Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCXCIII)

Congonhas, 3 de abril de 2043

Netos queridos, envio-vos uma foto do tempo em que ainda havia sala de aula. Ela acompanhava uma notícia de jornal, que achei no baú das velharias. A notícia era referente a uma vaga de violência, que ceifou as vidas de professores e alunos.

Foi há vinte anos. Jornalistas e “especialistas” comentavam os atos de violência, cada qual a seu modo. Ambos contornando uma das origens das tragédias. Ambos naturalizando os fatos. Ambos cativos de uma cultura feita de violência simbólica e de outros absurdos educacionais correntes em… sala de aula. 

Essa foto não fora publicada por acaso, mas por… distração. Era sinal seguro que que ambos – jornalistas e “especialistas” – permaneciam prisioneiros de caducos valores e velhas crenças. 

Vede o que diziam os jornalistas:

“Aluno cria perfil e ameaça fazer massacre em escola de Águas Claras. Unidade de ensino acionou o batalhão da Polícia Militar para realizar a segurança dos estudantes.”

Três professoras e um aluno foram esfaqueados dentro da escola. O agressor, um aluno do oitavo ano, foi contido pelos policiais.”

“Professora morre após ataque com faca em escola. A Polícia Militar foi acionada para prestar atendimento no local. A Polícia Civil está investigando os fatos

“Um professor foi assassinado numa escola de Minas Gerais.”

“Aluno matou a professora e se suicidou.”

“Professor atacado no interior da sala de aula e ferido gravemente deu o primeiro alerta para o que se estava a passar. Infelizmente este ataque provocou a morte a duas pessoas.”

“A atiradora, que matou três crianças e três adultos numa escola cristã particular era uma antiga aluna do estabelecimento e terá planeado o ataque, indicaram as autoridades policiais.”

A polícia alemã informou que oito pessoas morreram, incluindo o atirador, no ataque realizado contra uma igreja”

Um adolescente de 14 anos foi estuprado, torturado e queimado vivo dentro de uma igreja.

Um pastor foi assassinado dentro de igreja evangélica.”

As consequências da educação (familiar, social, escolar) que, nesse tempo, se fazia iam para além dos assassinatos em escolas e igrejas, os locais preferidos dos assassinos:

Por que seriam as escolas e as igrejas os alvos preferidos dos atiradores?

A violência ia para além de escolas e templos, projetava-se na Guerra da Ucrânia (lembrai-vos dessa barbárie, às portas de uma Europa dita civilizada?) e era notícia frequente na América dita das “oportunidades”:

“Oito corpos de migrantes são encontrados em fronteira do Canadá com os EUA

As autoridades informaram que as vítimas, entre elas duas crianças, foram descobertas perto de um barco virado.”

Lede comentários de “especialistas”:

“A saúde mental de todos os que estão no ambiente escolar, especialmente no pós-pandemia, é assunto urgente!

A cultura armamentista e do ódio estimulada pelo governo que se foi levou a uma exposição de casos nunca visto no Brasil.  Sempre houve violência na escola, mas não nesse nível. 

A Pandemia fortaleceu um clima já existente, mas não parece ser a causa.”

Eram muitas as “causas” e todas interligadas. E os escribas tão longe estavam da compreensão do fenômeno! A causa última passava ao largo da sua compreensão. Escassas vozes se acercavam da raíz do problema:

“Infelizmente, um imprevisto previsto. O trágico retrato de um sistema de educação arcaico e falido e de uma sociedade doente e ignorante.”

Certamente, não seriam jornalistas, nem “especialistas”. E, provavelmente, teriam lido Brecht:

“Dizem das águas de um rio que são violentas, mas nada se diz das margens que as comprimem.”

 

Por: José Pacheco

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