Novas Histórias do Tempo da Velha Escola MDXXV

Ipê, 1 de março de 2044

A pessoa que, sem que o soubesse, mais me inspirou no desenvolvimento do projeto Fazer a Ponte foi um ser humano, exemplo de honestidade, que recordo com saudade e que, no primeiro de março de 2024, já nonagenário, celebrava o seu aniversário.

Também no primeiro de março, mas de 2011, falecia o amigo Walter, outro ser humano de eleição que queria “salvar vidas de jovens e me pedira para fazer a Escola do projeto Âncora.

A primeira criança matriculada no Projeto Âncora nascera no dia… 1 de março.

Sincronicidades?

Em finais de fevereiro de 2024, estava a ser gestada a refundação de um “sistema”. E, amanhã, se completarão vinte anos sobre o dia 2 desse mesmo mês. Nesse sábado, seria dado o primeiro passo de uma longa jornada feita de educadores, que decidiram assumir um compromisso ético com a Educação. Não lhes faltava Amor pelas crianças e jovens, nem iriam continuar a negar-lhes o direito à Educação.

De março a junho, no chão da escola e numa sala de aula virtual, desenvolveram um processo de mudança, recriando a… Escola da Ponte de 2004. A partir de setembro de 2024, encetaram caminhos de inovação, que os conduziriam à criação de uma nova construção social de aprendizagem e de educação.

Por que estou recordando velhos fatos? Não sei. O que sei é que, em 2024, ao cabo de mais de cinquenta anos de designer educacional, eu havia concluído que não mais deveria apoiar projetos isolados e que, para que os projetos se saldassem pelo êxito, deveriam, desde a primeira hora, se assumir em autonomia.

No primeiro sábado de março de 2024, aconselhei educadores portugueses a fazer a entrega de uma minuta de contrato de autonomia aos diretores de agrupamentos de escolas. E aos educadores brasileiros que fizessem a entrega de termos de autonomia aos secretários de educação.

A autonomia era condição sine qua non de desenvolvimento de projetos, no seio de um sistema de aprendizagem. Não era um conceito que pudesse ser abordado isoladamente. Muito menos se definia em referência a um oposto, mas na contraditória complementaridade com a dependência, no quadro de uma relação social aberta. E nisso se distinguia do conceito “singularidade”.

O conceito de singularidade situa-se aquém do conceito de autonomia. O reconhecimento da singularidade consiste na aceitação das diferenças interindividuais dentro de cada espécie. O reconhecimento da autonomia é de outra natureza. Implica a rejeição de um determinismo, que transfere a origem da singularidade para o domínio do acaso. Implica conceber a existência de processos de auto-organização, que geram as suas próprias determinações.

Nesta asserção, autonomia será o primeiro elemento de compreensão do significado de “sujeito” como complexo individual. A componente egocêntrica deste complexo é englobada numa subjetividade comunitária mais alargada. 

O sujeito (aluno, ou professor) não se movimenta entre os dois polos. O sujeito é a convergência dos dois polos, em situação. O modo como o sujeito interpela a situação e as características do contexto estabelecem o ponto de convergência. O indivíduo é, portanto, uma mistura sempre provisória de autonomia e heteronomia. 

A “autonomia alimenta-se de dependência” – dizia-nos Morin: 

“Dependemos de uma educação, de uma linguagem, de uma cultura, de uma sociedade, dependemos bem entendido, de um cérebro, ele próprio produto de um programa genético e dependemos também dos nossos genes”. 

Recordo-me de nos idos de vinte ter rascunhado um livrinho sobre autonomia. Se conseguir encontrá-lo no porão das velharias, vo-lo enviarei.

 

Por: José Pacheco

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