Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCCXXVII)

Mendes, 15 de agosto de 2043

Numa manhã de agosto de há vinte anos, a Dani e o Gregory nos levaram até ao CapUERJ. No final do encontro, manifestamos disponibilidade para colaborar na elaboração do novo PP-P do Colégio de Aplicação. E a ele voltaríamos, para estreitar laços com projetos, que estavam nascendo em Niterói e que requeriam uma formação de professores à medida de “uma escola do século XXI”, como dissera a Mônica, no final da sua alocução.  

Entre a Universidade e as escolas, iniciativas várias geravam “viveiros do futuro” – Morin dixit, e o cito sem aspas.

Numa instituição de formação inicial, eu pedi aos jovens candidatos a professores que não fossem fofoqueiros, que não me aparecessem com trabalhos semelhantes a teses engordadas com a costumeira lengalenga do “fulano disse”, do “beltrano disse” etc. Porém, nesta cartinha, abrirei uma exceção a esse cânone, para novamente citar o amigo Nóvoa, quando apontava para uma “nova da educação como espaço público”, no quadro de autônoma práticas. Antes de voltar a Anísio, reli o Nóvoa, citando António Sérgio. Ele nos falava de autonomia e de cidadania, pelo que recomendei a sua leitura a todos aqueles que reiniciaram um irreversível processo de autonomização, naquele agosto de boa memória.

“Sérgio coloca a eterna questão: por onde começar? Será possível uma reforma escolar no ambiente atual, ou estará ela dependente de uma prévia revolução no espírito nacional? 

Reconhecendo a dificuldade da resposta, conclui que “aquele impulso vitalizante, que a sociedade não dá à escola porque ela própria o não contém somos levados a fazê-lo sair da constituição da própria escola”. Nada que se não firme em um esforço pessoal criador e disciplinado. Nada que não resulte das exigências normais de uma comunidade de trabalho, de justiça e de cultura. 

A escola é caracterizada pelo valor pedagógico da autonomia e, por isso, sugere:

“Não vos canseis com os problemas de compêndios e programas: cumpre revolucionar os próprios métodos, o ambiente social em que a criança vive”.

Gerações sucessivas de educadores se bateram contra o Estado burocrático que transformava “a carneirada escolar em carneirada administrativa”, que, como Adolfo Lima, sempre reclamaram uma maior liberdade organizativa para as escolas, que, como Rui Grácio, não se cansaram de denunciar as incoerências de um Estado ao serviço dos mais fortes (…) quem nunca se satisfez com uma centralização burocrática do ensino, defendendo a autonomia no quadro de formas democráticas de participação e de governo da escola.

Como conseguir que as famílias e as comunidades sintam que a escola lhes pertence sem que, ao mesmo tempo, fechem os seus filhos numa escola à parte? Como conseguir que a educação responda aos anseios e aos desejos de cada um sem que, ao mesmo tempo, renuncie à integração de todos numa cultura partilhada?”

A solidária “resposta” estava contida na dúplice exortação freireana produtora de uma educação humanizadora: a coragem que da assunção de uma autonomia consciente, responsável; e o amor, primeiro valor da matriz axiológica positivista.

Por que não constava da bandeira brasileira a palavra Amor? Ordem sem Amor era violência, Progresso sem Amor era deterioração ambiental, desumanização. Uma educação amorosa era incompatível com a organização autoritária da vida.

No CapUERJ, me atrevi a lembrar a necessidade da definição de valores, quando concebessem o seu PP-P. Porque o exercício de autonomia era uma prática relacional, produção de vínculos, em tudo oposta a uma profissão solitária, individualista.

 

Por: José Pacheco

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