Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCLVIII)

Vale Longo, 8 de janeiro de 2042 

No janeiro de há vinte anos, a UNESCO divulgava mais um relatório. Nele se dizia que os estudiosos da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura tinham gastado precioso tempo “reimaginando juntos nossos futuros”, para “um novo contrato social para a educação” e que haviam sido consultados mais de um milhão de cidadãos, bem como “quatrocentas escolas associadas e 200 cátedras Unesco em todo o mundo”. 

A minha leitura começou curiosa e terminou decepcionada. Os estudiosos andaram em busca de uma “educação do futuro”, quando aquilo que concluíram e apresentaram como proposta já pertencia ao passado. A um passado, durante o qual muitos projetos com o perfil definido pelo relatório tinham sido destruídos. Isso mesmo, queridos netos, muito tempo antes de esses estudiosos reimaginarem” a educação do futuro, muitas escolas já se organizavam “em torno dos princípios de cooperação, colaboração e solidariedade”. 

Os currículos dessas escolas davam dar ênfase a “uma aprendizagem ecológica, intercultural e interdisciplinar”, ajudando os alunos a “acessar e produzir conhecimentos, desenvolvendo ao mesmo tempo a sua capacidade de criticá-los e aplicá-los”. Eram “escolas reinventadas a fim de facilitar ainda mais a transformação do mundo em direção a futuros mais justos, equitativos e sustentáveis.

Coloco entre aspas excertos da apresentação do relatório. No dizer dos seus autores, essas escolas deveriam ser “locais educacionais protegidos”, visto que promoviam a inclusão, a equidade e o bem-estar individual e coletivo. Mas, cadê a UNESCO, quando os professores dessas escolas, “produtores de conhecimento e figuras essenciais na transformação educacional e social, ao invés de serem reconhecidos, eram ameaçados, perseguidos, punidos, só por pretenderem concretizar as propostas do… “relatório”?

Num encontro realizado em São Paulo, escassos dias antes de ser nomeado ministro da educação, Renato Janine dirigiu-me a seguinte pergunta:

“Professor, os projetos inovadores surgem sempre na periferia do sistema, a partir da escola?”

Respondi que deveriam surgir de um “um novo contrato social para a educação”, tal como rezava o relatório, de uma espécie de pacto entre os ministérios e as escolas. O poder público deveria garantir estabilidade às equipes de projeto e conferir às escolas com projetos inovadores um grau de autonomia, que lhes permitisse, efetivamente, inovar. Nada disso se fez. E, quando projetos considerados pelo ministério como inovadores tiveram visibilidade social, o que aconteceu foi a sua cristalização, recuo, ou mesmo a sua destruição.

Os autores do estudo, certamente, nunca tomaram conhecimento do fato. Por serem (presumo) do mundo da especulação teórica e estarem longe do chão dessas escolas, elas não teriam sido consultadas. Ignorando a sua existência, replicaram como se tratasse de uma novidade aquilo que, há muito tempo, elas haviam produzido. Mais uma vez, se reinventava a roda da educação. 

O estudo incentivava o pensamento diferente sobre a aprendizagem, convidava a forjar uma nova visão regida por princípios como o reforço da educação como bem público e comum. Propunha que os países membros da UNESCO se comprometessem “a alocar entre 15% e 20% do gasto público à educação, bem como para aumentar o volume, previsibilidade e eficácia da ajuda internacional à educação por meio do cumprimento de uma doação de 7% do PIB para a ajuda oficial ao desenvolvimento”. Mas, doar dinheiro seria condição suficiente, ou desperdício? 

 

Por: José Pacheco

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