Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCDXLI)

Rio Bonito, 7 de dezembro de 2043

A Ana, da Escola Júlia Cortines, nos pusera em contato com educadores sedentos de mudança, e lá fomos até Rio Bonito. Uma boa surpresa nos esperava nesse encontro, algo raramente visto: a secretaria da educação estava representada por três excelentes educadoras.

No dia seguinte, fomos até ao Campo de São Bento, à escola da Ana, para conversar sobre valores e adaptar uma “dinâmica de grupo” às necessidades daquele momento. 

A Escola Júlia Cortines estava aconchegada num terreno que, a partir de 1697, albergava o Mosteiro de São Bento. O parque, que fora urbanizado em 1908, segundo um projeto de um engenheiro paisagista, era o principal jardim público urbano de Niterói. Entre canteiros, um lago artificial, brinquedos para crianças e um pequeno parque de diversões, acontecia… Escola. 

O lugar era inspirador, com o seu coreto, marco do romantismo popular de fins do século XIX, tombado como Patrimônio Cultural, em 1985. Nos fins de semana, uma feira de artesanato lhe fazia companhia, reunindo pessoas ao seu redor. Ao longo do ano, o parque se animava com variadas atrações: exposições, lançamentos de livros, shows, cursos e apresentação de filmes e vídeos.

Dentro do Campo de São Bento funcionavam o Grupo Escolar Joaquim Távora, o Centro Cultural Paschoal Carlos Magno e o Jardim de Infância Júlia Cortines. 

A Escola Júlia Cortines dispunha de biblioteca, auditório, espaço de informática e espaços de aprendizagem sem fim, num imenso parque. Ali, entre o Campo de São Bento e o Morro do Estado, fraternalmente unindo escolas, professores, gestores, nascia uma rede de comunidades de aprendizagem.

Esse agradável final de tarde terminou com um rápido regresso a casa, onde nos esperava mais uma live, dessa vez, com o Rodrigo e outros amigos. Um tempo de deliciosa conversa, que seria o culminar de uma série de encontros, nos quais preparamos o que seria o ano experimental da criação de novas construções sociais de aprendizagem. E talvez a envolvência daquele coreto pudesse transformar-se numa… ágora.

E quem nos levara até à Anísio, à Darcy, à Júlia? Os nossos amigos Karina e Vinícius. Desde há 17 anos, faziam de sonhos realidades. Na Casa Reviver, uma equipe de jovens e de gente boa menos jovem “fazia a diferença”, acompanhando o dia a dia dos projetos de vida de muitas crianças e famílias. 

Um pouco por todo o Brasil, fomos encontrando focos de humanização. Também fomos colhendo, aqui e ali, relatos de desumanidade:

“As nossas crianças continuam a ser vítimas de “bala perdida”, diariamente, fuziladas por efeito de um sistema educacional falido. Estão mortas, com um celular na mão, que na vida adulta trocam por drogas e muitos filhos. Em meio ao bombardeio de tantas guerras e vulnerabilidade social: violências – abuso sexual, desemprego, racismo, feminicídio, corrupção – nos sentíamos numa ilha na cidade que exclui e nos tira a voz.

Mas, não desistimos. Vamos construindo pontes de esperança. Haverá dias melhores, certamente!”

Dias melhores chegariam. Educadores das duas margens do Atlântico lançaram um debate não reservado a “especialistas”, mas de todas as pessoas – as redes eram pessoas, não eram instituições – e essa iniciativa viria a ser origem da criação de assembleias (ARCAs), em que o diálogo aberto e transparente não se limitava a queixas e lamentações. O debate colocava os “especialistas”, os “doutores” e os “cientistas da educação” perante um dever de coerência

Dizia o amigo Nóvoa que não valeria a pena uma permanente indignação, caso ela não se traduzisse em ação decidida e constante. 

 

Por: José Pacheco

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