Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCLXXV)

Maricá, 27 de janeiro de 2042

Enquanto, em Portugal, despontavam comunidades, na margem sul do oceano, uma nova educação acontecia no exercício de uma cidadania de novo tipo, “decolonizante”, como, então, se dizia. Afinal, o Brasil era a terra do Milton, do Florestan, do Freire, da Nilde, de Nise, do Lauro, do Anísio, do… Darcy.

Movimentos suspensos nos anos sessenta ressurgiram. Secretarias de educação se reuniam, para suliar rumos de chegar a uma educação do século XXI. Constituídos “grupos de trabalho” encarregados de coordenar os processos de transição, se cuidava de oportunizar uma formação adequada aos educadores envolvidos na primeira fase de um plano de inovação. A par das transformações operadas, a base legal era revista e a sustentabilidade dos projetos repensada.

Foi-me conferido o privilégio de acompanhar esse movimento concebido por extraordinários seres humanos devotados ao bem-estar comum. O Alex e a Tina faziam parte do rol. Consciente da velhice do “novo normal” e de que era hora de ignorar professáurios e apoiar as iniciativas de professores éticos, a minha amiga Tina assim os saudava:

“Parabéns a todos os professores que não aceitam um “sempre foi assim” como negativa para a transformação da educação, que entendem que memorização não é sinônimo de aprendizagem, que têm a clareza de que a padronização gera exclusão e não igualdade de oportunidades, que não aceitam a robotização imposta por apostilas, que não enformam crianças, que exercem uma escuta empática e uma educação afetuosa, solidária e colaborativa, que não praticam uma educação bancária, em linha de montagem e nem tratam as crianças como tábulas rasas ou folhas em branco, que proporcionam que seus alunos sejam protagonistas e autônomos no processo de aprendizagem, que não se iludem com a “educação do futuro” e lutam pela melhoria da educação do presente. Parabéns a todos os professores que acreditam que é possível uma nova construção social pela educação humanizada, integral em comunidades de aprendizagem. Parabéns a todos os professores dedicados, que sofrem discriminação dos professores acomodados”.

Neste ato de corajosa escrita, nesta declaração de Amor, a Tina sintetizava o sentir dos seus pares.

Na Pluriversidade portuguesa, a voz crítica da Bárbara, investigadora em desenvolvimento comunitário e participação cidadã, juntava-se ao coro de agentes educativos que, nos idos de vinte, encetaram profundas mudanças no modo de conceber e de fazer educação:

“Hoje temos em Portugal uma parca educação para a cidadania ativa (…) um povo dos brandos costumes, desconhecedor de alternativas”. 

Eram justas as palavras da Bárbara. E a Teresa, atenta à criatividade dos movimentos sociais de então, participante de projetos promotores de “cidadania ativa”, questionava: · 

O que nos impede de pensar a Escola Pública em conexão profunda com o território, com as suas gentes, os seus saberes?

O que nos impede de sair do espaço físico do edifício da escola e de aprender na e com a comunidade?

O que nos impede de acreditar na proximidade, no envolvimento, no diálogo, como fatores de aprendizagem e produção de conhecimento?

O que nos impede de criar Círculos Locais de Conhecimento, tal como se procura criar circuitos diretos na Economia Circular?

O que nos impede de juntar gente miúda e graúda numa Educação Comunitária, em que todos aprendem com todos, e todos cuidam de todos?

Afinal, o que impedia a mudança? O desgoverno? As lideranças tóxicas? 

Não. O que impedia era o nosso imobilismo. Éramos nós! 

Então… nós nos despedimos.

Por: José Pacheco

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