Novas Histórias do Tempo da Velha Escola MCDLXVI

Algures, no Primeiro de Janeiro de 2044

Desta vez, recupero algumas missivas do longínquo 2024, escritas algures, em lugares por onde passei e de que perdi memória… coisa de velho. Quando a eternidade avança e se aproxima o tempo de partir, apossa-se de nós um sentimento, que o Rubem assim descrevia:

“Há também o tempo que se mede com as batidas do coração. Ao coração falta a precisão uniforme dos cronómetros. As suas batidas dançam ao ritmo da vida – e da morte. Tranquilo, de repente agita-se, dá saltos, tropeça…

A esse tempo de vida os Gregos davam o nome de Kairós – para o qual não temos correspondente. A nossa civilização tem palavras para dizer o tempo dos relógios. Mas perdeu as palavras para dizer o tempo do coração.”

No Kairós que me resta, tentarei reconstituir o conteúdo de documentos dispersos e castigados pelas intempéries do tempo em que o vosso avô ensaiava uma discreta retirada de uma longa andarilhagem. Creio que talvez eles possam interessar a algum arqueólogo da Educação, pois documentam um período áureo feito de profundas transformações.

Na madrugada do primeiro de janeiro de vinte e quatro, os amigos Luís e Filipa voltavam a Portugal, depois de lançarem flores a Iemanjá.

Apesar de já terdes atravessado o mar, para visitar o vosso avô brasileiro, certamente, não estareis familiarizados com práticas como o Candomblé e a Umbanda. Iemanjá é um orixá feminino das religiões africanas. O seu nome tem origem nos termos do idioma Iorubá (língua nígero-congolesa) “Yèyé omo ejá”, que significam “mãe cujos filhos são como peixes”. É considerada a mãe de todos os adultos e a mãe dos orixás.

Iemanjá é a divindade do rio que desagua no mar. É filha de Olokun, o orixá rei dos oceanos. O rio que representa Iemanjá e a sua história é um rio nigeriano: o Rio Ogun.

Iemanjá é a padroeira dos pescadores, e a festa popular dedicada a Iemanjá acontece no dia 2 de fevereiro. Pessoas trajadas de branco fazem uma procissão até ao templo de Iemanjá, localizado na praia do Rio Vermelho, onde deixam os presentes que vão encher os barcos que os levam para o mar.

Em Niterói, as festas em honra de Iemanjá estão relacionadas com a passagem de ano. Por isso, os amigos Luís e Filipa, trajados de branco, nos acompanharam na oferenda de flores, que esperássemos afundassem, porque aquelas que são devolvidas à praia são tidas como rejeitadas pela deusa.

O amigo Luís era um diretor de agrupamento “diferente”. Voltava a Portugal, depois de um longo “chá de aeroporto”, para retomar um projeto que viria a tornar-se conhecido por boas razões. Consciente das dificuldades que iria encontrar, não hesitava na busca de respostas para perguntas que ousava fazer.

Para Einstein, o importante era não deixar de fazer perguntas. E uma inquieta e curiosa Clarice dissera:

“Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever”.

Uma diretora de agrupamento com sede de protagonismo e que não perguntava reinventara o “semestre”. Muitos “agrupamentos” aderiram a essa segmentação do tempo letivo (o do Luís incluído) e eu deixava à consideração de diretores, gestores, professores e administradores do sistema as primeiras perguntas de 2024, acompanhas do pedido que ninguém respondesse com o habitual “eu acho que”. Em Educação, “achismos” não eram achados… Qualquer que fosse a resposta, ela deveria estar fundamentada na lei e nas ciências da educação.

Por que razão se dividia o ano letivo em dois semestres? Por que não em bimestres, trimestres ou quadrimestres? Por que não abandonávamos práticas cartesianas sem sentido?

Em suma: por que existia “ano letivo”?

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