Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCXXVIII)

Odivelas, 8 de maio de 2043

Ainda faltam dois dias para o meu nonagésimo segundo aniversário, mas recebi um presente antecipado. Vos reencaminho uma cartinha recebida da Isabel, para que compreendais que, contra ventos e marés, o vosso avô sempre manteve uma inabalável “fé pedagógica” e sempre acreditou nos professores. 

“Morada das Águias, maio de 2043,

Nada acontecia por acaso, somente por sincronicidade. Não foi por acaso, vinte anos atrás, quatro tutoras (Janaína, Isabel, Helke e Karoline) e a diretora Mariângela serem escolhidas para a “empreitada” de fazer acontecer, de fato, a Comunidade de Aprendizagem da Morada das Águias, o lugar de “voar mais alto”, como o avô professor escreveu em sua carta datada no dia 05 de abril de 2043. 

Naquele momento, fez revelações do que viria pela frente, o que iríamos ter que enfrentar. Será que ele possuía uma bola de cristal? Ou, simplesmente, a voz da experiência nos avisando e nos preparando para o que iríamos enfrentar?

Em sua carta, dizia: “A escola deixara de fazer sentido e eu me perguntava se faria sentido ficar parado, a ver passar tempos de mudança”. Como educadora, confesso que nem eu mesma ainda tinha dado conta, antes daquele tempo, de que muito precisava ser feito, para que a sala de aula tivesse realmente sentido, ou seja, fazer com que os alunos fossem sujeitos ativos no processo de ensino aprendizagem, assim como os educadores, compartilhando, aprendendo, ensinando e fazendo com que uma aprendizagem significativa acontecesse em comunidade, onde todos, inclusive pais e outros sujeitos participantes da comunidade ao redor também pudessem contribuir com conhecimentos adquiridos pela vida. 

Muitos educadores sentiam medo dessas inovações. Não estavam dispostos a escutar, a se desconstruir e reconstruir para que, enfim, o ensino fizesse sentido para o educando e a transformação acontecesse na vida de todos. 

Modificar dói, é um processo nada fácil. Para nós, não foi diferente, foi extremamente doloroso, mas, que depois foi ficando mais fácil. Tudo passou a fazer sentido, como se uma venda nos tivesse sido tirada dos olhos, enxergando uma evolução como autoras de um projeto e como seres humanos. Foi algo tão fantástico, que nos transformou.

Primeiramente, uma transformação interna, deixar de acreditar sermos as únicas detentoras do saber, de transferir o conhecimento para as gerações futuras, pelo simples fato de possuirmos a formação “correta”, “necessária” para tal.  

Mas, ensinar conteúdos “importantes” bastaria? O que eram conteúdos importantes? Seriam esses conteúdos para os educadores, ou para os educandos? Ensinar e não dar voz ao educando, limitarmo-nos aos livros didáticos bastaria? Foram essas e outras questões que nos permearam e fizeram parte da nossa prática, desde então.

Em segundo lugar, a transformação da prática de um modo que realmente funciona. Não continuar na mesmice, num processo de ensino para compor tabelas e gráficos que “mascaravam” a realidade. 

Passamos por essas transformações, para oferecer a todos as oportunidades que qualquer ser humano merece: ser respeitado e ser ouvido, como sujeito aprendente em sua essência, possuidor de um desejo incansável de aprender, de buscar sabedoria, de descobrir, criar, recriar.

Sentimos orgulho um profundo sentimento de gratidão por termos feito parte de uma inovação. É maravilhoso olhar para trás e ver o quanto esse processo educacional modificou o nosso ser e nos ajudou a transformar a vida das gerações futuras.”

Dizei, queridos netos, se não valeu apena acreditar nos professores!

 

Por: José Pacheco

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