Novas Histórias do Tempo da Velha Escola MDXXVI

Barra do Garças, 2 de março de 2044

No primeiro sábado do mês de março de vinte e quatro, começou a contagem decrescente para a efetivação de um processo de mudança. Dezenas de educadores – professores, pais, agentes comunitários – tinham assumido um compromisso ético. Finalmente!

Havia quem questionasse o dia escolhido para realizar o encontro de formação virtual. Mas, após uma “negociação” de décadas, escutando milhares de professores, o sábado fora o único dia que disponibilizaram para o encontro.

Havia quem questionasse a “metodologia”, mas cadê o modo “alternativo”? Ninguém o propôs.

Ao longo de mais de cinquenta anos, o vosso avô os escutara, com paciência e compaixão, as mesmas lamentações, os mesmos pretextos para não agir. Porém, já septuagenário e saturado de lamentações e pretextos, estava decidido a exigir um FAZER possível, a partir com aqueles que agissem. Quem quisesse continuar a ouvir ladainhas teoricistas dispunha de congressos-espetáculos. Quem quisesse obter diplomas de inúteis cursos, abundava a oferta. Aqueles que só desejassem participar da reflexão sobre aquilo que outros FAZIAM dispunham de um tempo semanal para, amenamente, conversar.

Algo me irritava, sobremaneira. Como quando alguém dizia: 

“Há colegas que não entendem o que é currículo e outras coisas de que tu falas. E não conseguem acompanhar o ritmo das aulas, não têm tempo para FAZER as tarefas que dizes para FAZER. As pessoas têm família, têm filhos para criar”.

Eu considerava os professores como intelectuais críticos, reflexivos, Mas, quem desse modo se expressava, com complacência, considerava os professores como mentecaptos, incapazes de usar a razão, de pensar e, quase sempre… não tinha “filhos para criar”.

Os encontros de sábado eram oportunidades de reelaboração da cultura pessoal e profissional. E houve quem os aproveitasse, quem agisse, quem FIZESSE. Durante mais de três dezenas de encontros, realizados ao longo desse distante 2024, analisaram os projetos das escolas e lhes deram forma concreta. 

Para além de se organizarem em núcleo de projeto e definirem uma matriz axiológica, criaram uma sala de aula virtual, na qual instalaram um… portfólio. Nos encontros de sábado, essa “coleção de “evidências de aprendizagem” se expandia, à medida que se FAZIA mudança. 

Queridos netos, poderá causar estranheza eu ter escrito uma forma verbal com maiúscula. Mas não foi por acaso. Partíamos do FAZER, para refletir e voltar a FAZER. Por exemplo, acaso o “formando” (de formação se tratava, mas de uma formação “diferente”) não conseguia cumprir o planejamento semanal, o “formador” praticava avaliação formativa. Isto é: ajudava-o a identificar a dificuldade de concretização da tarefa e a resolvê-la – elaborava com o formando um roteiro de estudo. 

Aqueles profissionais do desenvolvimento humano deveriam aprender a selecionar estratégias de ação e ser responsável pelos seus atos e pelos atos do coletivo em que estava inserido. 

Não presumais que essa responsabilidade se confinava ao cumprimento de horários ou a adaptações curriculares, no último reduto da sala de aula. Aquela que os formandos criaram era um lócus de aprendizagem partilhada. Não tinha porta de fechar. 

O sentimento de pertencimento característico da nova formação conferia ao coletivo segurança para assumir microssituações de liberdade em ação, mais transgressão que reconhecimento, na marginalidade de subculturas não delimitadas pelos cânones da formação (dita) tradicional.

Já entendestes por que razão escrevi em maiúsculas o verbo FAZER?

 

Por: José Pacheco

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