São José dos Campos, 17 de janeiro de 2043
O amigo Paulo César era implacável na crítica do “sistema”. E sabia mais de avaliação do que os doutores do ministério da educação. Parasitei um texto, que ele escreveu no facebook de há vinte anos.
“Equidade? Não somos diplomas, somos pessoas.” Li esta frase num cartaz, há dias. Claro que concordei. A Educação é uma área com uma quantidade absurda de ideias pré-concebidas e tomadas de pressuposto. O peso que tem o mensurável, o número, a nota, desvirtuou todo o processo, e é, ao mesmo tempo, mentiroso, ou então falacioso, porque deixa de fora toda uma série de variáveis, a começar logo pela equidade e pela questão emocional.
A febre examinadora dos testes, dos exames, das orais, que quer fazer-se passar por “rigor”, por “excelência” e por “exigência”, não mais é do que uma pequena ilusão num mundo demasiadamente vasto, repleto de informação e conhecimento.
Tudo não passará de uma sensação de controlo, de uma ilusão de poder e conhecimento de uma parte sobre outra, procurando a reprodução, ad nauseam, dessa mesma base.
A Educação dos “diplomas” prepara para o imediatismo e para as respostas em testes e exames, ignorando a imprevisibilidade e a surpresa da vida. A Educação não é uma fórmula: podem ser muitas, mas qualquer uma delas não é, nem poderá nunca ser, à imagem de quem à mesma se aceita submeter, um dado adquirido.
Tornou-se conhecida uma expressão, muitas vezes partilhada, supostamente oriunda da África do Sul, sobre o ato de copiar (cabular). Rezava assim:
“Para destruir qualquer nação não é necessário usar bombas atómicas ou mísseis de longo alcance. Basta apenas reduzir a qualidade da educação e permitir que os estudantes ‘copiem’ nos exames.”
(…) As bombas atómicas e os mísseis de longo alcance são, também, resultado de um tipo de educação que privilegia a competição e a não compreensão do outro: a negação holística do ser, enquanto um todo; segundo, a qualidade da educação não anda acoplada a haver mais ou menos exames, mais ou menos testes, mais ou menos provas. A febre examinadora não passa de um mito quantificador (e redutor), facilitista.
O que acontece, na generalidade das provas, testes, exames, é replicar, acriticamente, o que vem nos manuais. É avaliada a capacidade de memorização a curto prazo (…) não existem, axiologicamente, grandes diferenças entre copiar e memorizar para um determinado fim. Replicar conteúdo não significa, taxativamente, qualidade, até porque um programa é sempre truncado, deixando imenso de fora. O que destrói as nações é a falta de espírito crítico, a falta de inovação, a falta de prática, a falta de respostas criativas aos problemas e, também, a falta de percepção emocional quando deparados com desafios. E a falta de empatia.
O ministro da Educação prometeu muito, mas é um tiro completamente ao lado: “Governo acredita que valorizar os exames é promover a equidade”. Passamos de um cenário em que o fim dos exames foi equacionado, e bem, para uma em que os mesmos ganham um peso-extra. É inacreditável esta inversão de marcha. Equidade? O governo sabe o que é equidade? Famílias sobrecarregadas, mal pagas, com contas sem fim às costas, com responsabilidades acrescidas, com mais do que com o que se preocupar, vão agora levar com a ‘equidade’ dos exames: trabalhar para resultados mentirosos, profundamente mentirosos, vai abrir uma clivagem ainda maior entre os que podem mais e os que podem remediadamente ou menos. Equidade?”
Fecho de aspas não significava fecho de debate. Ele apenas começava. E eu agradecia.
Bem hajas, querido amigo!
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