Bananal, 19 de dezembro de 2042
Há vinte anos, no antigo e rudimentar youtube, onde podíamos escutá-la, uma bela melodia completava cem anos de existência. No fundo do baú das velharias, encontrei um velho computador. Ainda funciona e, quando nele introduzi uma também velha pen drive, vi e escutei a Ceumar cantando o “Luar do Sertão” do imortal Gonzaga: “Não há, ó gente, ó não / Luar como esse do sertão”.
Confesso que sempre desconfiei dos backups digitais e que escrevia endereços em papel O youtube se foi, há alguns anos, mas ainda guardo nuns papeis de fundo de baú um endereço:
https://www.youtube.com/watch?v=uOO0c8A_ZYk.
Talvez tivesse sido remasterizado, como fizeram com o vinil e o cd, e vós possais escutar essa velha canção, como, hoje, tive oportunidade de escutar.
Também foi há cem anos que o Brasil do futebol, mais uma vez, se frustrou e a Argentina exultou. A América do Sul conquistava mais uma Copa. E Mbappé saía calado do estádio da final, ironizado pelo que havia dito numa entrevista, minimizando a importância do futebol sul-americano.
A final da Copa foi atravessada por múltiplas metáforas.
A equipe derrotada, a da França, era quase toda constituída por negros colonizados. A África, onde os europeus desembarcaram, no século XVI, desembarcava na Europa.
O futebol dos descendentes de escravos europeizados sucumbia face a uma equipe de brancos emigrados no sul. Os colonos do sul voltavam vitoriosos à Europa do futebol.
Enquanto isso acontecia, germinava no hemisfério sul uma educação que, em breve, iria substituir a velha e obsoleta educação nortista. Contudo, muitos obstáculos ela ainda iria enfrentar. O mundo da educação tinha perdido a oportunidade de se renovar, que a a pandemia propiciou. O velho e obsoleto modelo instrucionista reagia à crise instalada, produzindo um “novo normal” em tudo idêntico ao velho. A indústria farmacêutica aumentava a produção de Ritalina e de ansiolíticos, para ajudar à “recuperação das aprendizagens” (grotesca expressão!) dos alunos e obstar ao crescente bournout dos professores.
A pandemia tinha demonstrado que escolas não eram prédios. Mas, voltava-se a encafuar a infância e a juventude em celas de aula. E, entre a profusão de cursos vendidos a granel e de planejamentos pré-fabricados, do gabinete do gestor ao crescimento exponencial do” Negócio da China” dos “sistemas de ensino” e congressos, a educação resvalava, de novo, para o pântano da corrupção moral e intelectual, de onde jamais saíra.
Os passeios a Sobral e as romagens à Ponte continuavam lesando a bolsa dos professores romeiros. Os passeios turísticos (ditos “de estudo”) à Catalunha e à Finlândia continuavam lesando o erário público. E o que resultava desses passeios? Algo de útil?
Apenas a importação de mais paliativos instrucionistas. E uma crónica contradição. A Finlândia acabara quase por completo com provas e exames, e conferira às escolas o direito a autonomia; ministros e ex-ministros excursionistas propunham a introdução de mais provas e exames no “sistema”.
Abútricas empresas rejubilavam e nada de bom se augurava, em anúncios deste tipo:
“O ano de 2023 será um ano de transformação na escola e nas políticas públicas para a educação. Este evento apresentará as grandes mudanças, que se acenam para a educação nacional para os próximos anos.”
Embusteiros e falastrões enchiam os bolsos à custa da ingenuidade pedagógica e preocupações dos professores. E eu não conseguia entender por que razão companheiros das ciências da educação aceitavam “palestrar” nessas farsas mercantis. Por que seria?
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