Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCXIV)

Lordelo, 24 de abril de 2043

Na véspera do sexagésimo nono aniversário da Revolução do Cravos, trago-vos mais um dos anônimos construtores de uma revolução interrompida: a da educação. 

Há uns quarenta anos, frustrada a gesta da Escola Nova, rumei ao Brasil de Agostinho, para dar espaço à Ponte. Pediram-me para fazer uma ação de formação sobre “Técnicas Freinet”. Aproveitei o intervalo do primeiro dia para ir comprar uns livrinhos – A Maíra, o Dom Casmurro… – num sebo de rua. Eis senão quando…

Observo um título cativante para qualquer educador: 

“A Escola Secundária Moderna”. 

Pego nesse livro e logo outro título me seduz: 

“Escola Para a Comunidade”. 

O seu autor era um ilustre desconhecido: Lauro de Oliveira Lima. 

Voltei para o local da formação e pedi aos professores que me dissessem onde poderia encontrá-lo, acaso estivesse vivo. Não souberam responder.

No final do dia, a senhora que varria a sala onde decorrera o evento aproximou-se de mim e perguntou:

“O senhor perguntou onde mora o Professor Lauro? Eu sei.”

Na manhã seguinte, abalei para o Recreio dos Bandeirantes. Passei esse dia inesquecível entre a casa do Mestre e a “Chave do Tamanho”! E nesse dia iniciei uma busca de outros incógnitos pedagogos.  

Lourenço Filho influenciou a geração do manifesto escolanovista e os movimentos de renovação pedagógica de novecentos, tributárias das iniciativas reformadoras, que ele operou no Ceará.

Apesar da sábia recomendação de Freire de que os educadores brasileiros deveriam suliar (e não nortear) a sua reflexão e  sua prática, os cearenses do MEC de vinte e três traíram a sua memória , trocando as propostas do Lourenço por tralha pedagógica neoliberal importada do Norte.

Da passagem pela Revista do Brasil à organização da coleção pedagógica Biblioteca de Educação, das obras sobre a Escola Nova à publicação da Cartilha do Povo, o labor de um pedagogo-escritor marcou a as primeiras décadas do escolanovismo brasileiro. 

A sua participação nas conferências nacionais de educação de 1927 e 1928 teve impacto na redação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932. E a sua vasta obra reflete preocupações, que mantêm atualidade, se relevarmos o seu caráter tecnicista e a situarmos na época em que a produziu. Os temas – alfabetização, universidade, avaliação, ou a formação de professores – mantiveram atualidade, sobretudo o seu apelo à prática de uma educação integral. 

No livro “Introdução ao estudo da Escola Nova”, afirmava: 

“O tirocínio escolar não pode ser mais a simples aquisição de fórmulas verbais e pequenas habilidades para serem demonstradas por ocasião dos exames. A escola deve preparar para a vida real, pela própria vida. A mera repetição convencional de palavras tende a desaparecer. Tudo quanto for aceite no programa escolar precisa ser capaz de influir sobre a existência social no sentido do aperfeiçoamento do homem. Ler, escrever e contar são simples meios.“

É admirável como, já em 1926, escrevia: 

“A escola tradicional não serve o povo, e não o serve porque está montada para uma concepção social já vencida.”

Animado pelo ideário escolanovista, o sempre ignorado Lourenço Filho intuía a necessidade de desguetizar as escolas. Denunciava a profunda separação existente entre a escola e a vida social. Antevia um novo ideal de educação, um aprender sem paredes, no convívio com outros, um ainda mítico implodir da tradicional relação hierárquica entre mestre e discípulo, um aprender junto, na troca de experiências, de ideias e de sonhos, na perspectiva do desenvolvimento da autonomia do educando e dos educadores.

 

Por: José Pacheco

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