Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCLVI)

Colos, 6 de janeiro de 2042

O ano de 2021 findara, sem que o vírus se fosse, ou uma nova educação chegasse. Contudo, algo se anunciava para 2022. Seria o ano da celebração do centenário do nascimento de Darcy Ribeiro. Comemorávamos os noventa anos da Maria Nilde dos Ginásios Vocacionais e do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Também, se comemoraria os duzentos anos da Proclamação da Independência, ainda que a dita e a democracia ainda demorassem a chegar.

Ficava para trás um tempo de congressos feitos de saliva e power point. Desde há meio século, entre o uso do retroprojetor ou do computador, eu assistira a monótonas ou espetaculares palestras, nas quais os palestrantes citavam teóricos, recitavam lenga-lengas do discurso das ciências da educação e receitavam mezinhas pedagógicas. 

Entre o espanto e a indignação, via-os lendo teoria requentada, como se os ouvintes fossem analfabetos e não soubessem ler frases projetadas numa tela. Escandalizado, assistia ao degradante espetáculo da apresentação de “planos de aula para… creche”. Essa perniciosa gente se enquistara nos gabinetes de universidades e ministérios. E, olimpicamente, determinavam o sem rumo de um sistema de ensinagem.

No Dia de Reis desse distante janeiro, este vosso avô partia para o norte, para a região minhota, onde projetos marginais brotavam, anunciando renovação. Em Vieira do Minho, em Alvarães, em Vila do Conde e outros lugares, retomava contato com gente que não desistia de melhorar a vida de outras vidas. 

Para trás ficava o gérmen de uma comunidade. Embora houvesse quem depreciasse o projeto e até difamasse aqueles que lhe dariam forma, Colos e o Vale de Santiago converter-se-iam numa incontornável referência de boa qualidade educacional. 

No decurso desse ano redentor, apesar das perdas causadas pelo uso indevido do digital, havia quem reagisse e agisse.  Quando se encerravam as celebrações natalinas e a árvore de Natal era desmontada, o significado da migração de três reis magos era recuperado: o de Epifania. 

Mateus relata a visita de “três” reis magos a um estábulo. Poderia ser um só, ou muitos mais. Mas, como foram três os presentes, se infere que cada um levou uma oferta. E Curcio nos dissera que os presentes foram: ouro, incenso e mirra. 

No Novo Testamento não existe a palavra “reis” para se referir aos visitantes, mas existia uma tradição medieval de usar a expressão “reis” para se referir a magos. Seja como for, magos, ou reis, certo é que veneraram um recém-nascido. Não era um qualquer recém-nascido, era alguém que chegava para mudar, não só o Império Romano (mais tarde, via Constantino), mas para “libertar das trevas o mundo”.

A Folia de Reis tinha início a 24 de dezembro e terminava no 6 de janeiro, exatamente, no dia em que vos envio esta cartinha. No século passado, entre essas datas, eu ia com amigos e alunos da Ponte, de porta em porta, tocando e cantando reisadas. Quando prefeito, organizei o primeiro sarau de cantares de reis, que viria a tornar-se uma tradição cultural, nos anos seguintes. Já no Brasil e, sobretudo, no Nordeste, assisti e participei em “reisados”. Músicos, cantores e dançarinos invocavam “a manifestação de Jesus como Messias, Salvador do mundo”. 

Era esse o sentido da palavra “epifania”: “manifestação”. Filosoficamente, significava “sensação profunda de realização”, a essência das coisas, a sensação de considerar algo como solucionado, esclarecido. Também podia ser considerado como “pensamento iluminado”, que surgia em momentos de impasse.

Em Colos, se agia e curava frustrações, se rompia o impasse.

 

Por: José Pacheco

195total visits,1visits today

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Scroll to top