Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCXXXVIII)

Arraial d’Ajuda, 6 de fevereiro de 2043

No fevereiro de há vinte anos, rumei à Bahia, ao encontro de amigos, que viriam a criar uma das primeiras comunidades de aprendizagem, que a história da educação refere. Aproximava-se o “Dia D”. O dia do início da “descolonização”, do “decrescimento”, do “desclausuramento”, da “desburocratização” de um obsoleto e nefasto sistema de ensinagem. Começava a contagem decrescente, que conduziria – na teoria, na lei e na prática – à fundação da Escola Pública”, desde há muito tempo, prometida e falsamente anunciada.

Nesta cartinha, suspenderei as considerações que venho fazendo sobre o conceito e a prática de inovação, pois pretendo, nas próximas, falar-vos de comunidade.

Como escrevi num livrinho publicado no início do século, inovação no campo educacional seria algo inédito, útil, sustentável e de provável replicação instituinte. Seria processo transformador, promotor de ruptura paradigmática, mesmo que parcial, com impacto positivo na qualidade das aprendizagens e no desenvolvimento harmónico do ser humano. 

Inovar consistiria em superar aquilo que se manifestava inadequado, obsoleto, descartável. Significava trazer à realidade educativa algo efetivamente novo, modificar o essencial. E isso pressupunha, não a mera adoção de novidades, inclusive as tecnológicas, mas mudança na forma de entender a produção de conhecimento. mas, aquilo que acontecia, nos idos de vinte era bem o contrário. E mais uma vez fundo ao fundo do baú das velharias desencantar papeis com notícias dos embustes.

Nos Estados Unidos, uma escola criava uma “sala calmante”, para aliviar tensões. A ridícula “inovação” fora financiada por uma empresa parceira, que participara da elaboração do conceito da “sala calmante” com a ajuda de psicólogos, médicos especializados e dos próprios alunos e professores, porque também ali se poderiam refugiar, de vez em quando…

Era doloroso saber que educadores formados em ciências da educação legitimavam, por colaboracionismo ou omissão, nesses disparates. 

O que vigorava nas escolas era a prática generalizada do modelo instrucionista misturada com resquícios de práticas do paradigma da aprendizagem, circunscritas a escolas particulares e raramente em escolas de redes públicas de ensino. Ou seja, a origem daquilo que vinha sendo considerado inovador no sistema educativo remontava a modelos criados há mais de cem anos.

A inovação organizacional era considerada quase sinônimo de adaptação, pois tudo que fora inventado passava por um processo de recriação do já existente, transformando-o em novas formas e qualidades. Rareava a inovação, abundava a obsolescência. 

Em cada ser humano existe um potencial inovador. Para que o seja, bastará que encontre ambiente propício. Tal como muitos outros inovadores, Einstein foi criativo, apesar da escola. Edison foi expulso da escola, para poder ser criativo. Picasso deixou e escola, precocemente, para que a escola não lhe cerceasse o espírito criativo. 

Há cerca de um século, o Vygotsky nos dizia que a aprendizagem é resultante de um processo interativo. E considerava a existência de uma Zona de Desenvolvimento Proximal, que representa a diferença entre o que o aprendiz pode fazer individualmente e aquilo que é capaz de atingir em colaboração com outros aprendizes. 

Também sabemos que, há cerca de sessenta anos, o trabalho de pares era prática comum no quotidiano de uma escolinha de Portugal. O que explicaria que, nos idos de vinte, o ministério e suas adjacências proibissem mudança e rejeitassem inovação?   

 

Por: José Pacheco

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