Lisboa, 18 de abril de 2043
Por altura de abril de vinte e três, circulava nas redes sociais este abaixo-assinado:
“Assine e exija que nossos líderes regulem as plataformas, para proteger aqueles que amamos. Compartilhe com todos que conhece, pois precisaremos de muitas assinaturas – os donos das redes sociais virão com tudo contra nós!”
Agora, é quase um massacre por semana nas escolas. E as redes sociais continuam se recusando a remover perfis que fazem apologia a este tipo de crime. Isso não pode continuar assim!
Queridas amigas, meu filho é meu coração andando fora do meu corpo. Ontem, eu tive uma crise de pânico, quando fui buscar meu filho à escola e uma mulher veio correndo em minha direção. Por um momento, achei que meu filho tinha sido vítima de um massacre. Felizmente, era apenas uma corredora se exercitando.
Naquele mesmo dia, os jornais anunciaram que os advogados de Elon Musk, dono do Twitter, se recusaram a derrubar os perfis de pessoas que fazem apologia a ataques em escolas. mesmo que São Paulo, sozinha, tenha recebido 279 denúncias de ameaças deste tipo em uma semana.”
“Projetos preveem ‘big brother’ com câmeras, detectores e reconhecimento facial em escolas. Ao menos cento e duas iniciativas foram protocoladas nas últimas semanas nas Assembleias Legislativas.
Jovens usam ChatGPT como psicólogo, em busca de conversa sem julgamento. Para especialistas, a ferramenta pode dar dicas tranquilizantes, mas não funciona como tratamento.”
Pânico instalado, notícias contraditórias, desorientação geral colmatada com os habituais paliativos.
Na Idade Média, quando os senhores feudais mandavam publicar uma nova lei, os lacaios passavam cal sobre o papiro onde havia sido publicada a lei anterior. Sobre a cal seca escreviam o texto da nova lei. Afixada a lei, o vento e a chuva fustigavam o papiro, a película de cal se desfazia e a nova lei era apagada. No papiro ficava a lei antiga.
Algo semelhante acontecia nos idos de vinte. Vivíamos um tempo marcado por uma modernização de racionalidade técnica, burocrática, industrial, numa sociedade da informação caraterizada pela solidão e o individualismo.
No domínio da educação, “especialistas” acrescentavam camadas de tinta nova em velhos palimpsestos, sem entender que novas necessidades somente poderiam ser satisfeitas no quadro de uma nova construção social. Se bem que a obsessão uniformizadora e seletiva da escola viesse sendo questionada por esses “especialistas”, a maioria não fazia ideia alguma de como contribuir para a saída do caos.
No fundo do baú das velharias, encontrei esta notícia:
“Menos itinerários, mais apoio a professor. São Paulo vai ajustar novo ensino médio. O Secretário da Educação afirmou que a reforma do ensino médio precisa passar por ajustes:”
“Feder comemorou os programas lançados nos primeiros cem dias de sua gestão como o “Aluno Presente”, que registra de forma virtual a frequência dos estudantes. Na virada do semestre, os professores já vão encontrar no celular deles as próximas aulas para dar na escola, se eles quiserem usar.
Também vai replicar outros programas do Paraná em São Paulo — como o “Redação Paulista” e o de “professores embaixadores”. No primeiro caso, a ideia é incentivar os alunos a escreverem mais, além de automatizar a correção dos textos. No segundo, haverá escolha de professores que vão instruir os colegas. Para o secretário, é possível replicar “as coisas boas do Paraná”
Coisas boas? Do Paraná? O secretário estaria a referir-se à educação, ou à cachaça de Morretes?
Como diriam os italianos: “Porca miséria!”.
Por: José Pacheco
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