Araçatiba, 5 de dezembro de 2041
Vai para uns vinte anos, o amigo Matias dizia ser preciso avaliar e rever a agregação de escolas. Em escassos parágrafos, refrescarei a mente de quem não se lembre do que foi a infeliz criação de “agrupamentos de escolas”, decretada pelo ministério da educação de Portugal. Nas palavras do amigo Matias, assim foi:
“A Agregação Forçada de Escolas transformou os estabelecimentos de ensino em “Unidades Orgânicas” ingovernáveis. As vantagens proclamadas no Diário da República e nos discursos políticos – mais articulação vertical, mais coerência organizacional, mais sequencialidade…- não passaram, na maior parte dos casos, de uma retórica de ilusão para não dizer de hipocrisia.
Os mega agrupamentos foram “soluções” tecnocráticas para um maior controlo e para a redução de custos. Mas à custa de muitos prejuízos de valor incalculável. As lideranças pedagógicas focalizadas nas aprendizagens deixam de poder existir; as práticas de proximidade, suporte e exigência tornam-se tendencialmente impossíveis.
Não se advoga um regresso ao passado. Mas, com as escolas, avaliar a eficiência e a eficácia da decisão. Nos casos em que novas identidades se forjaram e as aprendizagens dos alunos se fortaleceram, deixar estar. Nos casos em que se acentuou a balcanização e o caos ter a coragem e a sensatez de voltar atrás. Para se poder ir em frente.”
No início do século, a Escola da Ponte protagonizou a primeira experiência de agrupamentos de escolas. Aves/São Tomé de Negrelos foi a sua designação. A experiência não durou mais do que um ano letivo. Consciente do logro de “soluções” tecnocráticas para um maior controlo e para a redução de custos”, a Ponte recusou integrar quaisquer “ajuntamentos”, que viessem a ser criados. Quedou-se à margem dessa insanidade.
No ano de 2004, a Ponte celebrou com o ministério um contrato de autonomia pioneiro. Entretanto, a lei da autonomia foi revista, abastardada e de autonomia restou pouco. Em 2012, a ministerial prepotência descumpriu o contratado, descaracterizou a autonomia conquistada, desrespeitou as decisões da comunidade, desenraizou o projeto Fazer a Ponte, quando o exilou na margem hostil de um rio, que sempre separou culturas tradicionalmente (e infelizmente) inconciliáveis.
Nos primeiros anos deste nosso século, presenciamos a formação de mega-agrupamentos, a instalação de uma administração controladora, distante de uma educação na proximidade, servida por diretores desprovidos de autonomia e por professores remetidos para a condição de subordinados de lideranças toxicas, privados do exercício digno da profissão, reproduzindo arcaicos rituais, em ajuntamentos de escolas controlados por comissários ministeriais.
Em 2017, numa intervenção no Primeiro Congresso das Escolas, o professor Licínio asseverou que as lideranças fortes se revelavam particularmente fracas, quando os diretores dos agrupamentos se assumiam enquanto subordinados, fortemente dependentes perante a tutela.
A autonomia da escola era confundida com a autonomia do diretor, embora na prática se tratasse do exercício de micropoderes com alguma relevância para os atores escolares, mas que se mostravam “pequenas concessões de autonomia”, nas palavras do professor Silva. Os diretores de agrupamentos de escolas se revelavam vulneráveis nas suas relações hierárquicas com a administração central, sendo escrutinados e responsabilizados por via de novos instrumentos de controlo e de “uma burocracia eletrônica cada vez mais intrusiva e autoritária”.
Por: José Pacheco
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