Novas Histórias do Tempo da Velha Escola (MCCIII)

ilhéus, 13 de abril de 2043

Fez ontem exatamente vinte anos, participei num congresso com especial significado. Naquele tempo, preparava condições de criar no sul da Bahia uma rede de protótipos de comunidades de aprendizagem e acreditava ser possível nelas incluir Ilhéus. 

O caloroso acolhimento da Genigleide, da Jussara e dos excelentes educadores da UESC, juntou-se à surpresa de encontrar uma nova geração de cientistas da educação ávida de mudança. E, também, a disponibilidade e propósito de tomada de uma decisão ética, como o reitor referiu, no seu discurso de boas-vindas.

Tendo eu dito ter sido aluno do primeiro curso de ciências da educação (a primeira licenciatura nesse domínio aconteceu na Universidade do Porto, em 1987), o diálogo se encheu de referências ao amigo Nóvoa, ao Canário, ao Sarmento… Esses e outros educadores portugueses eram bem conhecidos no Brasil. Sem descurar dos seus méritos, vi-me na necessidade de lembrar insignes mestres brasileiros. 

Já não me recordo de quem terá escrito que, junto com Anísio Teixeira, Paulo Freire e Darci Ribeiro, Lauro de Oliveira Lima formam o quarteto mais fecundo, fértil e injustiçado da história da educação em nosso país, mas sei que li algo assim, algures. E não eram apenas esses os injustiçados, os esquecidos ou não “aproveitados”. Havia registros de muitos mais. 

Que me perdoem os excelentes pedagogos vivos, se opto por celebrar aqueles que já não são deste mundo. Quando a eternidade se aproxima, enquanto o discernimento não se esvai por completo e a calma se harmoniza com a urgência, eu tento que as obras desses e de outros mestres sejam lidas por educadores sensíveis. 

Na singela intenção de despertar os educadores brasileiros para o rico patrimônio legado pelos mestres de antanho, não me esquecia de recomendar o estudo de Pedro Demo e de outros mestres vivos e ativos. Foi por essa altura que iniciei a escrita de ensaios sobre comunidades de aprendizagem. Optei pelo tom coloquial, acessível a todo e qualquer leitor, ao que juntava a sugestão de abordagens mais aprofundadas, ditas científicas, que as escolas e as universidades poderiam (e deveriam) produzir. 

Nas entrelinhas desses ensaios, talvez o leitor encontrasse contributos para repensar a escola e conceber uma nova construção social, que, efetivamente, educasse e fosse agente de desenvolvimento humano sustentável. 

À míngua de melhor designação, dei um nome à intenção: Novas Construções Sociais de Aprendizagem. no plural, pois uma ampla gama de opções surgia, a partir do momento em que alguém dissera que escolas eram… pessoas.

Em Maricá, no sul da Bahia, em Mogi, em Caçapava do Sul, em dezenas de lugares de cocriar, mudanças eram operadas nas escolas, acompanhando uma dinâmica semelhante àquela que, desde 1976, fora desenvolvida na Escola da Ponte. 

Com a configuração do primeiro “círculo de aprendizagem” na Ponte, outras iniciativas surgiram (algumas de efémera existência), a que se deve um conjunto significativo de mudanças operadas, reforçadas pelo surgimento do digital e do acesso à Internet. 

Em meados de oitenta, num encontro de formação, analisávamos as características dos círculos de estudos e alguém comentou: 

“O que nós já fizemos foi isto mesmo, sem lhe darmos este nome”. 

Foi nesses pioneiros grupos (a que não dávamos nome) que aprendemos a recomeçar, após cada contrariedade. Quando cheguei à Ponte, eu já havia vivido muitas situações de insucesso e de frustração profissional. ali, nos primeiros círculos de aprendizagem, pude transformar insucessos numa gramática de mudança. 

 

Por: José Pacheco

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