Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (DCCLXLVII)

Pampilhosa da Serra, 20 de fevereiro de 2042

Como vos disse, netos queridos, a discussão em torno dos exames, provas, testes e afins era uma espécie de passatempo muito do agrado dos responsáveis pela gestão de um malfadado sistema educacional, que vigorou até aos anos trinta. 

Um normativo de 1976 fora certidão de óbito dos exames da “quarta classe”. Malgrado as frequentes viagens a uma Finlândia da moda, que os havia, quase totalmente, erradicado, os exames retornaram das catacumbas da pedagogia e se mantiveram vivos nas representações sociais e ativos nas práticas escolares. E, em 1977, ministeriais orientações viriam a abrir caminho para a proliferação de ambiguidades: 

“Talvez que, em Portugal, quando na escolaridade obrigatória para todos não houver diferenças tão significativas, o problema se coloque de modo diverso; talvez o termo exame venha a ser substituído pelo de prova, teste, ou outra designação adequada”. 

Pelo subido coturno desse normativo se depreendia que, para o ministério da educação, tudo não passaria de uma mera questão de terminologia. O resultado de décadas de fatais hesitações estava à vista de quem quisesse ver: para um “ensino em massa”, planejamento de aulas para o “aluno médio” e reprovação para os “menos aptos”. Restava saber a quem seria dada aula, acaso o “aluno médio” faltasse à escola. Ou como se reprovaria aqueles que a abandonavam.

Ciclicamente, se legislava absurdos, bovinamente aceites por professores legal e teoricamente desarmados, por via de uma formação de péssima qualidade. 

“Que lhes valeu todo o curso que fizeram durante longos anos? Em vão leram livros copiosos, beberam a caudalosa erudição dos catedráticos imponentes, fizeram provas escritas de inúmeras laudas, com letra miúda. Palavras, palavras, palavras que o vento levou”. 

Quem assim nos falava era a Cecília Meireles. Em 1930! 

Nos idos de vinte, os professores acumulavam certificados de “capacitações”. Se a competência desses professores fosse medida pelo número de cursos frequentados, a sua qualificação seria extraordinária. Se a qualidade das escolas pudesse ser medida pelo peso de diplomas e certificados, já teria acontecido uma revolução em cada escola. 

A acreditar numa pesquisa do Naércio Filho, de 2007, os professores que tinham feito muitos cursos não tinham melhorado a aprendizagem dos seus alunos. As conclusões desse estudo explicavam a inércia dos professores:

“Quando se trata do ensino público e dos cursos de capacitação oferecidos aos professores dessas redes, a constatação é que eles não estão fazendo diferença no desempenho dos alunos, apesar de serem divulgados como uma das iniciativas para melhorar o ensino. O professor vai, fica ouvindo sobre várias linhas pedagógicas e, no fim, não aprende nada que consiga usar.” 

Em Portugal, após o incremento da formação continuada de professores e do investimento de milhões de euros, os resultados foram decepcionantes – quase nada se alterou na atitude dos professores e pouco terá mudado nas suas práticas. O modelo de formação, que ainda predominava, era a negação do que se pretendia transmitir. 

Se os formadores ensinavam métodos ativos a professores inativos, o que ficaria? O professor aprendia a “teoria “transmitida”, ou a prática “praticada”? 

Os formadores pareciam adoptar a máxima “olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço”, ignorando que acontecia formação sempre que um professor estabelecia um diálogo entre o eu que agia e o eu que se interrogava, num processo social em que transformava o conhecimento que tinha da realidade.

 

Por: José Pacheco

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