Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCLXV)

Vila Nova de Gaia, 14 de junho de 2043

Na tarde do Dia de Santo António, a Daniela e a Tatiana me levaram ao encontro com pais e professores empenhados em melhorar a educação dos seus filhos e alunos. O Fernando e outros brasileiros ali presentes não precisaram de “colocar o santo de ponta cabeça”, para que o “milagre” acontecesse. Estava acontecendo. E a notícia publicada no DN, disso dava nota:

“Pais procuram escolas onde os filhos possam “aprender e crescer de outra forma”.

Foram os filhos que, sem saber, juntaram um grupo de mães e pais que cresce todos os dias, com o objetivo de criar uma Comunidade de Aprendizagem em Leiria, no seio da Escola Pública. 

Por esta altura aproximam-se de 700 os membros de um grupo no Facebook, parte de um movimento que nasceu há alguns meses, de olhos postos no exemplo do Agrupamento Rainha Santa Isabel, que nem sequer fica perto da cidade, embora integre o concelho de Leiria. 

A mudança aconteceu no início deste ano letivo, liderada pela diretora, Adélia Lopes, que decidiu implementar um projeto-piloto em três escolas básicas, nas aldeias de Lameira, Ortigosa e Moita da Roda, inspirado no modelo da Escola da Ponte, em Santo Tirso, criado pelo professor José Pacheco, no final dos anos 70.

Todos os dias, Isa Morouço percorre mais de meia centena de quilómetros para que a filha possa frequentar a Escola Básica da Moita da Roda. Mora na Maceira, mais perto da cidade, mas dispõe-se a fazer o caminho sabendo que, naquela aldeia, há uma escola onde as crianças têm “a oportunidade de aprender e crescer de outra forma”.

Adélia Lopes explica como tem sido um desafio abraçar este projeto, que está pronta para replicar noutras escolas e níveis de ensino. Encontrou no grupo de professores do [seu] agrupamento a receptividade e entusiasmo necessários, e, aos sábados, todos integram a formação, à distância.”

Aos sábados, professores se reuniam e pais se encontravam, virtualmente. Presencialmente, a Isa encontrara a escola da Moita, a educação desejada para a sua filha. Mas não precisaria de se deslocar cinquenta quilómetros. Poderia ir à escola pública mais próxima e solicitar o projeto educativo. Certamente, ficaria encantada com o conteúdo desse documento. 

Restaria verificar se o projeto escrito era coerente com a prática. Se o fosse (o que, a bem da verdade, raramente acontecia) matricularia a sua filha nessa escola. nela, um professor que ainda não tivesse morrido (profissionalmente, ainda os havia) cuidaria bem da sua filha e de filhos de outros pais. 

Se a Adélia e outros excelentes diretores de agrupamento de escolas instalavam círculos geradores de protótipos de comunidade no seu território, a Ponte poderia, igualmente, instalar um círculo de aprendizagem no território onde o projeto tivera origem: na Vila das Aves. 

Foi o que tentei explicar, na minha visita à escola onde gastara quase toda a minha vida de professor. Tentei explicar à Anita e à Geni aquilo que seria o retomar de um processo de inovação, que tivera início há meio século.

No périplo de vinte e três, muitas escolas aderiram à ideia de criar uma nova construção social. Não faria sentido que a minha escola o não fizesse. Saí da Ponte com a sensação de não ter explicado o que queria explicar. Fiquei na expectativa da aceitação do meu convite. a criação de um círculo de aprendizagem. 

Em vinte e três, após duas décadas de desgaste do projeto, seria necessário retomar um diálogo franco com as famílias e com uma sociedade enferma da “Síndrome da Gabriela” (eu sou assim, fui sempre assim, serei sempre assim…), explicando-lhes que nem sempre foi assim. 

 

Por: José Pacheco

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