Sete Rios, 22 de maio de 2042
Em meados de 22, um longo processo de formação teve início em Maricá. Estávamos no ano do centenário de Darcy Ribeiro. Lenta e prudentemente, se cuidou dos educadores, ajudando-os a fundar a primeira comunidade de aprendizagem, que o século XXI da educação conheceu.
Um período de adaptação precedeu o trabalho em chão de escola. foi tempo de uma abordagem, mais ou menos, teórica, que a fundamentação teórica seria concomitante com as transformações operadas nas práticas.
Aquilo que, por esse tempo, dispúnhamos era uma amálgama de vivências, caóticos retalhos formativos partilhados, a precisar de um re-ligare. As tarefas propostas, apesar do encadeamento lógico com que se apresentassem, deveram ser reescritas no chão das escolas.
Para além de um exercício de formação experiencial, urgia que fossem criadas condições de sustentabilidade. Por esse tempo, ressalvadas honrosas excepções, a administração educacional não dava tréguas a quem ousava reelaborar a sua cultura profissional e alterar as suas práticas. só as máximas de Agostinho da Silva nos ajudavam a suportar um longo desgaste:
“É necessário que se resista enquanto houver um fôlego de vida, mas que essa resistência seja sobretudo o contato com a realidade da força criadora; é esta que afinal tudo leva de vencida e reduz oposições a pó inútil e ligeiro”.
A proposta de tarefas resultava de um estudo de anteriores práticas de criação de comunidades de aprendizagem. A sequência apresentada era aquela que a maioria dos projetos adotara. A ordem das tarefas poderia ser alterada por decisão de cada núcleo de projeto, assim como o seu tempo de duração, que deveria ser aquele de que cada núcleo considerasse adequado.
Eu escrevi “núcleo de projeto”? Isso mesmo! Eram vários os caminhos, apenas seria preciso que um núcleo de projeto desse os primeiros passos. Apenas seria preciso que houvesse numa escola um educador, que “ainda não tivesse morrido” e decidisse recomeçar um projeto de vida pessoal e profissional.
Projetos nasciam de necessidades, desejos, problemas, sonhos. Projetos nasciam de interrogações, requeriam resposta científica e legalmente fundamentadas. Muitos educadores já tinham reaprendido a fazer perguntas. E eu esperançava, quando acolhia depoimentos como este:
“Pensamos em desistir várias vezes e retornar ao caminho antigo. Não existiam modelos. Então, fomos criando estruturas organizacionais que nos permitiram interagir em novas formas com as crianças.
Após muito trabalho, muito estudo, chegamos ao fim do ano com muitas conquistas. As crianças demonstravam diferentes aprendizagens e víamos avanços em todas as áreas.
As relações afetivas foram ampliadas e um grande sentimento de grupo cresceu entre nós. Os pais mostraram-se satisfeitos com o que viam em seus filhos e apoiaram essa prática, que no início parecia tão ousada e ao final revelava-se tão eficiente.
Cresceram as crianças, as professoras, a direção, a escola”.
Mas, sabíamos que as escolas não mudariam como um todo, ao mesmo tempo. Por isso, dever-se-ia respeitar a decisão de quem recusava mudança, de quem não quisesse mudar, rogando a Deus que tivesse piedade das suas almas.
Essa seria a primeira das tarefas.
Queridos netos, não sei se estas antiguidades pedagógicas serão do vosso interesse. Quero crer que o sejam, mas aguardo resposta, para retomar ou não retomar o assunto nas próximas cartinhas. Por mais maçadoras que sejam, urge deixar registo para, que futuras gerações saibam que “mesmo na noite mais triste, há sempre alguém que resiste”.
Por: José Pacheco
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