Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCL)

Aljezur, 31 de dezembro de 2041

Os últimos dias do distante 2021 foram dramáticos para muitos brasileiros. O Brasil estava com fome. A miséria em que o desgoverno lançara parte da população, justificava o pungente apelo de um aluno de uma escola de Paranavaí:
“Professora me ajuda estou sem nada para comer em casa. Por favor eu imploro pra senhora”. 

O rogo de uma criança de 14 anos retratava a realidade de milhares de crianças. E o que tinha a Educação a ver com isso? Tudo! Mais do que nunca, precisávamos refletir sobre o real significado da escola, porque, num mundo desigual, a escola era um berço de desigualdades. 

Na primeira carta da “Pedagogia da Indignação” Paulo Freire escrevera:

“Como posso “convidar” meus filhos e filhas a respeitar meu testemunho religioso se, dizendo-me cristão e seguindo os rituais da igreja, discrimino os negros, pago mal à cozinheira e atrato com distância? Como posso conciliar a minha fala em favor da democracia com os procedimentos anteriormente referidos?” 

 Sobrevivendo na extrema pobreza, muitas famílias encontravam na escola uma referência, nela buscavam amparo. E, por iniciativa da professora desse menino, uma rede de apoio foi criada. A comunidade foi mobilizada para arrecadar alimento. 

A Cecília já o fizera, em Petrópolis. Muitos outros amigos e amigas exerciam a solidariedade urgente, um pouco por todo o Brasil. Porém, a fome e sede de justiça, a esperança de uma vida vivida não poderia esperar mais. O final de dezembro marcou o fim de um tempo. No antigo Facebook, o meu amigo André traduzia esse sentimento:

“Um grande amigo meu me disse, em 2016, antes de eu aceitar trabalhar como servidor público: “André, não faça isso! O trabalho nas escolas públicas no município do Rio de Janeiro é uma máquina de moer gente!”

Guardei esse alerta e assumi a decisão de ingressar no serviço público, no campo da educação. 

Ele tem razão. É realmente uma máquina de moer gente. É enorme o número de pessoas que eu conheci nesses quase cinco anos que tomam regularmente remédio para pressão ou para dormir, que fazem acompanhamento terapêutico, que usam remédios para controlar a ansiedade! 

Conheci um professor que teve um AVC semanas antes de se aposentar.

Conheci professores exaustos, moribundos, desesperançosos, melancólicos, assustados, desconfiados, com seu emocional em frangalhos. Em salas de professores, já vi e ouvi cada coisa! 

Já fui ridicularizado pelo que penso sobre educação, já fui humilhado perante os colegas em reuniões pedagógicas, já fui menosprezado por ser jovem e novo como servidor. 

Não é incomum ouvir da boca de um professor que, para estar ali, é preciso ser louco. E, quando você não se comporta como o grupo, você vira alvo de desconfiança.

Falta muito amor nas escolas. Falta acolhimento. Se as relações humanas no ambiente escolar fossem pautadas no respeito, no afeto, na tolerância, na diversidade, na coerência, creio que as escolas seriam muito diferentes.

Que venha 2022! Pela educação pública de qualidade, pelo amor entre as pessoas, pela sinceridade nas relações, pelo afeto e respeito, pelo aprendizado dos alunos, pelo futuro do nosso país, por uma escola do século XXI, eu sirvo.

Que não me faltem forças e que eu nunca me acomode, nunca endureça meu coração. Costumo dizer que, a cada pancada, eu sinto dor e preciso sentir.”

O André finalizava a sua missiva dizendo preferir sentir tristeza passageira a se tornar insensível. Essa declaração de Amor à Educação e o que eu já conhecia desse extraordinário educador me levou a convidá-lo para a gesta de Nova Educação, encetada em 2022.

 

Por: José Pacheco

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