “Quando for grande, quero ir à Primavera”.

“Mal com el-rei, por amor dos homens; mal com os homens, por amor d’el-rei”. Custou caro o atrevimento de publicar narrativas da práxis. A academia me tentou exorcizar, a burocracia me chamou utópico. Mas, não seria o único e tomava asse epíteto como elogio.

Tão romântico como o Rubem e o Laerte, o vosso avô resistia a convites do fácil, insistia numa alquimia libertadora de afectos, irmanado com educadores sensíveis, que acolhiam a mensagem peregrina do Mestre Freire:

“A Educação é um acto de amor, por isso, um acto de coragem. Como aprender a debater, com uma educação que impõe?”

Quem nos dera que todas as escolas fossem lugares de fazer, aprender e debater, onde se permanecesse o tempo preciso para realizar o projeto de um sonho. No belo exercício de sensibilidade que dava pelo nome de “Tudo sobre a minha mãe”, um dos personagens assegurava sermos “tão mais autênticos quanto mais nos parecermos com o que sonhamos”. A utopia de Freire projetava-se na sétima das artes. Só não lograva afetar a Pedagogia que, apesar de reconhecida como arte, nunca teve direito a número de série. Ainda que, nos palcos onde o drama educativo se desenrolava, os vulgares atores contracenassem com fugazes personagens, que buscavam a síntese possível entre ciência e arte.

Nas minhas andanças pelas escolas, encontrava professores alienados por uma formação profissional arcaica, neutralizados por lideranças tóxicas, controlados pelo medo de perder o emprego. O que fazer para que os educadores acordassem para a necessidade de mudança, numa época feita de hedonismo e entretenimento fútil?

Os dados de pesquisas eram construtos teórico-técnicos com poder limitado de indicação. Mas, também, eram referência e sinal de alarme. As séries históricas mostravam a dimensão da crise. Mas, se constituíam num mecanismo utilizado para olhar para trás, inúteis para projetar o futuro – e se exauriram em estudos e teses.

Quem tentasse fazer alguma correlação com as séries históricas, desde as da década de noventa, chegaria à conclusão de que o mundo precisava de adultos responsáveis, não de otimismo infantilizado. Que a escola e as crianças precisavam de amor pela infância, não de escolas e educadores infantilizados.

Quando achava um professor que ainda não tivesse “morrido”, convidava-o para uma profunda reelaboração da sua cultura pessoal e para a recuperação da dignidade profissional – para ser ético

Nos idos de vinte, agíamos dentro de um princípio pessimista, o da precaução. Mas, também, agíamos esperançosamente. Trabalhávamos na prática, reconhecendo a complexidade dos processos, gradualmente, transformando incertezas em concretizações.

Estou a falar-vos dos protótipos de comunidade de aprendizagem.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCXLVIII)

Bairro Novo, 13 de setembro de 2041

“Amor por princípio, a Ordem por base, o Progresso por finalidade” – eis o lema adotado por Benjamim Constant, o “Fundador da República Brasileira”. Benjamim foi Ministro da Instrução Pública, autor de uma profunda reforma curricular, propôs a descentralização da gestão e uma “formação adequada aos novos tempos” – aos “novos” velhos tempos em que se contemplou numa bandeira a “base” e a “finalidade”, mas se enjeitou o “princípio”.

Apesar de ter sido militar e condecorado como combatente na Guerra do Paraguai, Benjamim era um pacifista, assumia o princípio de que se deve “Viver para Outrem”. E, ao participar no movimento pela Proclamação da República e na elaboração da Constituição de 1891, pugnava por que a palavra Amor estivesse presente em todas as citações do lema positivista.

Tal como o Benjamim de há mais de cem anos, sabemos que as pessoas deverão amorosamente colaborar com pessoas, sem com elas competir. Sabemos que escolas são pessoas e que as pessoas são os seus valores. Nos últimos cinquenta anos, milhares de vezes orientei a construção de “árvores dos valores”. Cada participante nessa dinâmica de grupo indicava o valor essencial das suas vidas. E o “tronco” da “árvore”, o valor mais vezes referido sempre foi o… Amor.

Numa tese sobre a Escola da Ponte, encontrei a descrição de um episódio, que transcrevo. Nos idos de oitenta, o “Tribunal” julgava alunos, cujos nomes surgissem em grande quantidade no dispositivo “Acho Ruim”. Na proto-história da humanidade, em que os homens ainda precisavam de tribunais, de prisões e de guerras, as crianças os imitavam. Até ao dia em que uma menina de seis anos de idade, advogada de defesa de um colega, assim falou numa sessão do “tribunal”:

“Vós não ouvis “amai-vos uns aos outros”? Eu escutei o advogado de ataque dizer que o Marco cospe nos colegas, que lhes atira pedras, que o Marco é mau. Mas o Marco não precisa que digam que é mau. Ele precisa de quem o ajude a ser bom. Algum de nós já ajudou o Marco a ser bom?”

E continuou:

Estou nesta escola há um ano e só ouço falar de castigos. Proponho que se acabe com o tribunal e se crie comissões de ajuda”.

Assim ficou decidido, na assembleia seguinte. E, sempre que o Marco tendia para fazer besteira, logo um círculo humano o rodeava, dizendo:

Somos a comissão de ajuda. Estamos aqui para te ajudar. Nós sabemos que tu és bom. Nós somos teus amigos!”

O “mandamento novo” se cumpriu. A amorosa inteligência prática das crianças dispensou a imposição de mais regras, de reprimir, de punir.

A aprendizagem acontece, se tecemos vínculos afetivos – se eu existo é porque o outro existe. O ser humano não é apenas um ser de contato – é um ser em relação – e a educação é um ato de amor. Mas, nos idos de vinte, continuávamos insensíveis aos apelos de Freire e do “poetinha”: “ponha um pouco de amor na sua vida”. Nos arquipélagos de solidões em que as nossas escolas se transformaram, “inauguraram o desamor, não os desamados, mas os que não amavam, porque apenas se amavam”.

Ordem sem amor é violência, porque “o adestramento não define a educação e uma educação amorosa é incompatível com a organização autoritária da vida”. Progresso sem amor é deterioração da relação, desumanização. Nos idos de vinte, vimos no que deu…

Ordem e Progresso, sem Amor? Na sociedade doente em que vivíamos, prevalecia a cultura do ódio. Imaginai o que seria um país, se a palavra Amor não fosse ostracizada, mas vivificada. Se um hino nos dizia que “um raio vívido de Amor e de esperança à terra desce”, por que terá sido amputado o lema positivista inscrito na bandeira do Brasil?

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCXLVII)

Torre da Marinha, 12 de setembro de 2041 

Entregaram uns papéis ao professor, acompanhados de um aviso:

“Cuidado com o Teixeira! Dizem que é autista e, além disso, é mal-educado e preguiçoso”.

Estava quase a fazer treze anos, na primeira classe. Tinha saltado de professor para professor, em turmas indesejadas. Era conhecido pelo nome de família, pois o nome próprio ninguém parecia conhecer.

O professor desta história era novo, não possuía a experiência dos mais velhos, nem a ciência dos especialistas da “educação especial”. Pouco sabia de autismos. O Teixeira era autista. Pois! E o que é que o rótulo ajudava? E, se o professor estava sozinho na sua sala, com os seus alunos e mais um autista, sozinhos estavam os colegas das outras salas com os seus alunos.

Que pior forma de autismo que esta entre professores? Tinham-lhe ensinado tudo no curso, exceto o saber educar um autista.

“O colega imponha-se, o colega defenda-se!” 

O professor defendeu-se. Registou alguns comportamentos:

“O Teixeira vive numa profunda tristeza, gosta de estar sozinho”. 

Mas a verificação pouco ajudava. Se procurava aproximar-se, ele fugia-lhe de imediato, como uma gata que tinha lá em casa. Aos treze anos, o Teixeira não sabia ler nem escrever. Se sabia, não o mostrava. Mas precisaria ele, mais que tudo, de saber ler e escrever?

O professor veio a saber mais tarde, pelos livros e por “incidente crítico” que o Teixeira não era, nem nunca tinha sido autista na sua vida. Tinha sido criado entre ovelhas, das cinco horas da madrugada ao meio-dia de todos os dias. Tinha vivido entre uma casa vazia e o vazio de uma escola, entre as treze e as dezoito horas de todos os dias. E deitava-se todos os dias com as galinhas.

Há meses que o professor se acercava matreiro do Teixeira, sem ir pelo atalho das letras e dos números. Tinha sido rejeitado mil vezes, talvez pagando as rejeições que o Teixeira tinha sentido anos a fio. Mas também já tinha conseguido arrancar algumas palavras ao dito “autista”.

Num sábado de manhã, quando o professor esperava o ônibus que o levaria para o aconchego do fim de semana em casa, viu o Teixeira a atravessar a estrada varejando o rebanho. Arredou as ovelhas para um valado e sentou-se numa pedra a uma distância prudente da paragem do autocarro. Com o cajado batia pedras para o outro lado da estrada, como quem estava distraído.

Estava quase na hora de passar o ônibus. O professor não poderia dar-se ao luxo de o perder, pois só teria outro lá para o meio da tarde. Mas a tentação foi mais forte do que a prudência. Lançou olhares insistentes para a curva da estrada de onde haveria de surgir o ansiado transporte. Lançou outros tantos olhares para o lado da estrada onde estava o Teixeira. E o dilema resolveu-se. Deu alguns passos com a mala na mão na sua direção, como quem se acerca de um pássaro que, a qualquer momento, pode levantar voo. Captou-lhe o olhar. Sorriu. O “autista” não fez menção de se levantar.

O professor percorreu os metros que faltavam, hesitante, deitando olhares para trás, não viesse aí ônibus. Primeiro, de pé, a falar sozinho para o Teixeira e este a olhar os paralelos e a bater pedras para o outro lado da estrada. Uma olhadela ao relógio e sentou-se devagar para não assustar o pássaro. Pousou a mala. O Teixeira já respondia, ora com a cabeça (que sim, que não), ora com os ombros (quero lá saber!).

Na paragem, ninguém. O condutor ainda reduziu a velocidade, ainda deitou um olhar para a mala pousada nas pedras à margem da estrada. Faltou coragem para estender um braço e fazer-lhe paragem, porque o outro estava, fraternalmente, pousado sobre o ombro do “autista”.

 

Por: José Pacheco

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Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCXLVI)

Cacilhas, 11 de setembro de 2041

Ontem, completaram-se vinte anos sobre o falecimento de um homem bom. Foi Presidente da República de Portugal e, na “Semana da Educação” de 1998, Jorge Sampaio visitou a Escola da Ponte. A visita ia a meio, quando ele pediu aos jornalistas e repórteres de rádio e tv que saíssem da escola por meia hora. Subiu ao primeiro andar e meteu conversa com as crianças. Sentou-se junto do Daniel e perguntou-lhe:

“Sabes quem eu sou?”

Sem retirar os olhos do trabalho que estava a fazer, a criança respondeu:

“Sim. Sei. É o Senhor Presidente da República”.

“O que está a fazer?” – insistiu o Presidente.

“Estou a preparar os cartões de sócio do Clube dos Limpinhos”.

“Que clube é esse?”

“O Senhor Presidente é Limpinho?”

“Acho que sim.”

“Então, diga se concorda com estas regras.”

Jorge Sampaio concordou. A criança pediu-lhe os dados do Bilhete de Identidade. Confeccionou um cartão de cidadão limpinho e entregou-o ao Presidente.

A longa visita terminou na reunião da Assembleia de Escola. O Presidente e a esposa intervieram, para realçar o comportamento exemplar dos alunos, o elevado sentido do exercício democrático. Nessa noite, a televisão mostrava o final da reunião da Assembleia. Visivelmente emocionado, Jorge Sampaio se despediu, dizendo:

“Recebi de vós lições de cidadania. E peço-vos que nunca deixeis de erguer o braço, para pedir a palavra!”

Considerava que a cidadania “não se esgotava na escola”, mas que tinha aí “elementos essenciais de consolidação”:

“Um dia, aos oito anos, a professora disse-me que era eu que ia fazer o discurso semanal. Esse discurso foi comentado e criticado. Só mais tarde, percebi o quanto esta experiência de intervenção foi útil para o resto da minha vida”.

Na abertura da Semana da Educação, apontou como preocupação o facto de nem todas as crianças terem acesso a um ensino básico de qualidade.

“A escola e a família são fundamentais para desenvolver a capacidade de intervenção e de influenciar o nosso tempo. Há também responsabilidades sociais, por parte de toda a comunidade. Os problemas da escola resolvem-se dentro e fora dela – referiu Jorge Sampaio, fazendo apelos à participação responsável e à mudança:

“É preciso recusar tendências autoritaristas e saudosistas” – o Presidente estava atento a uma alteração da Lei de Bases, ao regresso da figura do diretor como alternativa a uma direção gestão e administração baseada em conselhos, não-hierarquizada:

“Não quero um País complacente com um destino escolar medíocre”.

Por essa altura, eu era membro eleito do Conselho Nacional de Educação e me coube elaborar um Parecer sobre uma proposta de lei. Nessa proposta, se previa que a “educação para a cidadania” fosse ensinada em uma ou duas aulas semanais. Quis saber se nas aulas de matemática não se exercia o direito de ser cidadão. Perguntei se na educação artística não havia cidadania. Questionei o fato de a cidadania do aluno estar limitada a uma ou duas horas semanais. E acrescentei que não se educa para a cidadania, nem se ensina cidadania – aprende-se cidadania no exercício da cidadania, no exercício de uma liberdade responsável.

Jorge Sampaio apelava a uma cidadania plena. Dizia que a escola deveria “desempenhar um papel importante na forma como vivemos a cidadania democrática”. E recomendava ao ministério a organização de assembleias nas escolas, como as vivenciara na Ponte. O ministério decretou que fossem feitas assembleias de… turma.

 

PS: Queridos netos, a foto que encima esta cartinha fixou o omento em que o vosso avô explicava ao Presidente o funcionamento da Ponte.

 

Por: José Pacheco

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