Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MXLVII)

Caetité, 7 de novembro de 2042

Voltando às estórias que fizeram a história de uma escola… Desta vez, dando lugar e voz a quem conheceu por dentro a Escola da Ponte, partindo de uma pergunta feita por um visitante, íamos em meados dos oitenta:

“Fui educada para comer, ouvir e calar. As pessoas não podem ser pessoas e passam as horas a treinar-se em algo que lhes dizem terem de ser. Gostaria de saber qual é o segredo da Escola da Ponte, que oportunidades de formação são dadas aos seus professores. O que os faz serem diferentes?”

Não havia segredo algum. 

A pesquisadora Emília enunciava um princípio de “resposta”:

“Ao longo de 25 anos, foi alterando a sua estrutura organizativa, desde o espaço (de “área aberta”, que as crianças percorrem como uma casa que verdadeiramente habitem), à gestão do tempo, ao modo (trabalho de pesquisa predominantemente), a uma muito maior participação dos alunos na planificação das aprendizagens e na vida social da escola, e a uma muito maior autonomia na sua realização. 

Inspira esta organização uma filosofia inclusiva e cooperativa que se traduz, por exempto, nas seguintes normas simples: todos precisamos de aprender e todos podemos aprender uns com os outros, quem sabe mais deve ajudar quem tem mais dificuldades. E quem aprende aprende a seu modo. O não estilhaçar da organização por classes implica um trabalho em equipa dos professores e a sua disponibilidade quase permanente.” 

A Mria Emília compreendeu que, se algum “segredo” houvesse, seria o trabalho em equipe, uma prática de formação transformadora. 

A Cláudia disso falava, quando citava depoimentos professores da Ponte por si entrevistados: 

“As universidades não nos preparam para educar as crianças para a responsabilidade, para a autonomia, para saber pesquisar. Quem vem para aqui começa a ver o ensino de outra forma. Não faz sentido pensarmos em hierarquia dentro da equipe do projeto e sim em autoria coletiva”.

A Ponte passou por situações de crise, enquanto não formalizou o seu contrato de autonomia. E, mesmo quando adquiriu o direito de selecionar os seus professores, a cultura profissional de alguns professores contratados deteriorou laços afetivos. 

Uma formação inicial instrucionista, individualista, se fazia sentir. Assumindo atitudes contrárias ao exercício da solidariedade e de responsabilidade social, alguns recém-chegados fragilizaram esteios da cultura da escola. Os mais “antigos” comentavam as sucessivas crises de crescimento pessoal e profissional:

“Há vários aspectos que dificultam um bocadinho a harmonia. A instabilidade do corpo docente desta escola tem sido imensa. Nem todas as pessoas que cá chegaram têm um embasamento no projeto igual aos outros, igual ao restante. Aquilo que um valoriza nem sempre é aquilo que todos gostariam que fosse.

Eu sempre vi a minha escola como uma grande equipa, que funciona em equipa, que se articula da melhor forma possível. Não é? Que une esforços e que, de certa forma, se unifica em determinados comportamentos. Não é?”

Na Ponte, o antídoto para o individualismo começava a ser fermentado através do investimento no trabalho colaborativo, frente ao primeiro desafio: o da partilha do mesmo espaço de trabalho entre dois ou mais professores. A queda do individualismo também se fazia pela queda da organização hierárquica, pois não fazia sentido que na equipe existisse a subordinação de uns a outros e sim o desempenho de diferentes papéis. 

“Ninguém deve pretender querer se sobressair aos outros porque, se isso acontecer, está tudo estragado. E se isso disseminar, ainda é pior”. 

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